Genes e cérebros

290 3 0
                                    

******************************
Que é o martelo? Que é a corrente? Em que fornalha estava teu cérebro?
Que é a bigorna? Que mão terrível Ousará manipular seus terrores mortais?
WILLIAM BLAKE – The Tyger
******************************
De todos os animais, o homem é aquele que possui o maior cérebro em relação ao seu
tamanho. ARISTÓTELES – As partes dos Animais
******************************
A evolução biológica tem sido acompanhada de crescente complexidade. Os mais complexos organismos da Terra hoje contém consideravelmente mais informação armazenada, tanto genética quanto extragenética, do que os mais complexos organismos de, digamos, 200 milhões de anos atrás – que representam cinco por cento da vida no planeta, ou seja, cinco dias atrás no Calendário Cósmico. Os mais simples organismos da Terra hoje possuem tanta história evolutiva atrás de si quanto o mais complexo deles, e é perfeitamente possível que a bioquímica interna das bactérias contemporâneas seja mais eficiente do que a bioquímica interna das bactérias de três bilhões de anos atrás. Mas a quantidade de informação genética das bactérias atuais provavelmente não é maior do que a de seus ancestrais bacterianos arcaicos. É importante distinguir entre a quantidade de informação e a qualidade dessa informação.
As diversas formas de vida classificam-se em grupos de amplitude crescente. As maiores divisões taxonômicas fazem distinção entre as plantas e os animais ou entre os organismos portadores de núcleos pouco desenvolvidos em suas células (como bactérias e as algas verde-azuladas) e os que têm núcleos nitidamente demarcados e elaboradamente arquitetados (como os protozoários e os seres humanos). Todos os organismos do planeta Terra, entretanto, tenham ou não núcleos bem-definidos, possuem cromossomos, que contêm o material genético passado de geração a geração. Em todos os organismos, as moléculas hereditárias são constituídas por ácidos nucléicos. Com algumas exceções sem importância, o ácido hereditário é sempre a molécula conhecida como ADN (ácido desoxirribonucléico). Há outras divisões subseqüentes entre vários tipos de plantas e animais, chegando às espécies, subespécies e raças. Uma espécie é um grupo capaz de produzir prole fértil através de cruzamento
com outros membros da própria espécie, mas não de outras. O acasalamento de gerações diferentes de cães produz filhotes que, quando crescidos, serão cães competentes sob o ponto de vista reprodutor. Mas os cruzamentos entre espécies – mesmo quando semelhantes, como é o caso dos burros e cavalos – produzem prole estéril (nesse caso, as mulas). Os burros e cavalos são, portanto, classificados como espécies diferentes. Acasalamentos viáveis, mas estéreis, de espécies mais separadas – leões e tigres, por exemplo – por vezes ocorrem e se, por um raro acaso, a prole for fértil, isso só indica que a definição da espécie é um tanto confusa. Todos os seres humanos são membros da mesma espécie, Homo sapiens, que significa no latim mais otimista “Homem, o sábio”.
Nossos prováveis ancestrais, o Homo erectus e o Homo habilis – agora extintos – são classificados no mesmo gênero (Homo), mas em espécie diferente, embora ninguém (pelo menos nos últimos tempos) tenha tentado as experiências adequadas para observar se o cruzamento deles conosco produziria uma prole fértil.
Outrora se acreditava piamente que cruzamento entre organismos extremamente diferentes poderiam gerar prole. O Minotauro, morto por Teseu, era tido como resultado de um cruzamento entre um touro e uma mulher. O historiador romano Plínio sugeriu que o avestruz, então recém-descoberto, resultava do cruzamento entre a girafa e o mosquito. (Teria de ser, suponho, uma girafa fêmea e um mosquito macho). Na prática, devem existir muitos cruzamentos não tentados em vista de uma compreensível falta de motivação.
O gráfico apresentado na pagina 13 deste capítulo será repetidamente mencionado no seu decorrer. A curva continua mostra as épocas da emergência de diversas formas de vida importantes. Naturalmente que existem muitas outras formas que não foram assinaladas nos poucos pontos da figura. Mas a curva é representativa de uma série muito maior de pontos que seriam necessários para caracterizar as dezenas de formas separadas que surgiram durante a história da vida em nosso planeta. As principais formas que evoluíram mais recentemente são, sem sombra de dúvida, as mais complicadas.
Uma certa noção de complexidade de um organismo pode ser obtida simplesmente ao se considerar seu comportamento – ou seja, o número de diferentes funções que é intimado a desempenhar no decurso de sua vida. Mas a complexidade também pode ser avaliada em termos do conteúdo mínimo de informação no material genético do organismo. Um cromossomo humano típico possui apenas uma molécula de ADN, muito longa e que se enrola, de forma que o espaço ocupado é muito menor do que seria, não fosse a forma espiralada. Essa molécula de ADN é composta de blocos menores, um pouco semelhante aos degraus e lados de uma escala de corda. Esses blocos são chamados nucleotídeos e comportam quatro variedades. A linguagem da vida, nossa informação hereditária, é determinada pela seqüência dos quatro tipos diferentes de nucleotídeos. Podemos dizer que a linguagem da hereditariedade é escrita com um alfabeto de apenas quatro letras.
Mas o livro da vida é muito rico; uma molécula típica de ADN cromossômico do ser humano é constituída de cerca de cinco bilhões de pares de nucleotídeos. As instruções genéticas de todas as outras formas de vida da Terra são escritas na mesma língua, usando o mesmo código. Na realidade, essa linguagem genética comum a todas as espécies constitui um ponto de apoio à teoria de que todos os organismos da Terra descendem de um único ancestral, situando a origem da vida há uns quatro bilhões de anos. A informação contida em qualquer mensagem é geralmente descrita em
unidades chamadas bits, a abreviação de binary digits (dígitos binários). O esquema aritmético mais simples não usa 10 dígitos (como nós fazemos em virtude do acidente evolutivo de possuirmos 10 dedos), mas apenas dois, o 0 e o 1. Dessa forma, qualquer pergunta suficientemente objetiva pode ser respondida por um único dígito – 0 ou 1, sim ou não. Se o código genético fosse escrito numa língua de duas letras em vez de quatro,
o número de bits em uma molécula de ADN equivaleria ao dobro do número de pares de nucleotídeos. Mas, em vista de existirem quatro tipos de nucleotídeos, o número de bits de informação do ADN é quatro vezes o número de pares de nucleotídeos. Por conseguinte, se um único cromossomo possui cinco bilhões de nucleotídeos, ele contém 20 bilhões de bits de informação. (Um símbolo como 10 elevado a nona potência indica simplesmente o número 1 seguido por certo número de zeros – nove, neste caso).
Qual a quantidade de informação de 20 bilhões de bits? A que equivaleria se fosse escrita em um livro comum impresso em linguagem humana moderna? Os alfabetos das línguas existentes possuem, caracteristicamente, de 20 a 40 letras e mais uma ou duas dúzias de numerais e sinais de pontuação, portanto, 64 caracteres alternativos devem ser suficientes para a maior parte dessas línguas. Uma vez que 2 elevado a sexta potência equivale a 64, não devem ser necessários mais de seis bits para especificar um determinado caráter. Podemos imaginar um tipo de jogo de 20 perguntas, no qual cada resposta corresponde ao investimento de um único bit, a uma pergunta com resposta sim/não. Suponha que o caractere em questão seja a letra J. podemos especificá-la assim:

Os Dragões do ÉdenOnde histórias criam vida. Descubra agora