VOCÊ VEM SEMPRE AQUI?

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  De manhã o alarme me acordou às cinco, e eu não me lembrava de ter programado o despertador para esse horário, levantei-me cambaleando e fui até a mesa para desligá-lo, mas ao segurá-lo em minhas mãos percebi que não era dele que vinha o som, saí e nos corredores e notei que outros como eu estavam igualmente saindo de seus quartos a fim de identificar a origem do tal barulho. Era o toque de despertar. Passou diante de nós um homem com roupa de militar em cores branca e cinza, claro, ele era grande e tinha um olhar ameaçador. "Vistam-se e vão para a mesa, em trinta minutos iniciaremos o treino, de agora em diante esta será sua rotina" disse em tom alto com voz firme. Aprontei-me depressa, os primeiros dias foram puxados pois todas as manhãs tínhamos treino pesado, aprendemos diversos tipos de luta, mas fomos instruídos a usá-las somente quando necessário, o treinador era bastante rígido e sempre saímos com hematomas, mas eu aprendia rápido e logo me tornei um dos melhores. Em poucas semanas eu já havia incorporado as técnicas, isso porque sempre fui bastante esforçado, a noite quando tínhamos um tempo livre para sair, alguns escolhiam passear nas pracinhas do Formigueiro, mas eu ficava no quarto sempre treinando e praticando. Eu repetia o movimento aprendido na manhã dezenas de vezes, e no dia seguinte já estava pronto para vencer qualquer um que o treinador escolhesse como meu adversário.

De tarde aprendíamos idiomas diversos, eram aulas intensivas, 5 horas de aula para ser mais exato, nós deveríamos sair fluentes em pelo menos 4 idiomas, pois as missões seriam espalhadas pelo mundo todo. Já tendo se passado três meses eu havia feito alguns amigos lá, Wilson era o mais próximo. Certa noite depois do jantar, eu estava me encaminhando para o quarto a fim de iniciar meus treinos noturnos, e ele me disse:

-Cara, sai desse quarto e vamos com a galera, abriu uma lanchonete nova no corredor 12, dizem que a comida é uma delícia, e vão ter meninas lá cara. - Olhei para ele e o repreendi:

-Wil, não é permitido relacionamento entre membros integrantes do Formigueiro.

-Blá, blá, blá- ele caçoou - deixa de ser ingênuo Nic, existem famílias inteiras morando aqui, como você acha que não pode haver relacionamento? - Hesitei por um momento.

-Eu nunca havia pensado nisso

-Pois é cara, vamos, vai ser divertido, pelo menos para se distrair um pouco, você anda muito tenso, hoje de manhã na luta quase quebrou o braço do Marcus.

-Beleza.

Saímos, era incrível como a unidade tinha uma quantidade imensa de corredores iguais, era fácil se perder, as plantas eram todas artificiais, mas quanto mais profundo descíamos maior a quantidade de oxigênio dispersa pelo ar.

A lanchonete por fora era só mais uma porta branca, mas ao entrarmos percebi que era grande, música animada, cores vivas nas paredes, jogo de luz, havia um salão para dançar, mas também havia uma parte com mesas e foi lá que fiquei a noite inteira. Possuíamos um relógio que os dava acesso aos elevadores, e também nos permitia comprar, o salário era depositado na nossa conta todo mês e para gasta-lo era só usar o relógio. A noite foi sim divertida, comemos e bebemos muito, meus amigos saíram para dançar na pista, mas eu, levemente alcoolizado, escolhi permanecer na mesa e assisti-los de longe. Enquanto eu os observava, uma garota puxou a cadeira ao meu lado e sentou-se, estava um pouco escuro mas reconheci aqueles olhos verdes, era a mesma que eu tinha visto no dia em que cheguei. Fiquei um pouco nervoso, a moça ficou em silêncio olhando para a pista de dança, pensei em algo inteligente para dizer, mas tudo que saiu foi:

-Você vem sempre aqui? - Ela sorriu

-Bem, eu não tenho muitos lugares para ir - minhas mãos estavam suando.

A cidade do abismoWhere stories live. Discover now