O orgulho dilacera a alma.

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Eu já disse milhões de vezes que detesto brigar com você. Algo em mim morre, se despedaça quando a gente não se fala, ou se xinga, se bate. Eu sinto como se a minha alma se machucasse, sangrasse, sinto ela dilacerada, acabada. Eu poderia dizer que não temos culpa, mas 90% dos casos, a gente se deixa levar pelo orgulho, orgulho esse que nos afasta mais ainda, e parece que quanto mais damos ouvidos a ele, nossa distância fica maior, e a dor aqui dentro triplica. É horrível, essa dor. Ela queima, arde, e ao mesmo tempo congela. Congela minha alma, minha mente e até meus movimentos, eu derreto-me e pelos meus olhos saem lágrimas que querem dizer o quão minha alma está corrompendo-se. A maneira como nos distanciamos, vai rasgando tudo aqui dentro, criando buracos profundos e enfermos.
Eu sinto um vazio - sim, um grande vazio - quando você me olha e decide virar para o lado ou prefere não digitar nada, quando dá meia a volta e vai por outra rua, quando me olha desinteressado ou sem fluidez.
Eu sinto como se eu me jogasse dentro de um poço, prestes a ficar ali pelo resto da minha vida, porque parte de mim foi-se junto a você. Eu me perdi aí dentro e estou disposta a nunca mais achar a saída, porque eu não quero não ter nada que me ligue a você. Que seja um fio, uma carta, um telefone, um texto, um post-it, eu só quero algo que me faça ser sua. Sua até o mundo acabar, ou nossos corpos serem enterrados ou jogados ao mar. Eu confesso que o amor sempre me foi algo fantasioso, e achava que era como os dos contos de fada, achava que o amor não machucasse. Mas ele machuca sim, ele queima, ele nos mata às vezes. Se a gente deixar, ele no transforma em pessoas ruins. Mas não é isso, meu amor, não é isso que eu quero, nem desejo a nós.
Seu toque, seu perfume, seu cuidar faz com que eu me sinta viva e quando não tenho isso, eu morro. Eu morro sim, e me sinto fraca e frágil. Você me deixa forte, me faz ser uma muralha, e quando não está ao meu lado me sinto um gelo perto de uma lareira. Derretendo... sangrando... morrendo.

Como a gente luta assim? Como a gente vive assim? Deixando o orgulho ser maior? Deixando que ele nos mate, nos roube e nos faça desistir de alguém? Como podemos fazer ele ser menos protagonista de nossa história? Eu digo então "venha, fique, para sempre. Fique! Fique!" grito para o teto como se pudesse ouvir-me, pego a primeira coisa que me vem à mente e jogo contra a parede como se pudesse fazer o tempo parar... o trem parar...
Sim, o trem que agora está levando você, para o outro lado do país agora mesmo, e que eu deixei que fosse, por ser egoísta e por achar que a gente iria se resolver aquele dia... mas se foram semanas. Eu olho para meu jeans rasgado e lembro de você tentando arrancar os fiozinhos soltos. Eu abro um sorriso pequeno, mas me vejo sentada no canto da sala, com minha dor indescritível, chorando há mais de uma semana, precisando de um carinho seu. Um abraço, um oi, ou um vai ficar tudo bem.
A verdade é que minha vida nunca mais foi a mesma, desde que você se foi, faz duas semanas que saiu por aquela porta, com suas bobagens no braço, levando consigo a melhor parte que havia em mim, assim que fechou a porta, eu senti uma pontada em meu coração como se me atirassem uma bala no peito, eu olhei para minhas mãos e haviam sangue, porque ardiam. Meu coração explodiu de tanto sofrimento, estou quebrada. E nesse momento, você está indo para o seu lugar. Para sua vida. Eu queria poder dizer para ficar. Seria estúpido da minha parte pegar o carro e ir lhe procurar?
Poderia ser.
Mas, eu fui. Peguei o carro, fui com a roupa do corpo. Dia frio, sem chuva e sem sol, estava simplesmente um dia feio. Com as mãos molhadas de minhas lágrimas, ia dirigindo até a estação onde você pegaria o trem, inútil tentar te ligar, não atenderia-me. Enquanto chorava, eu sorri. Como se estivesse indo atrás da minha alma, da minha própria vida, do meu verdadeiro ser. Você sempre foi bruto, mas meu amor, eu não me importo mais, o que mais quero é dizer-lhe para ficar. Só essa palavra já bastaria, já seria capaz de nos fazer feliz.
Na estação, desci prontamente atrás de você, tropecei-me no asfalto e machuquei minha perna, ou foi mais do que isso? Há tanto sangue por aqui... minha visão foi escurecendo, mas eu pude ouvir uma voz familiar. Eu não ia aguentar, não caí e sim fui atropelada. Mas era você, vindo em minha direção quando me reconheceu. Murmurou-me algo, mas eu não escutei muito bem, em meio ao sangue eu peguei em sua mão e disse:
- Fique.

Acordei no dia seguinte na cama de um hospital, olhei para o lado e eu o vi dormindo desajeitado em uma pequena poltrona, olhei para meus pés e um deles estava engessado.
Eu me machuquei, mas consegui ir atrás de quem eu amo antes de ir para o outro lado do mundo. Mas, e você? Como tem feito com o orgulho? Tem deixado ele ser capaz de matar você e o seu amor? Ou tem feito como eu? A coragem é uma virtude, e quando se ama é preciso isso. É preciso muita coragem para poder ser feliz, para poder ter quem você ama ao seu lado! Nem sempre é fácil, pode ser que você se machuque assim como aconteceu comigo quando fui atropelada, mas quer saber? Valeu muito a pena.
Não deixe o orgulho ser maior do que a sua alma. Sua alma precisa ser liberta dele.

***

Devaneios entre linhas (PRÉVIA)Onde histórias criam vida. Descubra agora