A busca

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É incrível como algumas coisas insistem em desaparecer da nossa linha de alcance mesmo quando temos o maior cuidado com elas. Quando isso acontece nos viramos, reviramos e nada. Simplesmente como em um passe de mágica o objeto desaparece.

Eu toco violão - na verdade falar isso é quase que um desrespeito com quem realmente sabe tocar violão, porém a qualidade com que executo o instrumento não vem ao caso. Quem toca qualquer instrumento de corda que necessite de uma palheta sabe a dificuldade que existe em manter a posse de tal objeto por muito tempo. Simplesmente dizemos entre os músicos - não que eu realmente seja um - que existe um duende ladrão de palhetas. Você pode até colar ela em algum lugar, quando voltar para tocar, ela não estará lá.

Há muitos anos eu e um grande amigo éramos viciados em jogar Game boy color, mais especificamente Pokemon Cristal. Trata-se de um pequeno vídeo game de mão que necessita de um cartucho para executar o jogo. Um dia, quando já estávamos há meses no jogo, esse meu amigo me liga: "cara, pedi meu cartucho de Pokemon Cristal", respondi imediatamente: "mas como tchê, porque você tiraria o cartucho do vídeo game? Ele simplesmente me disse que foi rever outro jogo por um breve tempo e o cartucho sumiu.

Após semanas de procura intensa por toda a casa, jardim e arredores, banheiro da escola, salas de aula, as buscas cessaram. Impossível, o cartucho se desmaterializou. Passaram mais algumas semanas, meu amigo cansou de chorar o leite derramado e comprou um novo cartucho, reiniciou o jogo, perdeu umas cem horas de progresso, porém a vida continuou.

Anos após esse incidente, numa faxina um pouco mais pesada, ele levantou o sofá da casa e sentiu algo chacoalhar lá dentro, fez um pequeno corte no forró do sofá e voilà. Em suas mãos estava o há muito esquecido.

Depois desse incidente e das diversas vezes que perdi o controle da TV, meu smartphone, minha carteira, cheguei à certeira conclusão, dessas que não se aprende nos livros ou nos filmes, apenas é trazida pela sólida experiência de uma pessoa em apuros: o espaço entre o braço do sofá e seu estofado é um vortex espaço/temporal capaz de sugar os mais diversos e improváveis objetos, fazendo com que se percam na eternidade.

Já ia me esquecendo, lembrem-se, pode ser que o objeto não tenha caído nesse buraco negro infernal e sem retorno, quem sabe o carregador perdido do seu celular só está atrás do sofá, não custa dar uma olhada lá antes de acusar terceiros de furto ou até de fazer buscas desenfreadas nos locais mais improváveis como, por exemplo, na casinha de seu cachorro. Agora, se caiu no vortex, esqueça, quem sabe daqui alguns anos ele cuspa de volta.


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