Ponto de Vista

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Júlia sai de casa irritada, e passa por Jorge, que tenta ser educado.

- Bom dia, dona Schmidt.

- Ah foda-se! Licença.

- Credo, o que deu na senhora?

- Nem todas as pessoas tem tempo como o senhor.

Júlia segue em frente sem olhar para trás. Jorge, antes relativamente calmo, agora se encontra bem irritado.

Ele entra no carro, e prime com força no acelerador, ele tem pouco tempo para pensar. Era segunda, e ele tinha feito tudo para ficar o mais calmo possível, mas a vaca da vizinha apenas tinha piorado o dia dele. Jorge, já não gostava do trabalho, mas fazia sempre um esforço para ser o mais simpático com todos a seu redor. Alguém não retribuir a sua delicadeza era algo que ele considerava bastante irritante. Enquanto ele está se remoendo no acontecimento anterior, João estava atravessando a estrada apressado por causa de um exame que tinha para fazer na faculdade. Ele estava pouco preocupado porque o sinal estava verde, no entanto Jorge estava muito irritado para ver o verde. Ele estava vendo tudo num tom vermelho de irritação, e... quase atropelou João.

- Seu animal, não viste que alguém estava a conduzir, filho da puta! - disse Jorge agora vermelho de raiva.

- Tu quase me matas, e eu é que sou o animal? Vá para o caralho, corno de merda.

Jorge segue em frente, ainda ele precisa chegar a trabalho a tempo. Ele não podia deixar que seu dia ficasse pior do que já estava.

João, no entanto, ficou um pouco desconcentrado devido ao ocorrido. Ele mal tinha dormido nos últimos três dias, estudando para o exame, e tinha acumulado muita irritação por esses períodos sem sono. Era praticamente uma bomba relógio. Colidindo violentamente em outras pessoas, ele mal tinha tempo para pedir desculpas, precisando de ir aos seus exames finais. Afinal, ele não iria perder tempo com delicadezas quando o seu futuro estava em jogo. Fodam-se os outros.

João, com muito pouca paciência, entra no comboio antes de Laura. Ela ainda grita para ele:

- Pode segurar a porta por favor, jovem.

- Caguei! - disse João, colocando os fones de ouvido, e subindo a música ao último volume.

João tenta relaxar enquanto está em pé, no meio de uma multidão toda irritadiça (era segunda-feira, afinal)

Laura, por sua vez, ficou mesmo preocupada. Ela tinha uma apresentação na qual ela precisava estar às 10 horas, mas tinha o carro partido. A sua esperança era o comboio que ela tinha acabado de perder. Os homens dominavam o mundo empresarial, ela pensava, e se ela não se esforçasse bastante, seria difícil para ela chegar ao topo. Então ela vivia numa vida regrada com disciplinas rígidas. Uma delas era a política de nunca se atrasar em qualquer ocasião importante. Um hábito, e recorde que ela tinha acabado de quebrar por causa de um universitário bosta, e provavelmente virgem, como ela pensava. E ela ficou lá sentada. Laura ficou se lembrando da cara de João, e disse com desprezo:

- Esses homens, só fazem merda e depois reclamam de nós.

Quando o outro comboio chegou, Laura já estava impaciente, faltava muito pouco para ela chegar atrasada. Como é que ela iria fazer para chegar a tempo, com aquele tanto de gente?

Gilberto, tinha acabado de entrar no comboio. Ele já tinha começado um ótimo negócio, e estava muito bem, embora a segunda-feira ainda não fosse o seu dia favorito da semana. Também ele tinha o azar de não ter um carro, ou sorte, quem sabe, e tinha apanhado o mesmo comboio que Laura por mera coincidência. E por coincidência, Gilberto estava atrás de Laura. Ela estava constantemente a ver o relógio. Gilberto apenas ficava vendo os letreiros pelas estações que passava. Num momento fatídico, o telemóvel de Gilberto vibrou. Ele tinha o colocado no modo silencioso pois não queria ser incomodado em reuniões e coisas do gênero, mas ele tinha de atender esta ligação. Ao tentar pegar o telefone, sua mão tocou nas coxas de Laura. Esta, confundindo a situação e naturalmente ofendida, procedeu em bofetear Gilberto.

- Está louca ou quê?

- Seu tarado, pervertido, eu não sou aquelas putinhas sensíveis que deixam vocês fazerem a vossa vontade sem se defenderem.

- Do que é que está a falar? Eu...

- Sabe muito bem do que estou a falar.

Todos presentes no comboio observavam Laura e Gilberto. Gilberto ficou profundamente chateado com isso. Todos o ficavam vendo como se fosse algum tipo de pervertido, um criminoso, um ser que deveria ser eliminado da sociedade. E ao chegar na sua estação, ele rapidamente saiu dali.

No trabalho, Gilberto já exausto e profundamente irritado, mandou chamar sua funcionária Júlia.

- Sim, senhor Almeida.

- Fez os relatórios que lhe pedi?

- Não chefe. Tive pouco tempo para fazer...

- Então vá fazer agora. E tem aqui também outros documentos para revisar.

- Mas eu não sei se...

- Vá fazer!

-... Alguma coisa aconteceu, senhor?

- Sim, hoje está a ser um péssimo dia, agora me dê licença por favor.

Júlia, já irritada desde manhã, agora, estava ainda mais insuportável. E o ciclo continua. Qual deles está a ter um dia pior? Tudo depende do ponto de vista.


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