Ausência.
A casa não era grande, não era minúscula. Tinha um tamanho razoável. A normalidade de uma casa comum: quarto, cozinha, banheiro, sala. Poderia descrever cada azulejo, cada móvel, cada canto de poeira. De como o gato se escondia na sombra do abajur. Ou de como os vizinhos eram barulhentos de madrugada, ora gargalhando, ora brigando, ou simplesmente andando pela casa.
Uma vez eu ouvi no Club Café, onde eu trabalho, que o silêncio era um dom, um privilégio.Agora, no banho, com a água desenhando minhas costas, o som do chuveiro quebra o meu privilégio. Não. O silêncio é maior o castigo que a ausência poderia me dar.
Quando ela foi embora, não tenho certeza, as paredes pareceram ficar maiores. Talvez por isso eu não conseguisse dormir, as paredes queriam me engolir.
Por isso eu mantinha meus olhos bem abertos.
"Estado, particularidade ou condição de ausente."Ainda úmida do banho, fui ao dicionário e busquei pela palavra a qual me fazia companhia nas madrugadas. E encontrei o que está escrito acima.
Abri as cortinas. Primeiro uma luz branca invadiu o quarto, meus olhos semicerraram automaticamente. Em seguida, o fulgor do sol aqueceu minha pele nua.A lembrança da sua pele. Seu cheiro. Do som da sua risada. Particularidade.
Sim, era a ausência dela que preenchia a minha casa.Os olhos, que antes estavam quase fechados, se abriram excessivamente. Minhas sobrancelhas arquearam-se, a testa franziu. Olhei para trás na esperança de vê-la.
Meus ombros caíram, e eu ri. De mim mesma.
Você pode rir também. Eu sei, é risível o meu delírio.
Vesti a calça jeans escura, minha favorita. Minha blusa preta. Meu tênis. Não, chinelos.
Hoje é meu dia de folga.