Parte 4 - Carter

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Eu não quis dizer que iríamos passar dias ali, mas Sadie quase me enforcou quando soltei as últimas palavras. Às vezes ela não entende o espírito da coisa. Mas eu tentava controlar os pulmões queimados pela falta de ar e Sadie logo entendeu o que quis dizer - com a ajuda da adorável Zia.

Ainda conseguia ouvir o eco do desespero dos que ainda estavam sendo levados. O acampamento provavelmente já deveria estar quase em ordem e logo chamariam a polícia, se já não chamaram, para contatar dos desaparecidos. O que seria um problema para nós. Precisávamos derrotar aquele demônio  antes que mais pessoas se machucassem.

— Eu não prestei atenção às aulas do Sr. Montanhez – confessou Sadie, mostrando um sorriso largo. Dei mais uma puxada no ar, olhando em volta. Haviam galhos quebrados no chão, e alguns ainda pendurados nas árvores. Apontei para lá, Zia viu e abriu um pequeno sorriso.

— Até com cinquenta por cento do seu cérebro funcionando você é surpreendente – e ela me deu um beijo. Ouvi Sadie soltar um grunhido e murmurar "que nojo", antes de começar a seguir a trilha de galhos quebrados na frente. Nos ignorando. Ah, mas eu não estava me importando. Zia se afastou e abriu ainda mais o sorriso, era difícil vê-la sorrir, mas tinha um sorriso lindo.

***

 Zia não era necessariamente uma maga de batalha, mas era a única que tinha condições para uma.

 Sadie me ajudava a andar na retaguarda enquanto Zia se mantinha a frente, segurando minha espada e observando o caminho que teremos que seguir, seus cabelos já caiam pouco abaixo dos ombros, os olhos me lembrava aos de Bast, a deusa gata, eram rápidos e atentos. Zia com certeza perceberia qualquer movimento suspeito.
Sadie estava mais preocupada com a falta das varinhas. 

—Dificilmente vamos conseguir expulsar esse cara só com a sua espada – ninguém respondeu ao seu comentário, eu na verdade estava mais preocupado sobre até quando Sadie iria conseguir me deixar apoiado antes de me largar no chão e sair reclamando. Minha irmã suspirou. Sentia que ela queria dizer mais alguma coisa, mudando seu olhar no chão até o céu — Dependendo da força, precisarei usar aquela magia.

Forcei a parar e a encarei, conseguiu ganhar a minha atenção, Zia repetiu o gesto. Sadie estava louca em sequer pensar em usar aquela magia sem a deusa Ísis habitando seu corpo, tentei enviar minha firmeza com o olhar, mas era difícil, Sadie não me considerava tão decidido e importante.

—Não – minha voz saiu meio falhada. Sadie nunca me levaria a sério se eu dissesse assim. – Nem pense nisso.

— Então o senhor líder-futuro-faraó tem alguma ideia melhor? – ela devolveu, Zia começou a acompanhar a discussão. 

—Qualquer uma que não envolva esse feitiço.

—  Carter, cala essa boca. Eu conheço meus limites – me senti tentado em amarra-la naquela árvore e sair para derrotar o demônio com Zia, Sadie não conhecia os próprios limites.

— Você sabe o que pode acontecer se você não tiver energia suficiente para levar a criatura para o Duat? – consegui finalmente andar sozinho. Sadie pisou duro no chão.

— Já cansei de ouvir o que pode acontecer caso eu não tenha energia suficiente, acontece que eu sempre tive energia suficiente e estou viva até agora. O que mudou da última vez e agora?

Mudou que você não tem uma deusa para te ajudar, iria dizer com toda a segurança, mas Zia, que estava na frente, voltou apressada e pediu silencio. Com a discussão perdemos a noção do tempo, ali estava mais claro que antes. Apertei os olhos.

Era na divisa com uma outra clareira, e lá se encontrava o nosso alvo, no centro, era...

Sadie foi a primeira a perceber e seu grito baixinho e discreto conseguiu chamar a atenção da criatura, que levantou a cabeça. Era pálido; tinha de três a quatro metros de altura; magra, muito magra; os tentáculos horríveis saíam de suas costas e a roupa... um terno formal...

— Por Rá... – minha irmã sussurrou, sua voz bem uma oitava a cima da normal. Compreendi, se tivesse dito algo, também estaria no mesmo tom.

Afinal, aquele cara era a lenda urbana que eu mais pensei que fosse falsa no mundo inteiro.

Slender man – Sadie sussurrou. – O homem esguio.

— O quê? – Zia sussurrou ao nosso lado. Ele apenas mantinha o rosto vazio apontada em nossa direção, continuando a recolher seus membros vagamente, éramos apenas as visitas, e ele o cozinheiro que preparava tranquilamente o jantar. Eu estava com medo da opção de nós sermos o jantar.

Fechei os olhos com força ao ver o que estava deitado na frente de suas pernas, Sadie se virou e ameaçou vomitar, Zia estava boquiaberta.
O rosto era de Biley, mas o corpo, ou as partes dele, estavam espalhados por todo o raio de três metros do Slenderman.

- Esse cara... – A respiração de Sadie estava trêmula. – É realmente o cara?

Expliquei rapidamente para Zia o que o Slender Man era e o que fazia, questionando no final a probabilidade dele ser um demônio egípcio não muito citado em escrituras. A garota assentiu bem devagar.

- Esse portal de outra dimensão, você tem certeza? – Balancei a cabeça.

- Ninguém tem certeza de nada desse cara, alguns dizem que ele leva suas presas para outra dimensão, mas o Biley... – Olhei na direção do corpo, chacoalhando a cabeça.

- Essa outra dimensão pode ser o Duat – Sadie interveio, sua boca tremia enquanto falava. – É bem lógico

               Eu e Zia trocamos olhares, como o plano iria continuar? Sem varinhas e pelo que me parecia no jogo daquele cara, ele poderia se transportar e nos matar pelas costas a qualquer segundo. Mas a diferença era que aquilo não era apenas um jogo.

Olhei para o homem esguio, o primeiro tentáculo chegou, aproximou o adolescente e reconheci Fred, ele chorava, implorando misericórdia. Dei o primeiro passo, mas Zia pegou no meu braço balançando a cabeça. A criatura, nem hesitar por um único segundo, enfiou outro tentáculo no estômago do meu colega de barraca e o abriu. Sangue e partes do intestino voaram, alguns marshmallows reviraram meu estômago, Sadie soltou um guincho de pavor, Zia abaixou a cabeça, com os dentes cerrados.

Ele iria matar todos.    


Mitos são ReaisOnde histórias criam vida. Descubra agora