BO$$

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Levantei da cama ainda um pouco desnorteada pelo sonho. Fui até o banheiro e fiquei encarando o espelho, como se a qualquer momento meu reflexo fosse mudar e outra pessoa fosse me encarar por ele. Não outra qualquer, mas ela.

Balanceio a cabeça, jogando pra longe aquele pensamento. Acorda, Camila. Era só um sonho. Só um sonho que vem se repetindo à anos, do mesmo jeito, com a mesma pessoa. Abri o armário com força, me livrando do reflexo e das lembranças que ele trazia.

40 minutos depois, eu já estava no carro a caminho do trabalho. Como secretária executiva do CEO da Normani’s, eu podia me gabar da minha posição, até porque ela não veio sem muito esforço. O prédio ficava a alguns quarteirões da minha casa, então em pouco tempo eu já estava passando entre as enormes portas de vidro do lobby. Graças a Deus por isso, eu odiava o trânsito.

Dinah estava trabalhando na recepção naquela manhã, e parecia discutir com um cliente pelo telefone. Na verdade, ele parecia estar discutindo com ela. Ela me viu e acenou, enquanto fazia um sinal com telefone e revira os olhos. Não pude deixar de rir, a paciência dela me dava inveja. Se estivesse no seu lugar, já teria sido demitida por vocabulário inapropriado (vulgo “vá se foder”).

Me aproximei e coloquei a bolsa em cima do balcão, enquanto esperava ela terminar a ligação. Depois de mais alguns “tudo bem, senhor”, “sim, senhor”, “desculpe, senhor” , ela finalmente desligou. Depois pegou o telefone, e usou como se fosse uma arma, dando um tiro na própria cabeça. Eu ri.

- Eu realmente não sei como você aguenta, Dinah. Porque você simplesmente não finge que a ligação caiu?

-  Porque chega a ser engraçado como eles ficam sem fala depois que você concorda com tudo. Fora que, eles só iriam ligar de novo e o barulho do telefone não me deixa trabalhar. Você quer a agenda de hoje?

- Sim, por favor. O Sr. Malik precisa de uma cópia impressa, por mais que seu blackberry o avise de todos os compromissos. – eu falei, revirando os olhos.

Dinah riu enquanto procurava o documento certo no computador, e eu comecei a revirar minha bolsa atrás do meu crachá, até que senti uma mão na minha cintura. Era um toque familiar, mas nem por isso bem vindo.

- Ora ora, se não é a secretária sênior mais charmosa da empresa. De quem é o saco que você vai puxar hoje na empresa, sra. Cabello? Eles são divididos semanalmente ou mensalmente? Talvez por ordem alfabética? – Essa voz nojenta e cheia de sarcasmo só podia pertencer a Austin Butler. Ele havia entrado na empresa no ano anterior, e apesar de estar vários níveis abaixo de mim na hierarquia da companhia, agia como se fosse muito superior apenas por ter um pinto. Meu Deus, até a respiração dele me enojava.

Me virei, empurrando ele para longe e limpando minha roupa como se ele a tivesse contaminado

– Cala sua boca. Você sabe quem manda nessa casa. Um passo em falso e você está fora, então no seu lugar, eu estaria sim puxando sacos. No caso, puxando o meu. – Ele deu um sorriso que era metade vergonha, metade raiva e levantou as mãos em sinal de rendenção.

- Calma, Camilinha, era só uma brincadeira. Mas claramente você está de tpm e eu escolhi um péssimo dia pra brincar. Mulheres e suas mudanças de humor – ele falou, dessa vez rindo descaradamente de mim.

Ah, não, se ele acha que vai me humilhar pelo meu sexo, está muito, muito enganado.

- Você quer que eu saia daqui direto pro RH? As câmeras tem áudios, você sabe disso. É melhor tirar seu traseiro daqui e me mostrar algum respeito. – Eu falei, apontando pra uma das câmeras fixadas na parede oposta.

Ele recuou ainda mais, mas aquele sorriso insuportável ainda continuava lá enquanto ele saia para o elevador, acenando. Eu bufei e passei a mão no rosto, tentando me livrar da raiva.

Dinah saiu de trás do balcão e veio para o meu lado, apertando meu ombro com uma mão e me entregando a agenda impressa com a outra.

- Eu não sei como você aguenta, Camila. Porque você não vai mesmo ao RH? Eles jogariam esse cara na rua em 3 tempos.

- Você sabe que eu não posso. A família dele tem muitas ações na empresa. Eu seria demitida e provavelmente teria o nome sujo em todo o mercado por esse desgraçado. Infelizmente, ainda preciso de dinheiro pra sobreviver, e até que gosto um pouco do meu emprego. Não quero ter que começar a ir para sua casa implorar por comida. – ela deu uma risadinha, e eu baixei a cabeça pra conferir a agenda.

Droga. Hoje era o dia dos novos estagiários. Recentemente a Normani’s havia feito uma parceria com uma Universidade da cidade para receber estagiários em diversos setores da empresa. Todos eles iriam se formar em pouco tempo, e precisavam de alguma vivência no mercado de trabalho. Eu era a responsável por apresentar a empresa a todos e havia me esquecido completamente disso.

- Não, não, não, não. Dinah, os estagiários! Eu esqueci deles! Droga, merda, porra!- ela riu da minha indignação, o que só me deixou com vontade de xingar um pouco mais.

- Não é pra rir! Eu to ferrada! Tenho
que substituir o Malik em uma reunião hoje, não tenho tempo de fazer uma tour conheca-seu-novo-emprego. Será que a Vero poderia fazer isso por mim? – Minha cabeça estava a mil, tentando encontrar alguma solução.

Dinah fez uma cara de assustada, e depois sorriu, um sorriso bem maldoso. Segurou meus ombro e os apertou brevemente- Eu acho que não. Eles já estão aqui. – Então ela me virou para encarar um bando de adultos com cara de adolescentes.

Eram aproximadamente 30, enchendo o lobby com roupas semi amassadas, tentando parecer profissionais enquanto suas caras denunciavam que estavam completamente perdidos. Alguns pareciam se conhecer, e todos tinham aproximadamente a mesma idade.

Fui percorrendo seus rostos até parar em um bastante familiar. Eu suspirei e recuei, assustada.

Ah não.

Ah.

Não.

Merda, não!

Era ela.

THE GIRL IN MY DREAMSOnde histórias criam vida. Descubra agora