Won't You Torture Someone Else's Sleep?

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Minhas mãos tremiam e minha boca salivava com a ideia de que eu iria vomitar a qualquer instante. Na realidade, meu corpo inteiro tremia internamente e eu agradeço por estar sentado, senão eu sei que minha cara já teria ido de encontro ao chão. Meus olhos não piscavam e eu sentia que estava sozinho, rodeado por nada e o tempo era lento. Mentira, o tempo nem ao menos existia, não seria possível eu estar travado assim por tanto tempo — ou tempo nenhum. Meu cérebro tinha dado um blackout zerando todo o tipo de informação e tudo que ele mostrava eram as letras berrantes: esse é o melhor dia da minha vida.

Nosso álbum, por incrível que pareça, vendeu muitas cópias e chamou a atenção de muitas pessoas, o suficiente para nossa gravadora nos chamar para fazer uma turnê. Isso é possível? Até um mês atrás eu estava sentado em minha garagem bebendo uma cerveja com Ray falando sobre como era trabalhar em uma loja de histórias em quadrinhos. Entrar em turnê não seria algo tão novo, mas como uma banda principal, não uma de abertura... me parecia um desafio arriscado, mas eu estava pronto para enfrentar desafios.

A notícia havia sido dada cerca de duas horas atrás, quando assinamos com eles, e eu ainda encontrava-me na mesma posição. Entorpecido. Era uma das únicas vezes em que eu me sentia dessa forma sem o incentivo de alguma droga ilícita. Porém a pilha de nervosos ambulante, popularmente conhecida por Gerard, ou como vocês gostam de me chamar, precisava de uma droga lícita para aliviar a tensão, e foi assim que eu acendi meu cigarro.

Minha mão ainda apresentava um pequeno tremor, mas era menos frequente assim que prendi o cigarro entre meus dedos após a primeira tragada. Soltei a fumaça da forma mais lenta que fui capaz, deixando cada espectro de nicotina penetrar meu corpo. Encarava o mesmo ponto fixo há duas horas, desde que fui deixado sozinho naquele quarto, minha visão já borrada e enganado minha percepção, não que minha visão fosse muito importante no momento. Tudo o que eu pude pensar e reunir em palavras foi:

— Eu consegui...

*

O sorriso de Frank era uma recompensa boa o suficiente por ter saído de casa. Não tenho o costume de sair por volta das 16h da tarde, mas dar um passeio no parque com o garoto parecia um bom plano para quarta-feira, ainda mais em um dia consideravelmente ensolarado e não muito quente, estava um clima bom. Estar com ele deixava qualquer clima bom, na realidade. Sentamos em um banco de madeira que estava vazio e tomamos o sorvete que ele insistiu para pegar.

— Por que o seu sorvete é verde? — ele perguntou apontando para o doce em minha mão.

— Porque ele é de pistache.

Frank fez uma careta de nojo digna de um rapaz de 11 anos de idade e voltou a tomar o seu sorvete ofendido.

— Como assim você não pegou de chocolate? —  ele encarou sua casquinha com um sorriso — Cara, é muito difícil achar sorvete de chocolate vegano, eu to muito feliz!

Ele era assim. Ele era simples, fácil de conviver, fácil de conversar. Sempre tinha um sorriso em seu rosto, mesmo quando ele não estava bem — e eu sempre conseguia perceber quando ele não estava —, ele não parava de sorrir, porque ele sabia que mesmo se ele não estava bem, o sorriso dele poderia deixar outra pessoa bem. Ele era assim, alguém que se preocupa mais com os outros do que com si mesmo.

Eu estava feliz com Frank comigo, eu sentia que não queria estar com outra pessoa além dele naquele momento. O que me fez perceber algo. E um sorriso surgiu em mim. Sempre soube que ele seria a resposta, mas não sabia que aconteceria assim, tão simplesmente. Não foi um baque ou um corte rápido, foi algo imperceptível e eu não poderia agradecer mais por isso, e a forma de agradecer seria falando com ele. O garoto falava animado ao meu lado e eu aproveitei para segurar sua mão e entrelaçar nossos dedos, fazendo com que ele parasse de falar e desse um sorriso, mesmo com suas bochechas adquirindo um tom avermelhado.

Insomnia//FrerardOnde histórias criam vida. Descubra agora