CAPÍTULO 7 - PESSOAS CINZAS

16 2 1
                                    


Fazia tempo que Andrea não dormia tão bem. Estava renovada. Antes de ir ver Raul, preparou o café, arrumou numa bandeja, colocou uma fatia de melão, iogurte e suco de laranja, além da xícara de café. Quando entrou no quarto teve um choque ao ver o estado em que estava Raul.

– Meu Deus, o que aconteceu? O senhor está pálido como uma vela.

– Estou muito fraco, tive diarreia e cólica a noite toda. Achei que fosse morrer. Tentei te chamar, mas minha voz estava tão fraca que acho que você não ouviu.

– Acho melhor voltar a dormir aqui com o senhor.

– Acho que não é necessário.

– Podemos comprar uma campainha e deixar ao seu alcance. Com ela é impossível não acordar.

– Acho melhor, não quero te desgastar demais dormindo aqui. Você precisa descansar bem, sei que deve ser difícil seu trabalho.

– Eu estou acostumada. O que será que te fez mal? – Ela sabia, mas ficou verdadeiramente preocupada com o estado de Raul.

– Não sei. Só sei que nunca senti tanta dor de barriga.

– Vou dar um banho no senhor. Depois o senhor come direito.

Depois do banho tomado e do café da manhã, Raul já estava mais corado.

– Pra mim a pior parte é não ser capaz de me limpar e tomar banho sozinho. Todo dia é um tormento.

– Não se preocupe, faz parte do meu ofício.

– Nem sempre fui assim tão enrugado e flácido. Estou parecendo um maracujá embolorado. Pegue uma caixa de fotos ali na terceira gaveta da cômoda, por favor.

Andrea pegou a caixa e colocou sobre as pernas de Raul. Era uma caixa com fotos, centenas delas. Raul vasculhou a caixa e por baixo daquele amontoado de recordações tinha uma foto maior, já gasta pelo tempo. Era essa foto que Raul queria encontrar.

– Está aqui. Veja, eu não era de se jogar fora. – Entregou a foto para Andrea. – Essa foto foi tirada pouco antes de eu me mudar pra Cinco Morros.

Andrea pegou a foto, virou-a e quando olhou sentiu as pernas bambearem. Realmente ele era muito bonito, atlético. Mas vê-lo com a aparência que tinha na época em que abusou do menino, não lhe fez nada bem. Era como ficar cara a cara com outro homem, não aquele adoentado e sensível, mas um monstro capaz de qualquer coisa para saciar seus desejos. Demorou um pouco para se restabelecer.

– O Felipe se parece muito com o senhor. – Tentou desviar a atenção do olhar penetrante no retrato, ainda vivo apesar do amarelado da foto.

– É verdade.

– Acho que o senhor deveria emoldurar essa foto, apesar de velha, ela é muito bonita. O senhor foi jogador profissional? – Referindo-se à camisa do São Paulo Futebol Clube que ele vestia orgulhoso.

– Quase. Cheguei a treinar no time de base. Estava indo muito bem, mas tive que abandonar esse sonho.

– Mas porquê? Que pena.

Raul pensou um pouco, baixou os olhos.

– Um dos integrantes da comissão técnica me assediou e como ele viu que não ia conseguir nada, passou a me barrar nos jogos e treinamentos.

– Que canalhice, isso deve ser muito comum.

– Mais do que você imagina.

– E porque o senhor não tentou em outro time?

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Jun 07, 2017 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

COISAS DE MENINOOnde histórias criam vida. Descubra agora