Capítulo 3 O forasteiro

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- E o que um guri esperto faz tão tarde enganando bêbados durante uma nevasca?

- É simples, meu bom forasteiro. Durante as noites de tempestade mais intensas, a taverna é o único lugar em que se pode abrigar-se, por aqui não há cavernas como mais abaixo das montanhas, e muitos viajantes espertos percebem isso logo que chegam aqui. Outros, porém seguem adiante e como não conhecem a geografia deste lugar acabam se perdendo e padecendo no frio. Meu trabalho é entreter essa gente de vez em quando. Na verdade são dois trabalhos, um é conseguir tirar algum dinheiro ou comida dos viajantes, outro é catar os cadáveres dos coitados que morreram mais adiante. E tenho trabalhado muito neste inverno, em específico.

- Esse moleque é maluco. Qualquer dia vai se meter numa enrascada. – Ruminou Hughes enquanto lhe oferecia mais um caneco com leite.

- Você então deve ficar sempre de olho em quem passa por este lugar não é moleque. - Disse afirmativo o forasteiro, já interessado na história do pequeno.

- Sabe o que dizem os povos do outro lado do mundo sobre o fumo? Lá eles adoram esse fumaceiro todo, diziam que unia o homem com a natureza e o mundo dos espíritos, e eles vinham da boca pela fumaça, o arroz vem de uma terra distante, eu já fui lá quando era moço... – Dizia um velho bêbado ao lado do homem de barba castanha, mas Hughes fitava o forasteiro numa intensidade temerosa.

- Alcino, já chega moleque. - Hughes ficou apreensivo, o homem falava friamente, chegava a ser obscuro. O dono da taverna ficou intimidado com seu olhar. Havia visto homens com aqueles olhos. Isso não lhe trazia boas recordações vividas, pois sempre estes homens vinham de caminhos tortuosos. De morte.

A taverna estava cheia, os viajantes em casacos grandes de pele de urso, forrados dos pés à cabeça em tons de marrom e cinza, bebendo rum e fumando cachimbo.

O forasteiro enfiou as mãos numa pequena sacola presa no interior do casaco. Pôs encima da mesa e desamarrou. Dentro o pequeno viu um punhado de moedas de prata, com o brasão de quimera.

- Procuro um guia que saiba tudo sobre essas terras.

- Tudo e mais um pouco, meu bom forasteiro.

- Meu senhor! – Interrompeu exaltado o senhor Hughes, e continuou - seja lá o que for este menino não ajudara alguém como o senhor. Podemos parecer caipiras, mas sabemos o que você procura só de olhar nos seus olhos. – Disse colocando um copo vazio sob a mesa. O homem respirou fundo. Fitou Hughes pegou o saco de moedas e pôs na direção de Hughes.

- Proponho uma coisa então, se você se importa tanto com este moleque guardará este pagamento para que ele venha pegar depois. Assim não terei como enganá-lo.

- Droga velho, você tinha que se meter... – Grasnou Alcino e deu de ombros.

- Quer dizer então que você aceitaria uma proposta destas sem sequer pensar no que pode te acontecer?

- Essa escolha é minha, velho.

O homem ficou impaciente e logo se levantou e deu de costas para Hughes.

- Estou indo.

- Mas ainda é noite. - disse Hughes pasmo.

- Espere ai mestre. Disse Alcino pegando suas coisas e um copo de leite. Correu e saiu junto com o homem antes mesmo de Hughes dar a volta de trás do balcão.

A Canção sobre a NeveOnde histórias criam vida. Descubra agora