CAPÍTULO VII

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Pessoas queridas, precisei remover um capítulo pois estava errado, esse é o capítulo VII, o que estava como VII é o VIII, e virá na sequência. Desculpem o erro, foi a correria.

Boa leitura! 😘

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A excelente opinião de Emma sobre Frank Churchill foi um pouco abalada no dia seguinte, quando soube que ele fora a Londres apenas para cortar
o cabelo. Durante o café da manhã ele pareceu tomado por súbita agitação.
Mandou chamar a carruagem e partiu com a intenção de retornar para o jantar, ao que parece sem nenhum propósito mais importante do que cortar o cabelo.
Certamente não havia mal algum em viajar vinte e cinco quilômetros de ida e outro tanto de volta para uma incumbência desse tipo, mas havia nessa atitude um tanto de presunção e tolice que Emma não podia aprovar. Não estava de acordo com a racionalidade, a moderação de gastos e mesmo a generosidade de coração que ela julgara ver nele no dia anterior. Vaidade, extravagância, amor pela novidade, impaciência, são coisas que podiam ser boas ou ruins. Negligência para com os sentimentos do pai e de Mrs. Weston, indiferença aos comentários que sua conduta podia despertar nas demais pessoas; ele tornou-se culpado de todos estes males. Seu pai o chamou apenas de dândi vaidoso, e achou a história muito boa. Mas ficou bastante claro que Mrs. Weston não havia gostado, pois encerrou logo o assunto dizendo que “todos os jovens tem seus pequenos caprichos”.
Com exceção dessa pequena mancha, Emma achou que a visita dele, até o momento, despertara apenas boas impressões em sua amiga. Mrs. Weston estava sempre disposta a declarar como ele era um companheiro atencioso e
amável, e o quanto apreciava sua disposição para tudo. O jovem parecia ter um temperamento bastante franco, com certeza era muito alegre e vivaz. Emma não observou nada errado em suas ideias, que eram muito ajuizadas. Falou do tio com cálida afeição e adorava falar nele – disse que o tio seria o melhor homem do mundo se o deixassem à vontade. Embora não fosse apegado à tia, reconheceu sua bondade e mostrou-se grato, e falava dela sempre com grande respeito. Isso tudo era muito promissor, e exceto pela inoportuna vaidade de
cortar o cabelo em Londres, não havia nada que o tornasse indigno da distinguida honra que a imaginação de Emma lhe havia conferido. A honra, se não de amá-la, mas de estar bem próximo disso, salvo apenas pela própria indiferença de Emma (ela ainda mantinha a decisão de não se casar). A honra, em suma, de ser
destinado a ela pelos laços entre as duas famílias.
Mr. Weston, por sua vez, acrescentou a virtude de uma revelação que devia ter algum peso. Ele deu a entender para Emma que Frank tinha extrema admiração por ela, achava-a muito bonita e bastante encantadora. E com tantas coisas boas para se dizer sobre ele, ela achou que não devia julgá-lo com muita severidade. Como Mrs. Weston observou “todos os jovens tem seus pequenos caprichos”.
Havia uma pessoa, entre os novos conhecidos de Frank Churchill em Surry, que não estava disposto a considerá-lo com tanta brandura. De forma geral, ele era julgado com muita boa vontade nas paróquias de Donwell e Highbury, onde todos faziam concessões liberais aos pequenos excessos de um
jovem tão bonito – ninguém sorria com tanta frequência ou fazia reverências tão graciosas como ele. Mas havia um espírito entre eles cujo poder de censura não podia ser aplacado por sorrisos ou reverências: Mr. Knightley. Ele soube do fato em Hartfield e, por um momento, ficou em silêncio. Mas Emma ouviu-o dizer a si mesmo, logo após, sobre um jornal que segurava nas mãos:
– Hum! É bem o rapaz bobo e frívolo que pensei que fosse.
Emma tinha motivos para se ressentir, mas após uma breve observação convenceu-se que ele dissera aquilo apenas para aplacar os próprios sentimentos, e não para provocá-la. Então, deixou passar.
Apesar de não serem portadores de boas notícias, a visita de Mr. e Mrs. Weston nesta manhã revelou-se particularmente oportuna em outro aspecto. Algo ocorreu enquanto estavam em Hartfield, que fez com que Emma procurasse seu conselho. E, o que era ainda melhor, o conselho que ela desejava ouvir foi exatamente o que eles lhe deram.
O que ocorreu foi o seguinte: Os Coles estavam estabelecidos em Highbury há vários anos, e eram pessoas muito boas – amigáveis, liberais e despretensiosas. Por outro lado, eram de origem inferior, do comércio, e apenas moderadamente educados. Logo que chegaram à região viviam de acordo com a sua renda, modestamente, recebendo poucas pessoas, e mesmo assim com poucas despesas; nos últimos dois anos, porém, sua renda cresceu muito, o estabelecimento que tinham na cidade dera bastante lucro, e a fortuna lhes sorriu de forma geral. Com sua riqueza, os horizontes dos Coles se ampliaram, desejavam uma casa melhor e receber mais pessoas. Aumentaram a casa, o número de criados, e as despesas de todo tipo; por essa época já tinham se
tornado, na fortuna e estilo de vida, a segunda família mais importante do lugar, abaixo apenas de Hartfield. Seu amor pela sociedade, e sua nova sala de jantar, estavam preparados para receber convidados; já haviam realizado algumas reuniões, principalmente de homens solteiros. Emma dificilmente poderia supor que eles se atrevessem a convidar as melhores famílias: nem Donwell, nem Hartfield, nem Randalls. Nada faria com que ela fosse, mesmo que os outros aceitassem. Apenas lamentava que os conhecidos hábitos do pai tornassem sua recusa menos significativa do que ela desejava. Os Coles eram muito respeitáveis à sua maneira, mas deviam aprender que não lhes competia estabelecer os termos nos quais as melhores famílias passariam a visitá-los.
Temia que eles deveriam receber essa lição somente dela, tinha pouca esperança em Mr. Knightley e nenhuma em Mr. Weston.
Ela havia se preparado para esta circunstância com tantas semanas de antecedência, que quando o insulto finalmente aconteceu afetou-a de forma diferente do que esperava. As famílias de Donwell e de Randalls receberam seus convites, mas nenhum foi enviado para ela ou o pai. As palavras ditas por Mrs.Weston “Imaginei que eles não tomariam a liberdade de convidá-los. Sabem que
vocês não costumam jantar fora”. não foram suficientes para acalmá-la. Emma achava que devia ter o direito de recusar. Além disso, o encontro a ser realizado contava exatamente com as pessoas mais queridas para ela, e não sabia se não seria tentada a aceitar, caso viesse a receber um convite. Harriet estaria lá, assim como as Bates. Haviam conversado sobre isso enquanto passeavam por Highbury no dia anterior, e Frank Churchill lamentou profundamente a ausência dela. Perguntara mesmo se “a noite não vai terminar com um baile?” A mera possibilidade de isso acontecer a irritava profundamente, e era um pobre consolo ficar solitária em sua grandeza, mesmo que a omissão pretendesse ser um cumprimento.
Foi a chegada do próprio convite, no momento em que os Westons estavam em Hartfield, que tornou a presença deles tão oportuna. Embora a primeira coisa que Emma notou ao lê-lo fosse a observação ao final “é evidente que pode ser declinado”, ela começou logo a perguntar-lhes o que devia fazer, e o conselho deles para que aceitasse foi muito bem recebido.
Emma merecia isso; considerando-se tudo, ela não deixava de sentir vontade de ir à festa. Os Coles haviam se expressado de forma tão apropriada – havia verdadeira atenção nos termos do convite - e com bastante consideração por seu pai. “Eles teriam solicitado a honra com mais antecedência, mas estavam aguardando a chegada de um biombo vindo de Londres que, esperavam, poderia manter Mr. Woodhouse abrigado de qualquer corrente de ar, e assim induzi-lo com mais facilidade a dar-lhes a honra de sua companhia”.
Emma logo se deixou persuadir. E os três rapidamente acertaram entre si o que deveria ser feito para que o conforto do idoso cavalheiro não fosse negligenciado – certamente podia-se contar com Mrs. Goddard, senão com Mrs. Bates, para fazer-lhe companhia. Deveriam conseguir a anuência de Mr. Woodhouse para que sua filha saísse para jantar fora e passasse a noite toda longe dele. Quanto à ida dele, Emma não queria que ele a julgasse possível, pois a festa terminaria tarde demais e haveria muita gente. Ele logo se conformou.
– Nunca gostei de jantares – disse ele – jamais gostei. Emma também não. Nós não gostamos de horas tardias. Sinto que Mr. e Mrs. Cole tenham organizado dessa forma. Acho que seria bem melhor se eles viessem aqui em uma tarde do próximo verão para tomar chá conosco, ou para um passeio à tarde – o que eles por certo poderiam fazer, pois nossos horários são bem razoáveis – e podem voltar para sua casa antes que caia o orvalho da noite. Eu não exporia ninguém ao orvalho de uma noite de verão. No entanto, se querem tanto que a querida Emma vá jantar com eles, e como vocês dois irão, e Mr. Knightley também, para cuidar dela, não desejo impedir isso, desde que o tempo esteja bom, sem umidade, sem frio e sem vento. – Voltando-se, então, para Mrs. Weston, com um leve ar de censura – Ah, Miss Taylor! Se a senhora não tivesse se casado poderia ficar em casa comigo!
– Bem, senhor – exclamou Mr. Weston – como fui eu que levei Miss Taylor embora, é minha incumbência arranjar-lhe uma substituta, se puder. Vou pedir a Mrs. Goddard no momento, se não se opõe.
Mas a ideia de fazer qualquer coisa no momento aumentava a ansiedade de Mr. Woodhouse, ao invés de diminuí-la. As senhoras sabiam melhor como lidar com isso. Bastava Mr. Weston se calar que tudo se arranjaria.
Com as atenções das duas logo Mr. Woodhouse acalmou-se o suficiente para falar da forma usual. “Ficaria feliz de ver Mrs. Goddard. Gostava muito de Mrs. Goddard, e Emma devia escrever uma carta convidando-a. James poderia levar o bilhete. Mas antes de tudo deviam escrever a resposta para Mrs. Cole”.
– Você deverá pedir desculpas em meu nome, minha querida, com a maior gentileza possível. Pode dizer-lhes que estou quase inválido, que não vou a lugar algum, por isso me vejo obrigado a declinar do seu amável convite.
Comece com os meus cumprimentos, é claro. Mas tenho certeza que fará tudo certo, não preciso dizer-lhe o que escrever. Não podemos esquecer-nos de avisar a James que a carruagem deverá estar à disposição na terça-feira. Não tenho medo algum sabendo que ele a levará. Nunca estivemos lá, desde que foi aberta a nova estrada, mas ainda assim não tenho dúvidas que James a levará com toda a segurança. E quando chegar lá deverá avisá-lo a que horas poderá retornar para buscá-la. É bom que venha cedo, pois eu sei que não gosta de voltar tarde.
Você já estará muito cansada depois que servirem o chá.
– Mas o senhor não gostaria que eu voltasse antes de ficar cansada, não é, papai?
– Ah, não, meu amor. Mas logo estará cansada. Haverá muitas pessoas falando ao mesmo tempo, e sei que você não gosta de barulho.
– Mas, meu caro senhor – exclamou Mr. Weston – se Emma sair cedo vai estragar a festa.
– Será até bom que isso aconteça, quanto mais cedo acaba uma festa, melhor.
– Mas o senhor não está considerando como isso vai afetar os Coles. Se Emma sair logo após o chá pode parecer ofensa. São pessoas muito bondosas, e pensam pouco de seus próprios direitos, mas ainda assim irão sentir que não é muito lisonjeiro que as pessoas saiam apressadamente da festa. E sentirão mais se Miss Woodhouse fizer isso do que qualquer outra pessoa presente. O senhor com certeza não deseja desapontar e ofender os Coles. Eles são tão amigáveis, as melhores pessoas do mundo, e são seus vizinhos há dez anos.
– Não, por nada no mundo, Mr. Weston, sou-lhe muito agradecido por me lembrar disso. Eu ficaria extremamente aflito se causasse algum aborrecimento aos Coles. Sei o quanto são dignos. Perry disse-me que Mr. Cole nunca bebe nenhuma bebida alcoólica de malte. Não se pode adivinhar só de olhá-lo, mas ele é bilioso. Mr. Cole é muito bilioso. Não, eu jamais desejaria lhe causar qualquer mal estar. Minha querida Emma, devemos considerar isso.
Tenho certeza que você preferirá ficar na festa um pouco mais do que gostaria do que correr o risco de magoar os Coles. Você não vai se importar se ficar cansada, estará perfeitamente segura entre os amigos, você sabe.
– Oh, sim, papai. Não tenho medo nenhum por mim mesma, e não me importaria de ficar até mais tarde com Mrs. Weston, a não ser por sua causa, papai. Só tenho medo que o senhor fique sentado me esperando. Tenho certeza que vai ficar muito confortável com Mrs. Goddard. Ela adora piquet[1], o senhor sabe, mas quando ela for embora temo que o senhor fique sentado sozinho, ao invés de ir para a cama no seu horário normal – e a ideia de que isso possa acontecer destruiria minha tranquilidade por completo. O senhor deve me prometer que não ficará acordado.
Ele prometeu, em troca de algumas promessas da parte da filha. Tais como: se ela chegasse com frio, deveria se aquecer completamente; se estivesse com fome, teria que comer alguma coisa; que a criada particular dela a esperasse acordada; e que Serle e o mordomo deviam verificar se tudo estava seguro na casa, como sempre.

[1] Jogo de cartas para dois jogadores, de origem francesa. Conhecido desde o século XVI, era muito popular em toda a Europa. Em francês no original.

Emma - Jane AustenOnde histórias criam vida. Descubra agora