"Quando acordei hoje de manhã, eu sabia quem eu era, mas acho que já mudei muitas vezes desde então."
9 anos depois...
Cultivei o hábito de acordar cedo, não posso e nem quero, ficar dependendo de alguém pra isso, porém, especialmente hoje, despertei cedo demais, a manhã ainda estava fria e nada aconchegante, eu deveria estar na escola, as sete e meia, olhei o relógio, eram seis horas.
Desci as escadas quase correndo, não era felicidade, apenas precisava acordar, e lembrar a mim mesmo, que a minha vida não é uma merda.
Estava chovendo, e isso deixava as coisas bem menos acolhedoras, afinal, não me julgue, mas eu odeio a chuva.- bom dia Liv - disse sorrindo pra minha amiga, ou aliás, minha "irmã " emprestada, seis dias na semana ela fica comigo, ela é parte da minha família minúscula.
Seus pais estão num asilo, são bem velhos, e ela vai os ver aos domingos sempre, quando meus pais morreram ela permaneceu na casa, morava aqui como filha da empregada, porém a empregada se foi, e ela permaneceu, ela tem minha guarda até ano que vem.
Ela é minha família.
Uma família que continha apenas eu, e ela. Dois solitários- bom dia, o frio te tirou da cama Dom? - meneei a cabeça, ela falava devagar, para que eu pudesse me concentrar em seus lábios, e entender o que dizia, aprendi a ler lábios no decorrer do tempo, enquanto me adaptava a ser quase 100% surdo, minha agilidade com a visão eram impressionantes aos olhos de Liv, as vezes brincávamos, ela tentava acertar oque eu dizia, ouvindo um daqueles rock gritaria, e quase nunca acertava, mas assim, me aprimorei mais ainda, além das aulas, óbvio.
Sou um surdo bilíngue. ( oralizado, conhecimento em libras)
- olha oque eu achei ontem - ela pós a caixa com meus aparelhos auditivos, super caros, que ela fez questão de pagar ao meu antigo médico pra fazer - você devia experimentar, ao menos uma vez. - disse a mulher, nos seus vinte e nove anos de persuasão.
Odeio olhar aqueles aparelhos, me fazem relembrar, ou até mesmo reviver, caso eu olhe demais para, os momentos em que não consegui salvar meus pais, prefiro a vida sem sons, prefiro não ouvir o barulho da chuva, nem vozes que se pareçam com a de meus pais, eu estou feliz assim.
- Liv, nós já conversamos sobre isso, dê pra alguém que queira, a vida sem sons é ótima - a vi suspirar, me direcionei para o quarto, tinha que me arrumar pra ir a escola.
Último ano, finalmente.
***
A chuva passou antes mesmo, que eu terminasse meu café da manhã, resolvi ir andando, a escola não era longe, e é sempre bom andar para espairecer a mente.
Logo vi a fachada da escola, e sorri, as férias de inverno são um saco, sou resumido a meu sofá e TV, Mas com a volta das aulas eu não iria mais, parecer um solitário sedentário.
E nem teria que aturar Liv, me chamando pra jogar xadrez na mesa da sala de star, afinal, eu sempre perco, não é muito agradável, Liv não sabe ganhar.
Rostos novos. A primeira coisa que notei, chequei se meu lugar no meio da fileira, ao lado da janela, estava vago, e fui me sentar, meu amigo se sentava logo a frente, nós nos conhecemos dois anos depois da morte dos meus pais, e somos grandes amigos até hoje.- Luis, querida - disse sorrindo, assim que se sentou no lugar de prado, ele ergueu uma sobrancelha e bagunçou meus cabelos - mais ainda -me dando um tapa intermediário
- como foi a bad sem mim? - questionou olhando todos na sala, não consegui entender oque disse, talvez estivesse distraído demais.
- não sei. - eu disse, riu e olhou a professora entrar. - são professores novos, tem um novo horário lá em baixo, você viu? - ele assentiu
- aposto dois dólares que ela vai mandar todo mundo se apresentar - inspecionei sua face, ela não parecia tão careta.
- aposto cinco que não - ela colocou as coisas de qualquer jeito na mesa e se dirigiu a nós.
- Bom dia alunos, sou a nova professora de filosofia, como eu não conheço ninguém, e temos tempo de sobra, que tal se apresentarem - todos fizeram cara de tedio e resmungaram sem estritar - será nossa primeira atividade, vocês devem dizer um pouco sobre vocês quando eu chama -los na lista.
Peguei cinco dólares no meu bolso, a mão de Luis já estava estendida em cima da minha carteira.
Ele se virou pra mim, para facilitar a minha compreensão.- otario - disse rindo, e foi prestar atenção na chamada/atividade
Logo chegou no meu nome, afinal, sou a letra D.
- Dominic Allegra - seria um sobrenome estranho, se não tivesse uma trágica história por trás dele, sobre a morte dos pais de um garotinho, e a surdez do mesmo, passou no jornal, afinal eles tinham grande influência, eu sempre quis esquecer meu passado, mas sempre o recordavam a tona, e é doloroso, racionalizar que não lembro da voz da minha mãe, ou dos olhares do meu pai, e com compunção tento não me agredir internamente, e dizer que tudo bem, não lembrar.
Pela primeira vez, alguém conseguiu convencer meu eu interno, de que ele próprio, estava certo, porque ela não me lançou um olhar de pena, ou de condolências, apenas fez um gesto, para que me levantasse, como todos os outros.
Fiquei um segundo em choque, mas depois que Luis deu um pequeno chute no meu pé, me levantei.- bom... - tossi acanhado, eu olhei nos olhos da professora, como se pedisse socorro, nada - eu não sei oque dizer...
- fale alguma coisa sobre você, que ache importante - disse ela indolente a minha timidez efêmera
- bom, falem comigo de frente pra mim, e não estranhem se eu ficar olhando olhando a boca de vocês, sou surdo e esse é meu modo de saber oque estão dizendo - disse mesmo sabendo que alguns ali já sabiam, e os novatos ao ouvir meu nome também já soubessem disso, então me sentei, não havia nada pra contar a eles, nem me sinto mais triste quando lembro dos meus pais, só lembro da agonia de não poder ser ouvido por mim mesmo.
A chamada seguiu, e logo minha querida amiga atrasada chegou, quando o sinal bateu, ela estava com uma garota que não conhecia.
- Luís, Dom, essa aqui é a Edite - a Cristina, nossa amiga atrasada, falou super empolgada, porém mais uma vez me distraí, estava olhando a professora arrumar suas coisas e conversar com alguns alunos "filosóficos"
- perdão? - disse me concentrando em sua boca.
- Edite,esse é Dom - ela sorrio para mim e pro Luis - como foram as férias? - questionou se sentando ao meu lado e sua amiga na frente, ao lado de Luis.
Ela era bem simpática e logo se enturmou, chamando Luis de Louis, mas ele não a corrigiu, assim como ela não corrigiu ele por chama-lá de Édit.Não esqueçam da estrelinha ♡
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Amor E Silêncio
RomanceEu estive pensando em como a vida me machucou, no quanto ela pode ser cruel, talvez estivesse se vingando por eu ter tudo, sem restrições, talvez quisesse que eu sofresse um pouco, como todo mundo, claro que quando tudo aconteceu, eu era pequeno e f...