Capítulo 3 - O Reencontro

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Mal a gruta se abriu, Elaine não esperou mais e saiu. Já de dia, para ela era muito fácil orientar-se pelas árvores e o medo que sentira naquela noite tinha-se desvanecido como colunas de fumo. Começou a avistar o caminho de pedras brancas e de seves cuidadosamente cortadas e colocadas em pontos estratégicos para enaltecer a familia DiVaio, a sua família, e na qual tinha muito orgulho. Enquanto percorria os restantes metros que lhe faltavam começou a observar a grandiosidade e beleza da sua casa graças aos detalhes do estilo barroco e realmente, sabia que tinha muita sorte em ter nascido numa família à qual nunca faltara nada. Á chegada do portão principal a entrada foi-lhe barrada pelos guardas, provavelmente porque deveria estar irreconhecível. Para comprovar a sua teoria foi ver como estava o seu aspeto no reflexo do rio e começou a rir-se sozinha da maneira como se apresentava. Os seus cabelos louros já tinham tido melhores dias, estavam despenteados e ela era capaz de jurar que eles tinham trocado de cor para castanho. Os seus olhos castanhos já nem realçavam na sua pele clara e sardenta, de tão suja que estava. Por fim, olhou-se a si mesma de cima a baixo e o belo vestido de baile cor de vinho já quase nem poderia ser reconhecido por Juán, o seu próprio criador. Então sim, era normal que os guardas não a tivessem reconhecido.

Por sorte o filho de Egídia, Lorenzo, estava a passar e Elaine nem hesitou e chamou-o.
- Lorenzo, Lorenzo! - apanhou a parte que tocava no chão do vestido com ambas as mãos e correu até ele.
- Quem sois vós e o que quereis de mim? - Lorenzo fitou-a por breves instantes até os olhos lentamente se arregalarem de espanto - Elaine, estais bem, que alívio de vos ver! O Lord Pietro e a Lady Salete encontram-se extremamente preocupados, bem como os seus irmãos. Saiba que têm todos os seus guardas que podem ser disponibilizados á sua procura, bem como os de outras casas aliadas e a quem pediram auxílio. Venha, suba, nenhum deles hoje dormiu, devem estar todos reunidos no salão principal á espera de notícias suas. Entre, entre.
Entrou no coche como lhe foi pedido por Lorenzo e agradeceu a todos os anjos e santos o facto de ele ter aparecido, já que por ela mesmo não entraria.

Ao entrar no salão encontrou a família reunida como Lorenzo tinha dito. O pai estava sentado na poltrona com o olhar que fazia sempre que tinha que abrir uma carta trazida pelo mensageiro: um misto de concentração e nervosismo. O seu cansaço era notável, as suas olheiras destacavam os seus olhos azuis mais do que estes se notavam por si mesmos e os seus cabelos grisalhos estavam desconcertados de tanto mexer neles, um tique típico do Lord. A mãe tinha uma mão na cintura e outra em cima da mesa, mais concretamente em cima do mapa da cidade e arredores. A sua testa estava contraída, mostrando as rugas da idade, mas o seu olhar mantinha-se jovem e focado. A mãe sempre fora assim, calma e serena, mas se fosse para defender as sua crias tornava-se num furacão, sempre prática, objetiva e pronta a atacar. Ao contrário do marido, a Lady Salete estava impecável, os cabelos loiros encontravam-se apanhados numa cuidadosa e bela trança, provavelmente feita por Egídia, que além de ama era governanta, e a única pessoa de fora em quem a mãe confiava.
Yara abstraía-se do ambiente como sempre, quando algo a preocupava gostava de ficar sozinha a pensar numa solução. Olhava pelos grandes janelões para o jardim, e semicerrava os olhos azuis-céu quando via algum movimento. Elaine abriu um sorriso. Se a irmã estivesse a olhar para os jardins do lado oposto, provavelmente teria visto a sua chegada. Tinha os cabelos castanhos apanhados numa trança-coque para que não lhe bloqueassem os movimentos, embora o coque estivesse meio desarranjado, deveria ter adormecido em cima da mesa ou nos sofás.
Olhou para o irmão mais velho, este percorria o salão de um lado ao outro, tal era o seu nervosismo. Passava constantemente a mão nos seus cabelos ruivos, tal como o pai. E o sono já se fazia sentir uma vez que, da mesma forma que um bebé coçava os olhos azuis.
Nayara estava perdida num dos seus livros, lendo atentamente as páginas com os olhos verdes, mas o livro de capa vermelha e grossa provavelmente deveria ter alguma informação que ajudasse a descobrir onde estava a irmã. Sempre com a ponta do indicador, puxava os óculos de volta ao seu lugar certo no nariz e, quando parecia que encontrava algo, ao invés de os ajeitar, puxava-os para o cabelo castanho e lia a informação sem a ajuda deles. Algo completamente normal vindo dela.
O irmão com a idade mais próxima dela, Eurípedes, era o mais afastado. O seu olhar cinzento era frio e congelante, mas Elaine sabia que por dentro estava um pote a fervilhar e uma panela de soluções. Para contrastar com o pai, quando Eurípedes estava nervoso, em vez de desarranjar os seus cabelos loiros quase brancos que por si só já eram despenteados, ajeitava-os deixando-os como se molhados, completamente lisinhos e coordenados.
Esta era a visão geral do salão, uma família concentrado cada qual nos seus pensamentos e um silêncio avassalador. Embora os grandes portões ao abrir fizessem um barulho enorme, a família de tão concentrada que estava acabava por estar alheia ao exterior e Elaine, já estando lá a algum tempo á espera de reações ainda não era notada. Então decidiu mostrar que estava ali.
- Hrm, hrm! - aclareou a garganta e seis olhares recaíram sobre ela. Seis expressões abatidas mudaram repentinamente para seis sorrisos e seis vozes disseram a mesma coisa.
- Elaine! - Nayara correu para ela e abraçou-a como se não houvesse amanhã.
- Ainda bem que estás aqui! - disse-lhe - Tive medo que algo tivesse acontecido. Tive medo que os quae nox te tivessem apanhado depois da tua saída noturna pelo jardim. Que alivio... - a diferença de idades entre os irmão não era muito mais do que um ano, então Nayara não era bem mais velha do que Elaine.
- Filha, como é que a menina foi rastreada? Era suposto eles não terem conseguido, pagámos á bruxa para isso. - afirmou a mãe com um olhar carregado e cheio de dúvidas.
- Honestamente minha mãe, não sei, mas de uma coisa tenho a certeza, algo não está a bater certo, algo que não é muito bom está para vir. Mas por enquanto só quero tomar um duche quente e comer um daqueles arroz de pato que só a Egídia sabe fazer, juntamente com toda a família, já que há coisas que descobri e que preciso tirar a limpo.

A Filha Da LuzOnde histórias criam vida. Descubra agora