Maio

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E no jornal desse mês, o âncora apresentou a notícia como uma agressão gratuita, logo mostrou a filmagem para ilustrar o que dizia. O vídeo era a filmagem de um bar, no qual havia música ao vivo. A câmera focava o casal sentado na mesa, conversando alegremente, enquanto bebia, nada de incomum até aí. A ação começa quando o homem levanta e deixa a mulher sozinha. Essa era Laura Santos, como o âncora havia noticiado.

Nessa noite de folga ao lado do marido Roberto, tinha ido ao pagode em um dos bares da Lapa para relaxar. Roberto havia dito que estava apertado para ir ao banheiro e nesse momento em que se viu sozinha, foi abordada por rapaz. O vídeo não tinha áudio quando passou no jornal, mas Laura lembrava que disse não quando ele ofereceu uma bebida. Como insistiu, ela usou a fuga de ter um marido. Por que será que uma mulher precisa recorrer a um homem para outro entender que ela não quer? O rapaz, bonito, alto e sensual, continuou ao seu lado, insistindo que ela tomasse uma cerveja com ele. Ela, fechou a expressão, mostrou a aliança na mão esquerda e o copo cheio.

Foi o suficiente para sentir um soco que a derrubou da cadeira. Atordoada no chão, sentiu um pisão em sua mão com a aliança e chutes que quebraram o seu braço. Chorou indefesa, sem ação e com dor. O repórter narrando a filmagem, falou que o rapaz estava visivelmente sob efeito do álcool. Essa seria a defesa dele? A isenção de sua culpa? Laura devia processar a empresa de cerveja ou o bar que a vendeu?

O vídeo continuava, e mostrou Roberto se aproximando, tirando o rapaz de perto da esposa e abaixando para ver o seu estado. Ao seu lado, um garçom e duas mulheres perguntavam o que poderiam fazer. O vídeo não mostrou os olhos vermelhos de Roberto, ao deixar Laura sob os cuidados de estranhos e correr atrás do agressor. No jornal, o vídeo acabou e o repórter dava informações sobre a saúde de Laura, que estava bem, e sobre o agressor que tinha sido incluído na Lei Maria da Penha, e sua pena seria pagar cestas básicas.

O que o âncora não disse foi o que fez ele bater nela. Foi o não! Um simples não a bebida que ele oferecia. Como ela poderia negar-lhe uma bebida? Ele a observava enquanto sambava se exibindo com aquela saia curta e o salto alto. Rebolava ao ritmo da música e aí ele percebeu que ela queria. Queria uma noite selvagem com ele, queria ser usada. Então quando ela disse não, ele não admitiu a derrota, ele a queria de qualquer jeito. "Ela mereceu, bem feito", pensou ele enquanto corria do marido furioso. "Se tivesse aceitado a bebida, não teria apanhado. Bom... talvez mais tarde"

Roberto alcançou o rapaz e não viu mais nada, além de um nariz em sua mão, um braço quebrado nas costas do agressor e um pescoço em seu braço. Palavras baixas saiam de sua boca enquanto defendia a sua mulher e um dente voou da boca do agressor minutos antes da polícia chegar. Roberto contou tudo ao policial, que colocou o rapaz na viatura com um sorriso de deboche no rosto pelo estado do agressor.

Nas redes sociais, o caso repercutiu de tal forma que duas opiniões foram fortalecidas. Uma que Laura não deveria passar por aquilo, que podia usar a roupa que quisesse e sambar da forma que lhe convinha. Outra, que ela procurou, também que deixava claro que queria tomar uma bebida com ele e onde estava era sujeita a tudo, que realmente ela pediu. Afinal, uma mulher casta estaria em casa e não em um bar, bebendo e sambando. A mãe do agressor também se manisfestou, falando que a culpa a foi dela, que o filho não era disso. O que não chegara ao conhecimento dessa mãe, que ele havia feito outra vítima, porém em um ambiente doméstico e sem testemunhas.

Laura, não ficou quieta enquanto as pessoas a atacavam nas redes sociais, ela se defendia, porém a voz estava dentro dela como se realmente a culpa era dela. Então ponderou: era noite de folga, gostava de sambar, tomava cerveja e estava com o marido. Que mal havia nisso? Em que momento pediu para ser agredida? Em que momento havia dado sinais queria ficar com ele? Por que ela não podia se divertir, relaxar? Agora ela teria que ficar em casa para não se expor a isso? Teria que ser prisioneira para se proteger? Mesmo que estivesse sozinha, mesmo que estivesse com um homem desconhecido, mesmo que estivesse de biquini em um bar, a vida era dela. Apenas dela! Nada justificava aquela atitude tão baixa do rapaz que insistia em tomar cerveja com ela. Nada justificava a agressão. Nada! Em uma sociedade em que defende uma educação aos filhos sem agressão, e julgá-la pelas suas atitudes em uma noite de folga, não fazia sentido. Colocar a culpa na bebida que ele tomava, não fazia sentido. A culpa era dele, Laura chegou a conclusão.

A verdade é que aqueles que batem em mulheres não as vêm como seres humanos, pensantes e independentes. E sim, como objetos que podem e devem fazer o que eles querem. Não vêem também que a mulher alcançou destaque na sociedade e hoje acumula tarefas para fazer a vida acontecer. Em defesa do feminismo, movimento que muitos acham besta, digo que os homens, para dizer todos, devem ser mais feministas começando com o mínimo que aprendemos desde nossa infância: RESPEITO!

Esse mês o conto foi de Laura, vítima de um agressor. Qual seria sua atitude se fosse com você? Muitas mulheres ainda ficam quietas por medo ou por acharem normal. Posso ter ferido alguém nesse conto, mas não foi a intenção. Queria apenas mostrar como vejo essa situação. Será que você cruzou com uma Laura hoje na rua?
Até mês que vem...

Um conto por mês (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora