– Por que ele me chamou de Minos? – perguntou Manoel – digo o Tatuzão, ele me chamou de Minos.
– Porque você é herdeiro da raça dele – respondeu Carpinteiro – teoricamente Tatuzão é seu parente, um tatatatatatatataravô ou algo assim.
– Eu sou o que? – Manoel estava pálido.
– Você, seu pai, seu avô... – disse Carpinteiro despreocupado e focado na estrada como sempre – todos vocês são especiais, seu avô sabia disso, seu pai não e eu era o encarregado de te proteger para que não soubesse também.
– E como você me protegeria? Por que você? Você tem a mesma idade que eu.
– Eu tenho 823 anos de idade. – informou Carpinteiro.
Manoel olhou para Caio, respirou fundo, sentiu ânsia de vômito, olhou ao redor procurando por algo que não sabia o que era, e, por fim, vomitou no chão do banco traseiro.
– Cara, por que você fez isso? – bufou Carpinteiro.
– Você... você... você é um deus? – indagou Manoel.
– Não, sou um humano com habilidades. Sou um saltador, eu posso me teletransportar. – Carpinteiro falava, mas sua insatisfação era visível.
– Posso perguntar por que estamos em um carro se você pode se teletransportar? – Caio entrou na conversa.
Uma gota de chuva no para-brisas assustou Caio e, logo, uma chuva não muito forte começou a cair, nada que o tempo ensolarado da manhã sugerisse. Aquela manhã parecia ter passado há anos. Nesse momento, Carpinteiro acelerou bruscamente.
– Posso lhe fazer a mesma pergunta, Caio. – informou Carpinteiro – Não percebeu que você também se teletransportou sozinho?
Caio ficou em silêncio refletindo.
– Se importa em ir mais devagar? – perguntou exitante Manoel, usando toda educação possível na voz.
Carpinteiro serpenteava entre os carros.
– Acontece, Caio, que eu, como todos os seres humanos, canso. – continuou Carpinteiro – Fiz um esforço tremendo para tirar vocês da fazenda. E, Manoel, está vendo essa chuva? Olhe para trás, veja se está chovendo. – Esperou três segundos – Não está, não é? Essa chuva está nos seguindo. Acontece que todos os deuses brasileiros estão com raiva de vocês. De mim, na verdade, todavia não sabem que fui eu.
– Somos um bode expiatório? – Caio disse saindo de seu transe.
Carpinteiro ficou quieto por longos minutos até quebrar o silêncio.
– Estamos indo até Meridiano, vocês não são bodes expiatórios e tudo se resolverá.
– Você prometeu nos explicar a situação, senhor Carpinteiro. – disse Manoel.
Nesse momento, o único momento, Carpinteiro olhou pelo espelho retrovisor e encontrou o olhar de Manoel. Seus olhos eram de raiva, Manoel começara a duvidar que este era seu protetor.
– Nunca mais me chame de senhor! – Carpinteiro disse pausadamente.
– Tudo bem, tudo bem – respondeu rapidamente Manoel que agora estava pálido e encarava sua frente ansioso para que Carpinteiro olhasse para o caminho.
– Vamos achar Meridiano primeiro. E vocês vão conhecer o Céu.
– Por favor, não! – Manoel desatou a chorar e soluçar, suas mãos tremiam e ele se ajoelhou no carro, expremeu o corpo gordo sobre o câmbio de marchas e parou sobre o ombro de Carpinteiro – Por favor, nao! Não! Não! Não! Não! Por favor! Não faça isso comigo!