O Começo

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Era dia- o sol estava começando a apontar no céu, os raios ultravioleta entrando pelas frestas das cortinas pesadas- quando alguém bateu em minha porta de modo, surpreendentemente, fora do comum, ao invés de dar apenas três batidas leves como todos dão , ele estava quase quebrando a porta com tantas batidas violentas.
-O...O que está acontecendo? Quem necessita de minha atenção tão exasperadamente?
-Desculpe senhor...sou eu... Alexander.Preciso levar a seu conhecimento um assunto de grande relevância para você...digo,senhor.-disse ele se engasgando nas próprias palavras.
-Garanto que este assunto pode esperar até que eu acorde de forma decente, dito isso, até depois Alexander.
-Mas...-falou ele de forma irritantemente insistente-Senhor é muito importante.
-Mas nada. Vou colocar o travesseiro em minha cabeça e espero que entenda isso como um "não quero te ouvir". Agora vá, e isso, é uma ordem- disse com certa arrogância que espero que ele não tenha notado.
-Tudo bem senhor. Volto mais tarde- disse ele de forma aparentemente ofendida. Droga!
Nunca havia falado com ele daquele jeito. Admito sou um pouco, tipo muito, grosso e sem tato com as pessoas, as vezes de propósito claro. Mas nunca foi minha intenção deixar Alexander ofendido. Ele que sempre está ao meu lado desde...desde sempre. Mas tudo bem, mais tarde peço desculpas a ele. Agora o que quero é dormir.

***

Ainda era noite quando minha mãe veio me acordar- Ela é cozinheira da casa dos Graham.Ela trabalha aqui desde os doze anos, quando fora vendida para eles. O tempo a deixou amarga e rígida, acho que tem alguma coisa a ver com meu pai, mas minha mãe não falava muito dele, então, depois de um tempo eu apenas parei de perguntar sobre. Acho que ele...
- ALEXANDER!!- disse ela, ou melhor, gritou como sempre.
- Bom dia mãe...-falei ainda um pouco sonolento.
- Bom dia só se for para você, que pode ficar ai dormindo até tarde- disse de forma inexpressiva- Por acaso você se esqueceu do seu príncipe?
- M...Meu...Meu príncipe?- disse esperando que ela não notasse o claro desespero em minha voz.
- O príncipe Henry. Seu senhor- disse ela de forma ríspida- Viu, dormiu tanto que até ficou desorientado. Agora levante e se prepare para servir seu senhor, pois hoje o dia vai ser longo.
Ao sair do quarto fechou a porta atrás de si e me deixou pensando..."Bom dia pra você também mãe".

***

A caminho do quarto do príncipe peguei algo para comer na cozinha e fiz meu habitual percurso. Todos os dias tinha que, passar pela cozinha dos empregados, passar por um enorme(e desnecessário) salão de festas, pelo salão de conferências; onde o Rei recebia Reis de outros reinos para discutir assuntos de Reis, seja lá o que isso signifique; então entro no corredor dos aposentos dos nobres do reino, e emfim o corredor da família do Rei onde ao final estava o quarto dele, meu senhor, meu príncipe, meu...o que estou dizendo? Ele não é meu. Ele não é nada meu. Apesar de termos crescidos juntos e ele ser o mais próximo que tenho de um amigo, ele é apenas quem eu sirvo. Eu é que sou dele, sou seu servo, seu subordinado...seu...seu nada.
Fui roubado de meus pensamentos melancólicos no meio do meu percurso, por vozes que ecoavam do salão de conferências.
-...Não pode fazer isso com ele-reconheceria aquela voz a um reino de distância, era a rainha Genevieve- Ele é apenas um garoto, jovem demais para tal responsabilidade
- Ah pare de passar a mão na cabeça dele!-disse o rei em um tom claramente irritado- Ele é um homem. Com sua idade eu já comandava o exército de meu pai e trazia honra ao meu reino.
Ele? Poderiam eles estar falando do príncipe? Decido ficar um pouco ali perto da porta como quem não quer nada, fingindo arrumar um vaso em cima da mesa ao lado da porta.
- Mas não estamos falando de uma batalha, de um exército...estamos falando de casamento!- disse a rainha com uma mistura de raiva e angústia que...
Espera. Ela disse CASAMENTO? Como assim casamento? Estão planejando o casamento do príncipe sem ao menos comunicar a ele?
- Não há mais o que discutir Genevieve. O rei George ,juntamente com sua família, estão chegando ao entardecer para que possamos nos reunir e discutir os termos da união- disse o rei tentando acalma-la- Portanto faça todos os preparativos para a chegada do rei e ....
Antes mesmo que o rei completasse suas exigências sai em disparada, andando o mais rápido possível tentando não transparecer meu desespero, até a porta do quarto do príncipe. Não pude me controlar, bati bruscamente em sua porta.

***

Após minha falha tentativa de contar para o príncipe os planos secretos de seus pais, fiz meu caminho de volta à cozinha onde minha mãe e todos os cozinheiros do castelo estavam começando a preparar o banquete para a chegada do rei George. Me sentei em um banco perto dos sacos de batatas e comecei a descascá-las com uma expressão que era uma mistura de tristeza e conformidade; afinal o príncipe não era mesmo muito gentil com as palavras, porém, não é porque sua falta de tato com as pessoas é comum que posso controlar meus sentimentos e não me entristecer com tais atos.
Pensei que ali na cozinha, em meio aos sacos de batatas, não iriam notar minha cara de cão abandonado, mas me esqueci que...minha mãe estava ali.
Ela pode não ser a mãe mais atenciosa do mundo...na verdade ela não me dá atenção alguma, a não ser quando quer gritar comigo, mas ainda assim ela sabe quando há algo de errado comigo.
- Alexander? Algo aconteceu com seu príncipe? Você foi insolente com ele?-perguntou ela com um tom de preocupação; só não sei dizer se ela está preocupada comigo ou com o príncipe.
- Não aconteceu nada com o príncipe. Ele apenas não quer se levantar ainda- falei com um inevitável tom de desprezo.
- Com todo respeito, seu príncipe é um idiota!- disse uma voz graciosamente inconfundível. Era Aurora, uma linda jovem com pele clara como a farinha que grudava em seus cabelos conforme sovava a massa do pão, cabelos esses que eram longos e loiros, quase dourados. Aurora também era cozinheira na casa dos Graham, trabalhava dia e noite na cozinha junto com minha mãe. Aurora fora separada de seus pais ao ser vendida para os Graham à mais ou menos 4 anos.
Ela era muito gentil comigo; ainda me pergunto o porque, eu nunca lhe dava nem metade da atenção que ela me dava. Tudo em que conseguia pensar era em Henry. Em sua pele branca como a neve, que cai sobre os bosques em dezembro, seus olhos azuis como o céu em uma tarde ensolarada, seus cabelos pretos como a noite, e aqueles lábios...aqueles lábios lindamente coloridos com uma mescla suave de rosa e pêssego, que me deixava tão...
-Alexander? Alexander? Você está bem? Esta parecendo enjoado- disse Aurora.
- Eu...Eu estou bem, apenas me perdi em meus pensamentos por um instante- disse tentando controlar o rubor em minhas bochechas.
-É...eu...acho que vou verificar se o príncipe já está disposto a acordar agora.- falei saindo o mais rápido que pude da cozinha antes que minha mãe ou Aurora notassem meu aparente constrangimento .
Fiz novamente meu longo trajeto até o quarto do príncipe e bati, desta vez gentilmente, em sua porta.

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