Elaine acordou cedo e foi para o hospital, foi direto ver o menino, que ainda era mantido na UTI Neo.
— Doutora Elaine, podemos conversar? — indagou o chefe dela, parado na porta.
— Claro, doutor. — disse e colocou o menino de volta ao leito e saiu para falar com o médico que a esperava no corredor.
— Eu sei o que está fazendo e isso vai acabar hoje...
— Mas, doutor...
— Não, doutora, você vai liberar esse menino hoje, antes do meio-dia... — disse e mencionou sair.
— Doutor Marcelo, estou apenas esperando encontrar algum parente dele e vamos tirá-lo daqui, eu juro.
— Antes do meio-dia, doutora Elaine, ou chamo o juizado de menores, conselho tutelar e o que for preciso para que ele saia daqui...
Elaine engoliu em seco, conhecia a rigidez do chefe, pegou o celular e ligou para Lila, que tivera um plantão de 24h, mas ela precisava saber o que estava acontecendo. Ouviu a voz rouca da esposa no outro lado da linha:
— Bom dia, amor. O que houve?
— Chefe quer o nosso filho fora do hospital antes do meio-dia.
— Traz ele pra casa, meu amor, deixa de ser corretinha demais. Eu vou ligar pro Nicolau, ele indica alguém que possa nos ajudar.
— Jura? Eu vou fazer isso então, mas você garante que não vão tirá-lo de nós, né?
— Uhum! — concordou com um gemido, ainda sonolenta.
Feliz da vida, Elaine preparou o menino e ligou para a esposa novamente:
— Amor, estou com o nosso filho, indo pra casa, não sai.
— Estou com o meu irmão, Elaine. Ele disse que não é bom fazer isso, a família pode nos processar, processar o hospital.
Elaine ouviu aquilo como uma punhalada no peito. Marejou os olhos, pois já estava de saída. Não podia voltar para o hospital, ele iria para adoção de qualquer jeito.
— Não vou ficar longe de você, amor. — garantiu abraçando o menino que dormia tranquilo em seu colo. — Não, vou.
Lila ligou para a esposa e não conseguiu falar com ela, estava com o celular desligado e não estava no hospital.
— Ela pediu dispensa do dia, doutora Lila. — informou uma funcionária.
Lila agradeceu e tentou falar com a mulher de novo, sem sucesso. Deixou várias mensagens e resolveu voltar para casa.
— Elaine, o que houve? Estou preocupada. Por favor, aparece. — disse na enésima mensagem que deixava no celular dela.
Elaine apareceu na sala, olhava séria para a mulher, ofegava levemente.
— Amor, onde você esteve o dia inteiro? — indagou apertando os ombros dela. — Eu quase enlouqueci de preocupação, Elaine... — foi ríspida.
— Desculpa. Eu tentei encontrar um lugar para ficar com o Zion, mas não consegui um lugar seguro e viemos pra cá.
— Zion?
— Sim, esse é o nome dele.
Lila respirou fundo, notou que a mulher tinha os olhos vermelhos.
— O meu irmão me indicou uma advogada muito boa, ela vai nos ajudar a adotar o Zion... — enfatizou o nome do garoto e viu um sorriso brotar no rosto da esposa, em meio às lágrimas.
— Jura? — indagou se aproximando dela, que a abraçou com força. — Eu te amo!
— Também te amo! Vamos nos preparar, justiça é lenta.
O que Lila não sabia era que Elaine continuava a procurar a avó de Zion.
No dia de sua folga, em mais uma ida à casa da mãe de Joyce, Elaine encontrou a adolescente desmaiada perto de uma construção.
Joyce acordou numa maca do hospital na ala psiquiátrica, três dias depois. Começou a ter uma crise de abstinência. Uma enfermeira e um médico correram para contê-la.
Depois de acalmada, Joyce dormiu. Elaine não saiu de perto dela. A jovem acordou e olhou em volta.
— Oi, Joyce, como se sente?
— Zonza. Como vim parar aqui de novo?
— Eu encontrei você. Joyce, eu sei que não devo me meter na sua vida, mas você só tem 16 anos, não acha que precisa começar a se cuidar? Eu posso ajudar você se quiser. Notei que usou drogas, você quase morreu...
— Eu só queria morrer mesmo, doutora Elaine.
— Você precisa conversar com a nossa psicóloga, ela vai orientar você... morrer não é a melhor saída.
— Eu não consigo. Vocês deram o meu filho para alguém rico pelo menos?
— Não, o seu filho está comigo, Joyce, não sou rica, mas vou amá-lo e educá-lo do jeito que ele merece.
— Eu estou bem detonada, doutora, não tenho mais jeito. Só queria morrer...
— Para com isso, Joyce, você tem uma vida inteira pela frente. Se quiser eu ajudo você... não posso obrigar você a fazer um tratamento.
— Cuida do meu filho, doutora, eu não sou mais nada, já posso morrer em paz.
— Joyce, me escuta. Se você quiser você pode, sim, dar a volta por cima.
— Eu não consigo.
— Eu ajudo você.
Joyce estava cansada, daquela vida, daquela situação, já passara por várias situações desagradáveis nas ruas em busca de drogas e felicidade artificial.
Elaine viu o estado da menina, se condoeu.
— Ela precisa de ajuda. — comentou com Lila, que a viu com o olhar no vazio, depois de mais uma crise de abstinência.
— Amor, você está muito mãe nos últimos tempos. — brincou e saiu levando a esposa.
Joyce passou um ano numa clínica, contou com a ajuda de Elaine e Lila.
— Estou sentindo que você quer adotar a mãe do Zion também, não é?
— Só assim para ela não voltar para o mundo das drogas. Daqui a pouco ela faz dezoito anos e vai querer viver a vida dela. E depois não ia ser bem uma adoção, só vamos levá-la para passar um tempo conosco.
E de repente as duas viram sua casa que tinha apenas uma cachorra e um gato, cheia. Tinham um filho, e agora Joyce, aceitou morar com elas. A jovem agradeceu muito por tudo o que fizeram por ela e prometeu que não voltaria às drogas ou às loucuras que fazia.
— Vocês foram mais mães minhas que minha mãe. — disse emocionada.
Elaine abraçou Lila de lado observando a jovem brincar com o filho, que chamava as médicas de mamães.
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Seja Mãe
RomanceElaine é cirurgiã pediátrica casada com Lila uma cirurgiã obstetra. Envolvem-se emocionalmente com seus pacientes criando um vínculo de amizade com eles, adotam o filho de uma jovem depende química, conhecem a história de um bombeiro e pai transexua...