4 - Sendo Mãe

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Elaine acordou cedo e foi para o hospital, foi direto ver o menino, que ainda era mantido na UTI Neo.

— Doutora Elaine, podemos conversar? — indagou o chefe dela, parado na porta.

— Claro, doutor. — disse e colocou o menino de volta ao leito e saiu para falar com o médico que a esperava no corredor.

— Eu sei o que está fazendo e isso vai acabar hoje...

— Mas, doutor...

— Não, doutora, você vai liberar esse menino hoje, antes do meio-dia... — disse e mencionou sair.

— Doutor Marcelo, estou apenas esperando encontrar algum parente dele e vamos tirá-lo daqui, eu juro.

— Antes do meio-dia, doutora Elaine, ou chamo o juizado de menores, conselho tutelar e o que for preciso para que ele saia daqui...

Elaine engoliu em seco, conhecia a rigidez do chefe, pegou o celular e ligou para Lila, que tivera um plantão de 24h, mas ela precisava saber o que estava acontecendo. Ouviu a voz rouca da esposa no outro lado da linha:

— Bom dia, amor. O que houve?

— Chefe quer o nosso filho fora do hospital antes do meio-dia.

— Traz ele pra casa, meu amor, deixa de ser corretinha demais. Eu vou ligar pro Nicolau, ele indica alguém que possa nos ajudar.

— Jura? Eu vou fazer isso então, mas você garante que não vão tirá-lo de nós, né?

— Uhum! — concordou com um gemido, ainda sonolenta.

Feliz da vida, Elaine preparou o menino e ligou para a esposa novamente:

— Amor, estou com o nosso filho, indo pra casa, não sai.

— Estou com o meu irmão, Elaine. Ele disse que não é bom fazer isso, a família pode nos processar, processar o hospital.

Elaine ouviu aquilo como uma punhalada no peito. Marejou os olhos, pois já estava de saída. Não podia voltar para o hospital, ele iria para adoção de qualquer jeito.

— Não vou ficar longe de você, amor. — garantiu abraçando o menino que dormia tranquilo em seu colo. — Não, vou.

Lila ligou para a esposa e não conseguiu falar com ela, estava com o celular desligado e não estava no hospital.

— Ela pediu dispensa do dia, doutora Lila. — informou uma funcionária.

Lila agradeceu e tentou falar com a mulher de novo, sem sucesso. Deixou várias mensagens e resolveu voltar para casa.

— Elaine, o que houve? Estou preocupada. Por favor, aparece. — disse na enésima mensagem que deixava no celular dela.

Elaine apareceu na sala, olhava séria para a mulher, ofegava levemente.

— Amor, onde você esteve o dia inteiro? — indagou apertando os ombros dela. — Eu quase enlouqueci de preocupação, Elaine... — foi ríspida.

— Desculpa. Eu tentei encontrar um lugar para ficar com o Zion, mas não consegui um lugar seguro e viemos pra cá.

— Zion?

— Sim, esse é o nome dele.

Lila respirou fundo, notou que a mulher tinha os olhos vermelhos.

— O meu irmão me indicou uma advogada muito boa, ela vai nos ajudar a adotar o Zion... — enfatizou o nome do garoto e viu um sorriso brotar no rosto da esposa, em meio às lágrimas.

— Jura? — indagou se aproximando dela, que a abraçou com força. — Eu te amo!

— Também te amo! Vamos nos preparar, justiça é lenta.

O que Lila não sabia era que Elaine continuava a procurar a avó de Zion.

No dia de sua folga, em mais uma ida à casa da mãe de Joyce, Elaine encontrou a adolescente desmaiada perto de uma construção.

Joyce acordou numa maca do hospital na ala psiquiátrica, três dias depois. Começou a ter uma crise de abstinência. Uma enfermeira e um médico correram para contê-la.

Depois de acalmada, Joyce dormiu. Elaine não saiu de perto dela. A jovem acordou e olhou em volta.

— Oi, Joyce, como se sente?

— Zonza. Como vim parar aqui de novo?

— Eu encontrei você. Joyce, eu sei que não devo me meter na sua vida, mas você só tem 16 anos, não acha que precisa começar a se cuidar? Eu posso ajudar você se quiser. Notei que usou drogas, você quase morreu...

— Eu só queria morrer mesmo, doutora Elaine.

— Você precisa conversar com a nossa psicóloga, ela vai orientar você... morrer não é a melhor saída.

— Eu não consigo. Vocês deram o meu filho para alguém rico pelo menos?

— Não, o seu filho está comigo, Joyce, não sou rica, mas vou amá-lo e educá-lo do jeito que ele merece.

— Eu estou bem detonada, doutora, não tenho mais jeito. Só queria morrer...

— Para com isso, Joyce, você tem uma vida inteira pela frente. Se quiser eu ajudo você... não posso obrigar você a fazer um tratamento.

— Cuida do meu filho, doutora, eu não sou mais nada, já posso morrer em paz.

— Joyce, me escuta. Se você quiser você pode, sim, dar a volta por cima.

— Eu não consigo.

— Eu ajudo você.

Joyce estava cansada, daquela vida, daquela situação, já passara por várias situações desagradáveis nas ruas em busca de drogas e felicidade artificial.

Elaine viu o estado da menina, se condoeu.

— Ela precisa de ajuda. — comentou com Lila, que a viu com o olhar no vazio, depois de mais uma crise de abstinência.

— Amor, você está muito mãe nos últimos tempos. — brincou e saiu levando a esposa.

Joyce passou um ano numa clínica, contou com a ajuda de Elaine e Lila.

— Estou sentindo que você quer adotar a mãe do Zion também, não é?

— Só assim para ela não voltar para o mundo das drogas. Daqui a pouco ela faz dezoito anos e vai querer viver a vida dela. E depois não ia ser bem uma adoção, só vamos levá-la para passar um tempo conosco.

E de repente as duas viram sua casa que tinha apenas uma cachorra e um gato, cheia. Tinham um filho, e agora Joyce, aceitou morar com elas. A jovem agradeceu muito por tudo o que fizeram por ela e prometeu que não voltaria às drogas ou às loucuras que fazia.

— Vocês foram mais mães minhas que minha mãe. — disse emocionada.

Elaine abraçou Lila de lado observando a jovem brincar com o filho, que chamava as médicas de mamães.

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