#66 (II)

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De: lena.jun@mail.com
Para: alex.veiga@mail.com
Assunto: RE: Precisamos conversar

Eu sei que esse não é o melhor momento para conversarmos, porque você está cansado e teve um dia complicado. Mas já pensei demais sobre esse assunto e é muito ruim continuar pensando. Achei que estivesse exagerando e sendo dramática com sempre ou que pudesse ser um mal entendido, mas não. Não é nada disso. É só o choque da realidade, tão potente como quando sem querer levamos um plugin à tomada junto com um dos dedos e só nos damos conta quando a descarga alcança os cotovelos.

Ah, Alex!!!

Sabia que consigo dividir os nossos emails entre antes do nosso encontro que não deu certo e depois dele?

As flores, a mudança nos emails, o filme... Tudo isso faz parte do que quer me dizer, não é? É o que estava dizendo sobre você querer me dizer. Queria pensar que você não está fazendo isso de maneira consciente, que é só um tipo de defesa instintiva por essa situação ser complicada, mas eu não posso me enganar tanto.

A culpa é minha, claro. Talvez toda a minha insegurança fosse só um aviso de que era uma péssima ideia que você me conhecesse, assim como continuar com os emails. Não, eu não estou sendo repetitiva e dando voltas no mesmo lugar, mas o filme me fez voltar a pensar nisso.

Sou uma pessoa melhor do outro lado da tela, você está certo por ter percebido isso. Aquele dia foi uma amostra e eu sei que foi o motivo para que perdesse o interesse por mim. Por um lado, eu acho que até seja melhor que aconteça agora, quando a decepção ainda não é tão grande.

Sei o que vai acontecer: as mensagens vão diminuir até elas se limitarem a datas comemorativas e lembranças de aniversário, mas eu nem sei a data do seu!!!!

Eu sou uma fantasia que pode até ser interessante, mas que engana. Tenho noção do peso imenso que carrego e sei que não é fácil aceitá-lo. Então, posso entender que essa é uma razão para termos um prazo de validade curto. Aceito que estejamos tão perto dele, por isso acho que é muito mais justo que saiba do resto, que vai além de um ex-namorado que não conseguiu aceitar o fim e uma relação abusiva.

Decidi fazer isso por você, Alex.

Queria ter contado logo depois de ler a sua linda história de amor com Lavínia, mas seria um anticlímax tão grande que eu desisti do email sem nem tê-lo escrito. E se quer saber, eu senti uma pontinha de inveja por não ter uma história de amor maravilhosa quanto aquela. Sou uma pessoa má e pior ainda por contar. Eu sei! Ter algo assim sempre foi o meu maior desejo, mas desejos e escolhas são coisas totalmente diferentes.

Alexandre não foi o meu primeiro namorado ruim. Quero dizer, antes dele houve outro que também não me tratava muito bem, mas eu era nova demais para entender. Revivendo outras lembranças, dos relacionamentos que vieram depois, percebi que nunca foi simples e tranquilo. A indiferença, a impaciência e até a manipulação sempre foram acessórios em todos eles.

Sabe quando dizem que as ações de uma pessoa podem ser entendidas depois que você escuta a história delas? É verdade. Tudo isso começou antes mesmo que eu pudesse entender alguma coisa. Antes mesmo de eu existir.

Reginaldo, meu pai, era pelo menos vinte e cinco anos mais velho do que a minha mãe. Ele era casado e tinha uma família, mas supostamente se apaixonou pela aluna brilhante do curso de zootecnia. Foi algo magnético e rápido. Eles estavam pensando em dar um tempo, porque Reginaldo não ia acabar com o casamento dele, mas Lis engravidou. Eu nunca cheguei a conhecê-lo, porque ele sofreu um infarto fulminante, semanas antes de eu nascer e esse é um fato muito relevante que faz essa história ter sentido. Porque Lis, minha mãe, ficou sozinha para lidar com tudo.

Com Amor, Lena [Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora