Com o passar do tempo, resolvi ficar mais na minha e dentro da minha casa. Não sei explicar muito bem todos os motivos, mas sei que precisava somente de mim para ir em frente. Espero que ninguém tenha sentindo o que eu senti. Nenhum menino me olhava na sala de aula, nem mesmo os gordinhos como eu. Sentia-me o patinho feio. Além de não conseguir fazer Educação Física no colégio, pois o peso não me dava fôlego para nada. Sempre inventava uma desculpa. Nos dias de piscina eram os piores, eu tinha que vestir o maiô, e depois, ouvir risadas pelos cantos. Não eram só os meninos, as meninas riam de longe. Lembro-me quando dançava e fazia Jazz, não me apresentei na festa de fim de ano. A costureira foi tirar a medida para fazer as nossas roupas, quando chegou na minha vez, as meninas riam bem alto, fazendo com que eu me sentisse mal. Desisti em cima da hora, meus pais quase me mataram.
Aos poucos, comecei a me afastar de Carla e Carolina. Os dias foram passando, e eu, mais quieta. Toda vez que elas me chamavam pela minha varanda, eu inventava uma desculpa. Algumas vezes eu cedi, mas sempre era uma piadinha de mal gosto por causa das minhas gorduras. Isso me deixa mais neurótica do que já era.
Na verdade, eu sempre fui muito preguiçosa. Ao invés de praticar um esporte, eu fazia simpatia. E comida pão doce, pensando em alface. Acho que todos largaram de mão, a pobre menina gorda que só pensava em dançar Thalia em frente à TV.
Mesmo com todos os pensamentos obesos, eu ainda pensava naquele menino, que via todos os dias pela manhã. Eu ainda pensava em Leandro, e se com ele, poderia acontecer o meu primeiro beijo. Eu acho que não sabia beijar. Aliás, eu realmente não sabia beijar.
- Priscila, por que você quer tanto emagrecer?
Verônica me pegou lendo revistas de dieta na sala de aula.
- Que pergunta! Olhe pra mim, eu tenho espelho em casa!
Ela era gordinha, e era feliz com o seu corpo. Verônica era o tipo de menina, que gostava de desenho japonês, adorava músicas em inglês, sentava em frente à mesa do professor e era a típica CDF. Ela não se importava com os garotos. Pelo menos, não naquele momento.
- Estou gostando de um menino. Como ele vai me querer gorda? – Resmunguei em voz baixa.
Ela tirou a revista da minha mão, e com isso, chamou a atenção de Jaqueline. Uma menina alta, magra, bonita e que já namorava. Eu me sentia uma E.T por não namorar ainda. As minhas amigas de infância já estavam namorando. Todas elas, menos eu. Na minha cabeça, a gordura não me deixava bonita. A gordura não deixava, que os meninos prestassem atenção em mim, para ser mais específica, ela não deixava Leandro me enxergar.
Jaqueline começou a me fazer perguntas. Nós éramos próximas no colégio, mas não éramos amigas. Fiquei com vergonha, quando percebi que ela ouviu a nossa conversa. Pensei "pronto, mais uma para me humilhar", mas me surpreendi. Ela sorriu e apenas disse "posso te ajudar se quiser".
Fiquei feliz, confesso. Pela primeira vez, eu não era obrigada a emagrecer. Não sentia a pressão dos meus pais, mas sim, a pressão em mim mesma. Estava na hora de me amar e de mostrar ao mundo, que eu era bonita. Estava na hora de chamar a atenção de Leandro, José, Firmino, Mateus... Estava na hora da menina se mostrar forte.
Saí do colégio pensando sobre isso tudo. As aulas já estavam terminando, e eu ainda, tinha poucas amigas. Com o passar dos dias Carol e Carolina ficaram mais ausentes. Minha mãe conheceu algumas vizinhas, e essas vizinhas, tinham filhas. Fiquei bem próxima de Raquel. Ela sabia sobre Leandro também.
Naquele mesmo dia, quando eu voltava para casa, andando pela minha rua, fiquei fascinada por uma varanda com muitas flores. Parecia um jardim dentro de um apartamento. Ao lado da varanda, havia uma janela. Quando olhei bem, vi que Leandro estava ali. Sem camisa e com as espinhas do seu rosto. Não sei como consegui enxergar as espinhas, pois era míope, e mal enxergava de longe. Mas posso dizer que enxerguei.
Ele estava todo lindo, em sua janela, do quarto andar.
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O quarto andar
Teen FictionPriscila é uma adolescente de quinze anos, insatisfeita com o seu corpo, e achando que nenhum garoto poderia se aproximar dela, ela se apaixona por Leandro. Um rapaz da mesma idade, que por coincidência do destino, nasceu no mesmo dia e ano que ela...