Cap 4 wells

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Durante a noite, não havia como saber que horas eram, então Wells tinha que adivinhar quando estava na hora de mudar de turno. Pela dor que sentia nas juntas, fazia pelo menos quatro horas que estava na patrulha. Mas, quando foi buscar Eric, encontrou o arcadiano encolhido junto a Felix com um olhar tão tranquilo no rosto que não conseguia suportar a ideia de perturbá-los. Com um suspiro silencioso, Wells alongou os braços sobre a cabeça e mudou a lança de uma das mãos para a outra. A arma era uma piada. A flecha que tinha matado Asher havia sido disparada com precisão mortal. Se os Terráqueos voltassem e mirassem em Wells, ele não teria nenhuma chance. — Wells? — gritou uma menina. Ele se virou, piscando na escuridão: — Priya? É você? — Não... — Havia uma ponta de mágoa na voz da menina. — Sou eu. Kendall. — Desculpe — falou Wells. — O que houve? Está tudo bem? — Oh, sim, está tudo ótimo! — disse ela, repentinamente animada. Muito animada para o meio da madrugada. Por sorte estava escuro demais para ela ver Wells contrair o rosto. — Só achei que você gostaria de um pouco de companhia. A última coisa que Wells queria nesse momento era ficar de conversa fiada. — Estou bem. Já vou trocar de lugar com Eric — mentiu ele. Mesmo sem ver o rosto de Kendall, podia sentir a decepção emanando dela. — Agora volte para a cama antes que alguém roube o seu lugar. Com um suspiro praticamente inaudível, Kendall se virou e voltou para a cabana. Quando ouviu a porta fechar depois de ela entrar, Wells voltou sua concentração à linha de árvores. Ele estava tão cansado que teve que usar toda a força para impedir que suas pálpebras cada vez mais pesadas caíssem. Algum tempo mais tarde — poderiam ter sido minutos, poderia ter sido mais uma hora —, um vulto emergiu das sombras. Wells piscou, esperando que desaparecesse, mas ele só ficava maior. Wells ficou alerta, ergueu a lança e

abriu a boca para gritar uma advertência — mas então a forma entrou em foco, e as palavras morreram em seus lábios. Bellamy. Ele estava virando na sua direção, um vulto desfalecido em seus braços trêmulos. Por um breve momento, Wells pensou que era Octavia — mas, mesmo no escuro, não havia como confundir o cabelo desgrenhado, louroavermelhado. Ele a reconheceria em qualquer lugar. Wells saiu em disparada e os alcançou exatamente quando Bellamy caiu sobre seus joelhos. Seu rosto estava vermelho brilhante e sua respiração vinha em arfadas entrecortadas, mas ele segurou Clarke tempo suficiente para passála aos braços esticados de Wells. — Ela... ela... — disse Bellamy, pressionando a mão contra a grama para se equilibrar, enquanto se esforçava para falar. — Ela foi mordida. Por uma cobra. Isso foi tudo que Wells precisou escutar. Segurando Clarke com força contra seu peito, seguiu até a cabana da enfermaria. O espaço minúsculo estava lotado de pessoas que dormiam — meia dúzia estava encolhida nos cobertores e nas camas restantes. — Saiam — berrou Wells, sem se importar com os murmúrios indignados e os protestos sonolentos. — Agora. — O que aconteceu? Eles voltaram? — São os Terráqueos? — lamuriou-se alguém. — Essa é a Clarke? Ela está bem? Wells ignorou todos e colocou Clarke sobre uma das camas agora vazias, respirando fundo quando sua cabeça caiu para o lado. — Clarke — falou ele, colocando a mão em seu cotovelo e a sacudindo delicadamente. — Clarke! Ele ajoelhou e aproximou seu rosto do dela. Clarke estava respirando, mas com muita dificuldade. Bellamy entrou correndo. — Tire todo mundo daqui — ordenou Wells, apontando para as crianças restantes que ainda estavam cambaleando pela cabana, olhando para Clarke confusas e sonolentas. Bellamy os reuniu na direção da porta. — Todos para fora — disse ele, a voz rouca por causa da exaustão. Quando os últimos tinham sido removidos sem nenhuma cerimônia, ele se aproximou de Wells, que estava procurando de forma descontrolada os suprimentos médicos. — O que posso fazer? — perguntou Bellamy. — Apenas fique de olho nela. Wells jogou ataduras e frascos por cima do ombro, rezando para terem soro antiofídico, rezando para conseguir reconhecê-lo. Ele se amaldiçoou por não estudar mais nas aulas de biologia. Ele se amaldiçoou por não prestar mais

atenção a Clarke quando falava casualmente sobre seu treinamento médico. Estava ocupado demais admirando a forma como seus olhos se iluminavam quando falava sobre seu estágio. E agora existia uma chance de aqueles olhos ficarem fechados para sempre. — É melhor você se apressar. A voz de Bellamy veio do leito. Wells se virou para vê-lo agachado ao lado de Clarke, tirando o cabelo de seu rosto pálido. A visão momentaneamente reacendeu a ira que ele tinha sentido quando vira Bellamy beijar Clarke na floresta. — Não toque nela. — Ele se encolheu com o tom agudo da própria voz. — Apenas... lhe dê um pouco de espaço para respirar. Bellamy olhou para os olhos de Wells: — Ela não vai respirar por muito mais tempo a não ser que encontremos uma forma de ajudá-la. Wells se virou novamente para o baú de medicamentos, determinado a manter a calma. Quando seus olhos pousaram sobre um frasco laranja brilhante, o alívio quase o derrubou no chão. Há alguns anos, um grupo de cientistas tinha dado uma palestra sobre sua pesquisa no Salão do Éden. Eles estavam desenvolvendo um Antídoto Universal, um medicamento que daria às pessoas uma chance de sobreviver quando finalmente voltassem à Terra. Não apenas os humanos tinham perdido muitas de suas imunidades naturais, mas também era possível que muitas plantas e animais tivessem sofrido mutações, tornando os velhos remédios inúteis. A palestra parecia ter sido em outra vida, antes de Wells conhecer Clarke, antes de o ViceChanceler forçar seus pais a estudarem os efeitos da radiação em cobaias humanas. Wells só tinha ido porque aquilo era sua responsabilidade como filho do Chanceler. Jamais imaginara que algum dia botaria os pés na Terra, muito menos que precisaria usar tal antídoto para salvar a garota que amava. Wells rangeu os dentes enquanto acoplava a seringa ao frasco e a posicionava sobre uma veia azul no braço de Clarke. Ele ficou imóvel enquanto seu coração batia forte numa advertência. E se ele estivesse errado em relação ao medicamento? E se ele errasse e injetasse uma bolha de ar fatal em seu sangue? — Dê-me isso — exclamou Bellamy. — Eu faço. — Não — falou Wells com firmeza. Embora odiasse admitir, a ideia de Bellamy salvar Clarke era demais para ele suportar. Em primeiro lugar, era culpa sua ela ter sido enviada à Terra, mas não seria culpa sua se ela morresse. Com um único movimento, ele enfiou a seringa na pele de Clarke e pressionou o êmbolo, observando o antídoto se esvaziar em seu corpo.

dia 21Where stories live. Discover now