5. I have lost touch with what makes me human, I have lost touch with reality.

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Assim que entrei, tentei fazer o mínimo de barulho possível para ouvir tudo o que podia da conversa. As vozes saiam abafadas e não conseguia decifrar o que os dois diziam, mas meu lado jornalista me impedia de dar mais algum passo. Uma frase soava em minha mente: isso era errado. Resolvi ir até a cozinha fazer um chá e seguir para meu quarto, já que eu conseguiria ouvir melhor pela janela de lá e ainda não corria o risco de alguém abrir a porta e se deparar com a cena de uma Adele tentando ouvir tudo o que acontecia.

Enquanto fazia o chá, nem me atentei ao sabor. Só quando já estava sentada confortavelmente na janela do quarto e tomei o primeiro gole percebi que se tratava de um chá de canela e, antes que pudesse me controlar, memórias que eu tanto tentava esconder invadiram minha mente. A última vez que tomei fora para encerrar algo que acontecia dentro de mim, anos atrás. Se naquela época eu ficasse grávida seria meu fim, eu já tinha problemas com álcool e drogas, além de um namorado que destruía o restinho de dignidade que eu tinha. Aquele escroto só me fazia mal, mas em minha mente era tudo culpa minha, quando saíamos eu sempre o via beijando outras garotas e no fim da noite ele falava que eu estava inventando tudo para que acabássemos brigando e fazer com que ele se sentisse mal. E quem se sentia mal no final era eu. Todas os dias ele me fazia chorar, sendo por ele nem tentar esconder que ficava com outras garotas estando comigo, ou por falar que eu "me vestia como uma prostituta" para chamar a atenção de outros caras quando saíamos. Todas as vezes em que íamos juntos para alguma festa era a mesma discussão sobre o jeito que me vestia, principalmente se algum cara olhasse em minha direção e em todas as vezes ele usava o discurso de que eu pedia por isso e fazia propositalmente para que ele se sentisse um inútil (não que ele não fosse).

Mas quando eu descobri estar grávida, isso foi o pior. Eu me senti um lixo quando ele começou a descontar sua raiva em mim. Joguei as imagens desses dias no fundo de minha mente, mas o sabor da canela e o liquido quente em minha garganta traziam tudo à tona novamente. Depois de uma das festas em que íamos, eu já estava alta o suficiente para não ter noção do que acontecia ao meu redor e eu não me importava com isso, Dalton, até então o amor da minha vida, sempre estaria ali para me proteger. Eu estava sentada em uma poltrona da sala da casa de um amigo do meu namorado quando um homem veio em minha direção, eu nunca o vira em outras festas, mas eles tinham tantos amigos que era indiferente para mim naquele momento, eu ria de alguma piada sem graça que nossos amigos contavam e ele elogiou meu sorriso. Ele então puxou papo, apenas socializando e eu, em meu estado, já sentia que éramos amigos de anos. Dalton nos viu e seu rosto mudou, seus olhos azuis que antes me traziam paz agora estavam escuros e consumidos pelo ódio, ele correu em minha direção e começou a gritar coisas sem nexo, como se eu estivesse transando com aquele cara na sua frente. Sua mão apertava meu fino braço com toda a força que existia em seu ser e eu já sabia que no dia seguinte acordaria com um roxo enorme onde me tocava. Ele me puxava, praticamente me arrastando para fora do local e seguindo em direção ao seu carro.

Eu gritava respostas, mas ele simplesmente me ignorava, o que me deixava com mais raiva ainda, eu estava com tanto medo que em certo momento parei de gritar e apenas chorei, aceitando o que estava por vir. Fui praticamente jogada no lado do passageiro e chorava desesperadamente enquanto ele entrava no carro e seguia em direção a sua casa cheio de raiva. No caminho ele me bateu várias vezes e eu não tinha mais forças para me esquivar ou implorar para que ele parasse, eu sabia que isso só pioraria as coisas no final.

Quando chegamos em sua casa, fomos para seu quarto em silêncio e eu já estava praticamente sóbria de novo. Sentei em sua cama e comecei a chorar novamente enquanto ele me fitava, ainda sem dizer uma palavra.

"Você me da nojo."

Ele começou a repetir várias vezes essa mesma frase e eu tentava explicar o que de fato acontecera na festa, mas ele me mandava calar a boca, minha voz o irritava. Nada do que eu dizia fazia sentido em sua mente e ele só falava coisas que me destruíam cada vez mais. Ele então disse que nós dois precisávamos nos acalmar e fui buscar alguma bebida forte na cozinha, enquanto isso eu respirava fundo tentando me acalmar e pensando que tudo o que ele fizera, era por me amar demais.

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