Capítulo 1

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A morte sempre tem uma explicação

Ela estava em seu quarto, falando com um sorriso largo ao telefone, simplesmente não percebeu o tempo passar.—Bianca Madison! Você vai se atrasar para a aula, termine de se arrumar e desça desse quarto! —gritou Suzie, mãe de Bianca, já estava estressada de tanto esperar a garota.
—Já estou descendo mãe. —A menina disse já descendo as escadas, percebendo que perdeu a hora.
—Há, ótimo, você quer que eu vá lhe deixar na escola hoje?
Bianca foi cuidadosa com as palavras ao responder: — Não precisa, pegarei uma carona com Peny.
—Penélope Anderson, a desmiolada? —Explodiu Suzie.
—Mãe, Peny não é desmiolada, vocês que não entendem ela. —Bianca nem se quer acreditava nas próprias palavras, ela gargalhava por dentro.
—Por favor, Bianca, aquela garota é simplesmente maluca. —Bom... Bianca sabia disso, mas era por isso que gostava de Peny, por ela ser diferente, por ela não ser monótona e igual a todo mundo, ela tinha seu jeito próprio, e era isso que a tornava uma garota única, e Bia já não aguentava mais a mesmice de todos os dias.
—Ela não é maluca mãe, talvez só um pouquinho, mas isso faz ela ser tão legal. —O som de uma buzina é ouvido em frente à casa de Bianca. —É a Peny, tchau mãe, te amo. —Despediu—se Bianca.
—Tchau filha, também amo você, cuide—se. —Suzie deu um beijo na testa da filha, esta saiu pela porta e entrou no carro.
—Por que demorou tanto? —Peny realmente era uma garota um tanto "diferente", tinha cabelos longos com mechas de várias cores bem vivas, usava um batom azul que combinava com algumas de suas madeixas e suas roupas se baseavam numa blusa branca, uma saia rodada azul ciano e uma sapatilha também branca, com uma meia que quase chegava aos seus joelhos.
—Foi mal, minha mãe ficou enrolando com conselhos sobre a vida e outras coisas idiotas. —Bianca sempre tentava parecer o mais legal possível na frente de Peny.
—Tudo bem, vamos para a aula? —Peny estava com um sorriso cínico nos lábios.
—Até parece, aonde vamos hoje? —Perguntou Bianca.
—Hum... Não sei, que tal o píer?
—Por favor, me diz que não está falando sério? —Bianca perguntou fazendo cara de tédio.
—Claro que não, que tal o parque de diversões? Estão dizendo que hoje é a inauguração de um novo brinquedo que é animal. Além disso, ouvi dizer que o Ben vai estar lá. —Peny olhou de lado para Bianca.
—Não acredito. Benjamim, o garoto simplesmente mais lindo de todo o Brasil? —Bianca fingiu um pequeno desmaio clássico com a costa da mão na testa.
—Sim, esse mesmo. —Disse Peny em meio a um sorriso.
—Penélope, a gente tem que ir para lá agora mesmo. —Bianca estava com os olhos arregalados fingindo estar paranoica.
—Eca! Não me chama com esse nome ridículo, eu fico parecendo uma idiota. —Peny fazia cara de nojo.
—Mas você é uma idiota. —Disse Bianca em meio a gargalhadas.
—Sou mesmo, talvez, só um pouquinho. Mas, agora é sério, nunca mais me chame assim, deu até arrepios. —Disse Peny fingindo calafrios.
—Tudo bem, agora pisa fundo idiota. —E assim Peny o fez.
As meninas chegaram no parque e logo deram de cara com Ben, ele estava com alguns amigos, todos possuíam um perfil musculoso
—Olá meninas, o que fazem aqui, não deviam estar estudando? —Ele estava com uma sobrancelha erguida.
—E você também não devia? —Peny retrucou.
—Sim, mas meus amigos e eu resolvemos dar uma passada no parque para estrear o brinquedo novo, dizem que é animal. —Ben não desviava os olhos de Bia, e isso a deixava meio sem ação e levemente corada, enquanto ela olhava fixamente para seus sapatos.
—Bom, então vamos logo, antes que a fila fique maior. —Peny saiu agarrada aos outros meninos, deixando apenas Ben e Bia perto da roda gigante, ela fez de propósito.
—Oi... Bianca, certo? —Ele perguntou se aproximando de Bia.
—Sim, mas pode me chamar de Bia. —Respondeu ela erguendo os olhos.
—Bom... Eu te chamaria para sair mais já estamos no parque de diversões mesmo então... Quer ir... Sei lá, na roda gigante comigo? —Convidou ele.
—Claro! Eu adoraria. —Respondeu Bia com um sorriso tímido. Eles foram à roda gigante, depois no chapéu mexicano, depois na montanha russa e em vários outros brinquedos. Quando saíram do parque de diversões já era quase noite e Bia lembrou que tinha que voltar para casa ou sua mãe iria ter um ataque de cólera, então ela chamou Peny e as duas entraram no carro e seguiram para a casa de Bia, Peny foi o trajeto inteiro falando sobre os amigos de Ben, enquanto isso Bianca apenas relembrava a sensação de estar com o mesmo, de ele tê-la chamado para sair e de ele não ter parado de olhar para ela durante todo o passeio. Ao chegarem à frente da casa de Bia, as garotas percebem que não tem ninguém em casa.
De repente o celular de Bia toca e ela atende rapidamente, pois era o número de sua mãe, porém a voz que falava do outro lado da linha era estranha.
—Alô. —Atendeu Bianca.
—Alô, quem fala é Bianca Madison? —Perguntou uma voz masculina diferente.
—Sim, quem está falando? —Perguntou Bia desconfiada.
—Aqui quem fala é o Dr. Carter, a senhorita poderia vir ao hospital agora mesmo, por favor? —Perguntou o doutor misteriosamente.
—Por quê? Minha mãe está bem? O que houve com ela? —Bia estava começando a se desesperar.
—Senhorita se acalme, explicaremos tudo quando você chegar aqui, agora se apresse, por favor. —Disse o homem tentando acalmar Bianca, mas aquele suspense só estava a deixando mais desesperada.
—Tudo bem, estarei aí em breve. —Foi a última coisa que Bianca disse ao homem antes de desligar e pedir desesperadamente a Peny que dirigisse até o hospital, que começou a fazê-lo enquanto perguntava o que tinha acontecido.
—Aconteceu alguma coisa com a minha mãe. —Foi tudo o que Bia conseguiu dizer, e Peny entendeu o recado, ela acelerou o carro mais ainda.
Peny procurava uma vaga no pátio do hospital para estacionar o carro, mas estava demorando, não havia uma vaga e isso só deixava Bia mais impaciente.
—Peny, eu vou entrar e ver como minha mãe está, enquanto isso você procura uma vaga para estacionar. —Disse Bia impaciente.
—Tudo bem, encontro você logo logo. —Disse Peny, assim Bia entrou no hospital deixando Peny a procura de uma vaga.
—Suzana Madison, onde ela está? —Perguntou Bia de forma histérica para a enfermeira, que estava atrás do balcão de recepção.
—Deixe—me ver... —Ela mexeu um pouco no computador. —Aqui diz que ela está na UTI (Unidade de Tratamento Intensivo). Fica no segundo andar, basta subir as escadas e entrar na primeira porta a direita. —Explicou a enfermeira.
—Muito obrigada. —Ao dizer isso, Bia correu até as escadas e subiu para o segundo andar, onde entrou na primeira porta que viu a sua direita, encontrando sua mãe deitada numa maca com pelo menos três curativos no rosto e na cabeça. —Mãe, graças a Deus, o que houve? —Bia pegou uma cadeira e sentou ao lado da maca, segurando a mão de sua mãe.
—Mãe o que aconteceu? —Perguntava Bia descontrolada, porém sua mãe não falava nada, estava com os olhos fechados, parecia estar dormindo. De repente um homem em um jaleco branco entrou pela porta.
—Olá Srta. Madison, eu sou o Dr. Carter, posso conversar com você lá fora por um minuto? —Ele tinha um ar misterioso.
—Eu não posso deixar minha mãe aqui. —Bia franze o cenho.
—Não se preocupe, será apenas um minuto.
—O—ok, tudo bem. —Eles saíram da sala e andaram um pouco pelo corredor, até que o homem de branco parou bruscamente e se virou para Bia.
—Srta. Madison, eu não deveria dizer isso para uma criança tão jovem como você, mas pelo que descobri é apenas vocês duas contra o mundo, certo? —Ele não esperou que ela respondesse. —Bom... Bianca... Sua mãe sofreu um acidente de carro enquanto procurava por você. —A cabeça de Bianca começou a pesar. —Segundo o diretor de sua escola, você não compareceu a aula pela quinta vez seguida sem dar notícias. —Abaixava cada vez mais. —Então ele ligou para sua mãe para saber se você estava doente ou algo do tipo, porém sua mãe disse que não estava entendendo, pois você havia saído de casa todos os dias dizendo que iria para escola. —Bia finalmente baixou a cabeça por completo, sem dizer nada. —Então ela foi até a sua escola para esclarecer este problema. —Bianca começou a encolher os ombros. —Porém você realmente não estava na escola. —Continuou o Dr. Carter. —Então sua mãe resolveu sair para procura-la​ pela cidade, ao fazer uma travessia por uma rua aparentemente deserta, foi atingida em cheio por um carro cujo motorista se encontrava alcoolizado, constatamos isso após encontrar várias garrafas de vodca em seu porta—malas. —Bianca olhava fixamente para os seus sapatos totalmente calada tentando digerir toda aquela informação.
—E o que aconteceu com ela? —Perguntou cabisbaixa.
—Ela entrou em coma e, antes que você pergunte, o motorista que a atropelou morreu quase que instantaneamente. —Respondeu o doutor. Bianca se encontrava em estado de choque, suas mãos tremiam, as lágrimas já molhavam o seu rosto, "foi minha culpa", pensava Bia, "ela saiu atrás de mim, é por minha causa que ela está em coma, se eu não tivesse matado aula, ela com certeza estaria bem agora". Bia virou de costas e correu em direção ao quarto de sua mãe. Ela sentou ao seu lado e novamente segurou sua mão.
—Mamãe, me perdoe, foi tudo culpa minha, eu sinto muito, me perdoe. —A cada palavra seu coração sentia mais culpa, mais remorso. —Se eu não tivesse sido tão idiota, você estaria bem, me desculpe. —A garota chorava freneticamente com a cabeça encostada a barriga de sua mãe.
—B—Bianca? —Suzana pronunciou o nome da garota fracamente, porém seus olhos continuavam fechados, sua voz era quase um sussurro. Os olhos de Bia se iluminaram. —Você precisa tomar cuidado. —As palavras saiam pausadamente da boca da mulher. —O orfanato, você tem que tomar muito cuidado. —Bia não entendia o que sua mãe queria dizer, suas palavras não faziam sentido. —Bianca tenha cuida... Cuidado, tenha cuidado com os habitantes, o orfanato, tenh...
—De repente um som agudo vindo dos aparelhos alertou os enfermeiros, em poucos segundos apareceram pelo menos cinco pessoas vestidas de branco e tiraram Bianca da sala fechando a porta atrás dela.
Meia hora depois, Bia se encontrava sentada em um banco de espera com Peny ao seu lado, ela pensava intensamente no que sua mãe havia lhe dito quando, de repente, o Dr. Carter saiu da sala de sua mãe e foi em direção a ela.
—Como ela está? O que aconteceu? Ela vai ficar bem? —Bianca estava de olhos arregalados para o doutor.
— Srta. Madison. —Ele estava com a voz baixa e tristonha. —E—eu sinto muito, nós tentamos de tudo, mas... Ela não resistiu. —Finalizou o doutor. Bia sentiu o mundo desabar, o chão desapareceu debaixo de seus pés, ela caiu nos braços da amiga em lágrimas, se culpando mais ainda, sentia que era culpa sua a morte de sua mãe, se ela simplesmente tivesse ido para a escola como havia dito que faria, talvez Suzie estivesse viva agora, talvez nada disso tivesse acontecido, mas agora já havia acontecido e não tinha nada que ela pudesse fazer.
—Eu sinto muito pela sua perda Srta. Madison. —O doutor apresentou seus sentimentos enquanto Peny fazia o mesmo. —A senhorita tem algum parente com quem possa ficar? —Perguntou o Dr. Carter assim que Bia se acalmou.
—Não, era apenas eu e minha mãe, meu pai se divorciou dela quando ela engravidou de mim, e depois ela veio morar no Amazonas, pelo que sei ele está morto, eu não tenho mais ninguém, estou sozinha agora. —Lamentava—se Bianca com os olhos marejados.
—Bia, você pode ir morar comigo, tenho certeza de que minha mãe não se importaria. —Peny interveio. —Ela pode até conseguir a sua guarda. —Continuou.
—Sim, ela realmente pode. —Interrompeu o doutor. —Porém isso leva meses, e enquanto isso a Bianca será enviada para um lar até que sua mãe a adote, se ela conseguir isso. Eu sinto muito dizer isso, mas, é assim que funciona. —Explicou o Dr. Carter.
—Como assim "se" ela conseguir? —Peny ergueu uma sobrancelha.
—Bem... Podem existir outras pessoas a procura de uma filha para adotar, bom... Digamos que sua mãe pode ter concorrência. —O Dr. Carter tentava inutilmente amenizar as más notícias. Peny olhou para Bia preocupada enquanto a mesma mantinha—se cabisbaixa.
Assim que a assistente social chegou, a pedido do Dr. Carter, Bia foi enviada com ela a uma sala particular onde as duas pudessem ficassem a sós para que pudessem conversar.
—Então Bianca, você não tem mais ninguém com quem possa ficar? —Perguntou a mulher calmamente.
—Não, eu só tinha a minha mãe. —Respondeu a garota secamente.
—E seu pai? Parentes próximos...? —Pressionava a mulher.
—Meu pai morreu quando minha mãe estava grávida de mim, e quanto a meus parentes, se não estão mortos, provavelmente se encontram do outro lado do mundo agora. —Explicou Bianca.
—Hum... Entendo, bom... Sendo assim você será encaminhada a um abrigo e de lá decidirão para que orfanato você vai, enquanto isso mandarei alguém para ir na sua casa e pegar suas coisas. —Apesar da situação, Bia corou só de imaginar uma pessoa vendo e revirando suas roupas tanto casuais como íntimas.
—Hum... Não por favor, e—eu gostaria de pegar as minhas roupas pessoalmente. —Bia estava meio sem jeito, não sabia como explicar aquilo, porém em sua frente estava uma assistente social que a compreendeu perfeitamente.
—Há sim, claro, eu entendo Bianca. —Ela sorriu compreensiva. —Porém quem vai leva-la para o abrigo sou eu e não posso chegar tarde em casa, então você irá pegar apenas o necessário depois, o que restar, outra pessoa irá buscar, certo? —Indagou a mulher sorridente.
—Certo. —Bia concordou satisfeita, apesar de ter achado um pouco estranho o motivo pelo qual ela não queria que Bia pegasse suas coisas, afinal ainda era cedo, a noite acabara de cair.

O Orfanato da TormentaOnde histórias criam vida. Descubra agora