Capítulo 6

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Sexta-Feira, 17 de agosto de 2007.

Sentando na calçada do prédio marrom, fumando seu último cigarro, Heath esperava Jake terminar de se arrumar para irem a um novo restaurante tailandês. Jake ensaiava no espelho como iria falar aquilo que segurava há semanas: ele ainda não tinha terminado com Rachel e teria que ir com ela a uma premiação no dia seguinte.

― O que aconteceu com junho? ― Heath falava compassadamente, com raiva, a fumaça saía de sua boca e narinas.

­― Eu não pude! ― disse passando a mão nos cabelos pretos. ― Minha equipe disse que sou mais relevante com ela, e você sabe o quanto quero aquele maldito papel no filme sobre o pedófilo, e ela já transou com o diretor.

― Olha aqui, nós combinamos que você se livraria desse maldito relacionamento de bosta até junho! ― ele se levantou. ― NÓS ESTAMOS EM AGOSTO!

― Nem é um relacionamento de verdade! A gente nem transa! Apenas uma maldita modelo fútil com um maldito ator veado! ― o rosto angelical agora tinha um rubor demoníaco e a expressão aprofundada pela luz do poste da esquina.

― Olha, isso é a porra de uma situação bem frustrante! ― Heath aproximou seu rosto do rosto de Jake. ― Eu só quero que você termine esse caralho.

― Terminar e ficar sem a porra do filme, no seu apartamento, comendo batata frita e assistindo o noticiário como se eu não fosse a porra de um ator? ― As mãos espalmadas. ― Essa é a sua ideia? Um galã sem a merda de um affair, engordando como um suburbano? Você tem alguma outra ideia?

Eu tinha... ― a voz incisiva. ― A gente podia ter mudado alguma coisa, mandando alguma mensagem a jovens como nós, revolucionado essa mídia babaca com esses relacionamentos vazios. Uma foda por um papel, uma chupeta por uma indicação, uma punheta por uma participação, uma apalpada por 5 minutos a mais na tela, e a gente podia ter vencido isso tudo, mas você não quis, Jake. Você não quis! ― o tom era amargo e ressentido. ― E agora eu nem assisto mais filmes. Sabe por que, Jake? Porque o maior show de atuação eu vejo na minha própria vida, e você é o ator principal! ― ele bateu palmas descontroladas. ― Toma aqui o seu maldito Oscar! ― ele se virou e começou a andar. ― Esse é o maldito crédito final dessa história de merda. ― Heath disse sem se virar, e Jake ficara sem palavras, olhando ele sumir nas ruas escuras.

Os olhos castanhos com lágrimas pesadas e todas aquelas frases ditas, agora impossível de se voltar atrás, e todas as coisas não ditas e agora impossíveis de serem ditas ―sentimentos, planos, medos e anseios― se misturavam em uma enorme nuvem densa entre eles. Heath, no final, terminava sozinho, perdendo o único que conhecia e que o conhecia. Perdido entre o que era, o que queria e o que não queria ser. As lágrimas desceram como em um turbilhão, as pernas enfraqueceram, se segurando no poste, vendo seu reflexo numa vitrine, alguém que ele daria alguns trocados na rua.

A chuva forte que caia soprava no para-brisa do Toyota prateado que rugia rumo ao norte de São Francisco. Nas sombras da noite, as estrelas, antes suas confidentes, agora zombavam de Jake, que queria apenas um abraço, um "tudo vai ficar bem" e fugir daquilo tudo. Can't Help Falling in Love tocava no som e ele chorava. Heath não tinha visto nada como ele e nada vem fácil e tudo vem de uma única vez. Não havia dúvidas do lugar que Heath pertencia em sua vida, mas agora parecia bem, bem tarde, e, por impulso, ele tirou o CD do som e jogou na estrada, sentindo os respingos gelados da chuva misturando-se com as suas lágrimas quentes. O Nokia deixado no banco de passageiro tocou, Jake olhou rápido, quase perdendo o controle do carro, para ver se era Heath, então haveria uma esperança e tudo poderia ser diferente.

― Você dorme hoje aqui?

― Ah... Sim, sim, Rachel. ― cansado demais para tentar esconder a frustação. ― estou a caminho.

― Você tá bem? ― a voz estridente com uma dicção forçada demais. ―Parece que você tá chorando, o que houve?

― Nada, eu apenas me desentendi com alguém. ― suspirou profundamente.

― Quem? ― a voz agora um pouco mais alta ― Não vai me dizer que foi com o diretor que eu te recomendei com quem você iria conversar. Jake, pelo amor de Deus, isso não se trata apenas de voc...

― Não, não. ― ele interrompeu. ― Foi só com um conhecido... ― a voz sumida no ar. ― Quer dizer, alguém que eu costumava conhecer...

― Ah, tudo bem. Não demore. ― sorriu. ― Fiz a sopa verde que você adora.

― Era tudo que eu precisava. ― fungou. ― Ganho abraços?

― E beijos! Tchau, Jake. ― e desligou.

O carro ia pela avenida molhada e agora estava tão vazio. Podia sentir o cheiro do perfume amadeirado de Heath no ar, se abrisse o porta-luvas acharia a camiseta branca esquecida naquela noite enquanto iam a praia para se amarem. Aquele era o seu momento, não que soubesse na hora. Jake não queria passar um dia sem Heath e agora teria que passar todos sem ele. Em algum universo paralelo, eles estariam juntos nesta noite. Deixa ser, deixa ser.

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