Avareza

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Não se trata de uma história bíblica. Sinto-lhe decepcionar. Não se trata de um narrador formal que estudou toda a história do céu e da terra. Se trata do relato de um acontecimento...  

"Se tem valor, tem um preço..."

Abri os olhos e sentei imediatamente na cama...

Estava soando muito. Sai do meio das cobertas, e ao sentar na lateral da cama, tudo veio a minha mente com a maior clareza possível. Eu ainda podia sentir aquele sabor em meus lábios, lembrei dos olhos dela diante dos meus, do toque, do gosto...

Eu estava ficando louco, como Agda pode ter feito aquilo? As lembranças são tão vivas, tão reais. Mas, como seria possível? 

Tomei um banho rápido, me vesti e arrumei minha mala. Era uma viagem rápida, pra cidade vizinha. Eu precisava me encontrar com o Padre Rafael, um velho amigo que conheci no seminário e que cuidava da paróquia da cidade vizinha. 

Quando passei pela sala, eu não pude evitar de olhar pra mesinha onde notei as duas taças de vinho ainda sujas. Tudo que eu lembrava realmente havia acontecido... eu estava perdido e confuso. Precisava de ajuda pra botar meus pensamentos em ordem. 

Uma mistura ensandecida de culpa, confusão e todos os meus anos dedicados a castidade parecia ter ido quase tudo por água a baixo. Meu peito apertava toda vez que vinha aquelas lembranças na minha mente. Eu precisa fazer alguma coisa...

Chamei um táxi, e em menos de 40 minutos eu já havia chegado na paróquia. Esperei a primeira missa do dia acabar e fui até Padre Rafael. Todos já haviam saído, e ele estava ajeitando as coisas para sair.

— Oh, Padre Fábio! Como é bom vê-lo por aqui! O que te traz ate minha paróquia? — disse me cumprimentando com toda sua animação.

— Bom vê-lo também meu amigo... — falei o abraçando.

— O que aconteceu? Parece... diferente. — disse Padre Rafael.

Será que era tão explícito o quanto eu estava mudado depois de tudo que aconteceu na noite anterior? Eu me sentia tão culpado, tão pesado e precisava falar disso antes que eu ficasse totalmente louco.

A agonia da minha alma transbordava.

— Preciso me confessar Padre... sabemos que antes de ser Padre, sou um homem. E preciso muito me confessar. — falei demonstrando estar muito apreensivo.

Ele notou que eu não estava bem e pareceu muito preocupado. Sem falar nada, mas expressando estar com medo do que viria pela frente, ele apontou o local para que eu entrasse e começasse a me confessar.

— Tem certeza que quer se confessar Padre Fábio? Somos amigos a tantos anos, podemos apenas conversar. — disse ele já do outro lado do confessionário.

— Eu preciso fazer isso, eu estou fazendo a coisa certa... — falei insistindo na confissão.

— Tudo bem... Em nome do Pai, do filho e do Espírito santo... Amém. — disse ele fazendo os sinais e o acompanhei.

— Amém... eu não sei por onde começar...  — falei apreensivo.

— Primeira coisa, a confissão é um pedido de perdão a Deus... como ambos sabemos. Então não se preocupe... eu estou aqui como um simples instrumento de Deus. Cristo é quem irá julgar o seu pedido de perdão. Vamos lá, o que quer dizer a Deus?— disse ele me lembrando os conceitos que aprendemos.

— Sei muito bem de todos esses conceitos meu amigo... mas mesmo assim é muito difícil. Eu queria muito que fosse fácil. Mas não existem maneiras fáceis de dizer coisas difíceis... — falei tentando juntar forças para começar.

O EmissárioOnde histórias criam vida. Descubra agora