Os nós dos dedos esfolados sustentavam o latejar no meu punho...
Mas acordei por conta da sensação de ressaca somada ao aperto no peito. Assim que me levantei, percebi que eu não usava roupas de dormir. Até meus pés estavam calçados.
Tudo está em seu coração..., as palavras ecoavam do fundo de minha mente. E, não pela primeira vez, me senti enlouquecendo devagar, sem o controle básico de meus pensamentos.
Cada um dos meus amigos protagonizava minhas memórias recentes, partidas em flashes de um segundo... Tínhamos curtido o dia juntos, porém... alguma coisa não foi bem. Lembrava de Hellen me chamando de maluco, de Peter tentando me acalmar e de Wesley pedindo desculpas. Eu estava tenso quando decidi vir para casa, porque... Por quê?
O cemitério...
Eles disseram que iriam até o inferno para me salvar, e aquele inferno se situava a duas quadras. Antes de me permitir perder o juízo, quis ligar ou mandar uma mensagem, mas não encontrei meu celular. Parei de procurar depois de três minutos.
Minha habilidade para pular a janela me surpreendeu. Não queria usar a porta e acabar esbarrando com meus avós no corredor. Eles não dormiam cedo — a televisão deles soava através da parede fina —, o relógio marcava onze e meia, e eu não conseguiria inventar uma mentira boa o bastante para sair sem problemas.
O cemitério deveria estar fechado naquela hora. Apesar disso, corri até lá, e não me impressionei ao ver os portões de ferro convidativamente abertos, sem sinais de vandalismo.
Embora meus pais estivessem enterrados naquele lugar, prometi a mim mesmo que eu não retornaria nunca mais. Contudo, meus amigos idiotas resolveram testar a sorte indo atrás da minha maldição. Foi aquela certeza inexplicável que me impediu de hesitar na entrada.
Não havia ninguém na consultoria e somente o breu adiante. O ambiente parecia rejeitar claridades, inclusive a tênue luz da lua. Os postes, ao lado dos portões, davam a única iluminação. Para não me acovardar, evitei pensar demais e avancei na escuridão.
Minha visão se acostumou facilmente... No entanto, perto da meia-noite, no meio a um monte de tumbas, talvez fosse melhor não enxergar nada. De qualquer forma, uma discussão roubou toda minha atenção. Reconheci as vozes, antes de começar a entender o que diziam.
— Deveríamos ir embora também.
— Você é frouxo pra caralho mesmo, Peter... Tá dando pra trás por causa da Hellen?
— Não, mas concordo com ela. O que estamos procurando aqui, afinal?
— Ei!
Ambos se viraram assustados ao me ouvir. Wesley firmou o celular, direcionando a câmera para mim.
— Liam — disse Peter, bastante surpreso —, o que tá fazendo aqui?
— O que vocês estão fazendo aqui?
— Estamos gravando — contou Wesley — pra te trazer de volta.
— Pra o quê? — Meneei a cabeça depois de perguntar. — Cadê a Hellen?
— Ela estava com a gente até ficar estressadinha e meter o pé.
— Deixaram ela sozinha?! Vocês são retardados? Eu tava falando sério quando disse que esse lugar era perigoso...
— Cara, relaxa. A gente veio aqui pra provar que não existe nenhum monstro do cemitério.
— Vamos procurar Hellen e dar um fora daqui...
A sugestão de Peter foi interrompida e substituída por um soluço, quando uma lâmina preta surgiu entre as clavículas dele. Às costas da nova vítima, Wesley gritou ao fim da cena, mas não pude ouvir nada além do tinido agudo na minha cabeça. Meio abafado, meu coração parecia me martelar. Apesar de alienado, fui capaz de impedir que o corpo de Peter tombasse. Não demorou para que seu peso me levasse junto para o chão.
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HIPNALE +
HorrorQual seria o seu nível de tolerância diante de um evento sinistro? Por quanto tempo você conseguiria manter sua sanidade ou se livrar do mal? Dez situações, dez períodos, dez pessoas e a mesma sensação perversa, conduzindo sorrateiramente ao seu ni...