Memórias do banco verde

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Parei um momento para pensar qual seria a melhor resposta. Por mais que ele não tivesse me feito nenhuma pergunta diretamente, o seu tom de voz me instruía a não tão casualmente me apresentar de volta. Me senti extremamente animada, o fato de que ele queria saber quem eu era me deixou levemente desnorteada.

-Nome estrangeiro?- perguntei, me esforçando para não deixar a conversa morrer. E de fato, eu estava curiosa. Minha curiosidade não parava ali, infelizmente. Estava curiosa sobre tudo, sobre quem ele era, sobre o que ele gostava. Sobre como uma pessoa podia ter um sorriso tão amigável, tão acolhedor. Me perguntei internamente se ele tinha as mesmas curiosidades sobre mim, mas a reciprocidade do momento era clara. Isso me fez sorrir.

-Gosta tanto assim de nomes estrangeiros? Não vai reclamar de imperialismo cultural?

-Ahn?- perguntei atordoada. O nome era bonito, mas eu tinha impressão de tê-lo visto em inúmeros seriados de televisão importados dos estados unidos - não ia falar nada, mas já que a carapuça serviu- deixei minhas palavras pairarem na minha boca, brincando com seus sentimentos- mas isso seria culpa dos seus pais não sua.

-Meus pais são Canadenses. Jason é um nome perfeitamente normal para eles- ele me falou rindo.

-E você, é Canadense também?- falei, procurando um sotaque sútil na sua fala.

-Sou, mas moro no Brasil desde os cinco anos.

Isso explica a falta de sotaque, pois seu português era perfeito. A palavra perfeito ecoava na minha cabeça ao olhar para aquele homem na minha frente. Enrubesci, sabendo o quão ridícula eu parecia não somente para mim mesma mas para Jason. Era bom associar um nome ao rosto. Jason. Jason.

Jason sentou ao meu lado no banco e começou a me contar um pouco de sua vida. Nada de extremamente importante. Ele o fez sem mesmo que eu tivesse que perguntar. Ele gostava de cachorros. Gostaria de ter um Border-Collie. O calor do Brasil o incomodava muito pouco comparado com o frio do Canada. O seu dedo indicador da mão esquerda era meio torto. Tocava piano, e dizia que não era muito bom, por mais que eu duvidava que esse fosse realmente o caso. Ele gostava muito de jogar baquete. Eu fiz o mesmo. Falei de como gostava de astronomia. Com ênfase no mia, o que o fez sorrir. Como meu joelho direito era um pouco maior do que o direito. Como eu sentia cocegas muito facilmente, menos nos pés. Como eu amava dançar, e como eu era uma terrível dançarina.

A conversa durou tempo, palavra e risada se misturando em um uníssono de flerte nada discreto. Eu tive que evitar olhar para seus olhos, tão castanhos e bonitos, tão expressivos, pela inteiridade de nossa conversa.

Passamos horas falando, horas escutando. Horas nos conhecendo melhor. Descobri que morava sozinho no Brasil, em um apartamento no bairro próximo ao meu. Contei que morava com meus pais em uma casa. Ele me disse que sua cor preferida era verde, e eu falei que a minha era azul escuro. Falei, sentindo como se fosse mentira, pois no momento, a minha cor preferida era a de cedro, a cor de seus olhos.

Ele ria quando eu contava uma piada sobre literatura, e tocava o meu braço levemente com os seus dedos. Eu continuava a dança, sorrindo e me aproximando de seu corpo sempre que Jason me falava algo digno de interesse, coisa que acabou sendo mais frequente do que eu esperaria.

Finalmente, vi que estava tarde e que ainda tinha que passar no mercado para fazer as compras. Despedi-me e sai me perguntando se não tinha sido um sonho. Passei o resto do dia no meu quarto pensando no que havia acontecido. Sentia-me em uma comedia romântica. Um estranho sentimento de empoderamento fluiu pelo meu corpo quando notei que por alguns momentos, finalmente era a protagonista da minha própria vida, e isso era incrivelmente motivador. Um sorriso fixo se instaurou em minha face

Momentos InfamesOnde histórias criam vida. Descubra agora