Sim, foi a decisão mais difícil que tomei em minha vida. Isso fez de mim, o adolescente mais louco que poderia ter existido. Decisões tomadas por impulso, muitas vezes são prejudiciais para o futuro. Estamos em uma teia de aranha, gigante. Atitudes no presente, influenciarão cada ramificação que terá origem em uma trajetória, o que faz de nós, seres limitados às nossas ações.
A chuva estava tão forte, que não dava para decifrar o que via-se no horizonte. Ouvi um barulho vindo do latão de lixo na esquina da rua Ronco das Hienas, lugar mais imundo do bairro Broto Seco. Nela, destroços de carros, arames enferrujados, gatos desnutridos, e até cadáveres de bode, tomam posse do ambiente. Dizem que foi amaldiçoada por uma bruxa que chamava-se Sabatha Obbes. Com uma vela na mão, falecendo, ela falou que nenhuma pessoa seria capaz de construir um imóvel sobre o solo daquele lugar, tanto é, que se um cidadão tentasse levantar algum tipo de moradia, logo ela desabava. A única casa que compõe a rua Ronco, é exatamente da senhora Sabatha, nem sequer numerada é. Contudo, não deixa de ser somente uma lenda, bruxos não existem.
Parei na esquina daquele lugar. No poste estava escrito em letra distorcida por chuviscos de água:Andar sem observar o que persegue-te
Falar com quem não conhece
Abandonar o lar que amanhece
Na esquina da vida padece!Olhei em todas as direções que pude. No alto, via-se somente um gato branco e desnutrido, que me observava com curiosidade. Um trovejar repentino no céu. O bichano se espantou e desapareceu de vista. Um marmita passou numa bicicleta, olhou para mim, consultou o relógio no pulso, me encarou e sumiu no escuro da rua imunda. Nesses dias de hoje, qualquer motivo é desculpa para levar alguém para o xadrez. Aqui em Broto Seco, se ultrapassar 23 horas, os marmitas (guardas que fingem de polícia) podem prender os cidadãos e qualquer outro tipo de gente. A chuva reduziu de forte, para uns chuviscos leves. O século XXI será lembrado pelas gerações, como o "Século Perdido", cada coisa que inventam. Um barulho de voz se propagou pelo ar, chegando aos meus ouvidos. Seguindo em direção ao som que ouvi, fiquei surpreendido com o que estava acontecendo. Fiquei escondido atrás de um latão verde de lixo, para que o marmita não resolvesse me prender.
-Minha senhora, se continuar assim, vou ter que levar a senhora para a cadeia.- o marmita que havia passado pouco tempo pela rua que eu estava, falava com uma paciência admirável, para uma senhora de trajes negros, cabelos grisalhos e um saco marrom, com algo sólido e vivo, dentro.
-Qual a autoridade que tens, não preciso desse gato comigo, ele não ajudas em nada...
-Mas minha senhora, não pode abandonar um animal indefeso assim, é proibido, é crime...
-Crime é matar as galinhas de uma pessoa, e esse nojento fez isso!- interrompeu a velhinha, com voz agressiva, sacudindo o saco.
-Ele é somente um animal, não sabe o que faz.- tentava explicar, o homem.
Um vulto pequeno passou rastejando pela calçada no outro lado da rua fétida. Não poderia ser, isso era ilusão de óptica. Tentei ampliar a visão, mas nada aconteceu. Então estiquei o pescoço, como uma girafa faz, na tentativa de ter certeza do que vi. Tinto, o rato velho, estava avançando para a extremidade escura daquele asfalto. Ele nunca abandonou o lar quentinho e farto, por uma farra com seus amigos roedores, aquilo estava mais do que estranho.
-Quieto, bichano!- a senhora ordenou, enquanto o saco se mexia violentamente.
O gato escapou do saco, e partiu em direção à escuridão. Só poderia ser atrás do rato preto. Não iria acontecer isso, por mais que eu não gostasse dele, ninguém o faria de refeição, saí rasteiro pelo canto da esquina, cheguei no outro lado, e sorrateiramente andei na direção da escuridão que o gato velozmente, tinha acabado de entrar.
-Ei rapaz- você mesmo, o marmita confirmou, porque fiquei em dúvida se era minha pessoa que ele chamava. Era o momento de correr, ou cadeia na certa. Volte aqui, jovem!- agora ele tinha ativado a cirene da bicicleta, que emitia um barulho insuportável, e começou pedalar ao meu encontro.
A perseguição não acabava, sendo que o caso da velhinha, ele deixou para trás, perseguindo minha pessoa, como se isso fosse a última coisa que ele faria na vida. Oito minutos com a perseguição, o suor tomava conta do meu rosto, meus olhos ardiam quando uma gota do mesmo, caía dentro. A rua parecia não ter um fim. De repente vi uma luz ao longe, uma casa de madeira antiga, com um belo jardim e rosas vermelhas como sangue, estava adiante, era preciso somente pular a grade de ferro. Não pensei duas vezes. Quando percebi, eu estava caído no chão, com um sangramento na barriga. Segurei o sangramento com minha mão esquerda, e me arrastei para o interior de um conjunto de flores, que poderiam cobrir o meu corpo. Um minuto depois, o guarda parou diante da grade, que agora dava para avaliar sua conservação. Estava enferrujada, e tinha uma espécie de tridente, a cada dez centímetros de espaço. Uma porta se abriu, alguém saiu. Olhei por entre as folhas, vi somente a face distorcida do guarda, segundos depois, deu um grito agudo e saiu correndo, sem precisar de convite para se retirar. Uma gargalhada fria e aguda veio em seguida. Tentei conter a minha vontade de sair correndo, como fez o marmita. Acima de mim, uma placa indicava com uma seta pintada em tinta branca, a casa, e abaixo um texto nítido, que dizia:
Para intrusos, desejo sorte
Muitos fingem de forte
Até conhecerem o beijo da morte
Algo que não se faz teste
Seja bem-vindo(a) ao número seteSe eu fiquei com sangue nas veias, não sei. Meus pés gelaram, na minha boca o maxilar ficou sem controle e começou a tremer, minha respiração estava faltando. Não existia casa com essa identificação naquela rua, era impossível. Não existia outra casa, a única pertencia a falecida Sabatha, e nunca teve identificação, pois ela sempre ameaçava quem resolvesse colocar uma bactéria do seu corpo, em alguma parte de sua residência.
-Humano...- uma voz maligna veio aos meus tímpanos- Sinto cheiro de carne humana- continuou a voz, que não mais seria, senão da pessoa que abriu a porta- Apareça, há tempos quero provar de minha refeição predileta- passos lentos começaram a ecoar pelo lugar- A titia Gnoma vai encontrar você, não pode se esconder por muito tempo. Quem um dia se atreveu entrar aqui, nunca saiu vivo.
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O Diário de Zoran-Ergástulo
Фэнтези"A vida transforma, assim como a água que caiu sobre a rocha, e a rocha que foi perfurada, originando um pequeno espaço, onde reside o amor, e o amor que lá habita, não é comum, uma vez que, somente uma única pessoa pode sentir, e sim, se ele fosse...