A Inesperada

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Sentado a beira do abismo, Ícaro, mantinha os olhos fechados e refletia. Ele sabia que tinha força para derrotar Monte, mas foi fraco ao se deixar levar por suas provocações. Imaginava o que sua falecida irmã pensaria dele.
Escondida atrás de uma árvore, uma pequena garotinha observava a meditação de Ícaro. Estava curiosa sobre o homem que todos falavam mal pelas costas, mas que não aparentava ser o monstro pregado. De alguma forma, ela enchergava bondade, nele.
Aproximou-se com cautela pra não ser percebida e não atrapalhar a meditação do solitário. Olhou atentamente para o rosto de Ícaro, olhou para seu corpo, sua postura e replicou sentando-se ao lado seu lado direito. Em mesmo instante o homem abre os olhos e se assusta com a presença da garotinha.
- Quem é você? - indagou encarando a estranha garota.
- Heloísa. Muito prazer! - manteve a postura de meditação.
- Heloísa, onde estão seus pais?
- O abismo não é lugar para conversar, Ícaro. - respondeu imitando as palavras ditas por ele no ringue.
Ícaro riu e voltou a meditar. A garota se incomodou com a situação, pois não entendia direito o que fazer alí ou como meditava.
- Ei... Ícaro...
- An?
- O que você tá fazendo?
- Meditando.
- Ahh... Ok.
O silêncio voltou, mas não durou muito tempo.
- Ícaro...
- Sim?
- Parabéns! Você medita muito bem!
- Obrigado. - riu.
Mais uma vez ficaram em silêncio. A garota ficou encarando o homem, tentando decifra-lo, mas aborreceu-se sem entender nada.
- Ícaro... - chamou, emburrada.
- Oi...
- Como faz?
- O que?
- Meditar.
Ícaro começou a rir da revolta da criança que não conseguia meditar.
- Para de rir!
- Por quê?
- Não tem graça! Você está rindo só porque sabe meditar e eu não!
- Desculpa, eu não vou fazer denovo.
- Então me ensina.
- Está bem... feche os olhos e tente sentir todo o seu corpo.
A menina seguia as instruções sem questionar.
- Agora tente relaxar cada músculo. Comece com os pés... pernas... barriga... tronco... braços... mãos... agora relaxe a mente. Deixe-a livre. Se estiver difícil, sinta o vento e permita que ele conduza seus pensamentos para longe. - falava encarando o horizonte.
Ícaro voltou os olhos para a menina. Ela havia dormido.
- Acho que você relaxou demais, Heloísa... - falou para si mesmo.
Ele a deixou dormindo e voltou a meditar. Passou a noite inteira lá, parado. De alguma forma, a garota havia o distraído de todos os pensamentos negativos. A situação completamente aleatória fez com que após muito tempo, um sorriso verdadeiro manter-se em seu rosto.
O sol em fim deixa seu esconderijo no horizonte. Um novo dia começa. Um dia de mudanças drásticas. Ícaro respira fundo e em fim abre os olhos. A menina começara a se esticar na grama.
- Dormiu bem, Heloísa?
- Sim... Esse negócio de meditar é muito bom.
- Por que não vai pra casa? Sua família deve estar preocupada com você...
- Não posso... - baixou a cabeça, entristecida.
- Por que, não?
- Não tenho uma família.
O homem assustou-se com a revelação da garota. Lembrou-se de algumas histórias que escutou tempos atrás sobre uma criança ladra que vivia nas redondezas, mas não acreditava que poderia ser ela. Crianças assim, geralmente não simpatizam com ninguém, são frias e sorrateiras. A garota era adorável, não parecia ser capaz de machucar uma mosca se quer.
- Ícaro...
- Oi?
- Eu não acredito no que as pessoas dizem sobre você... - levantou-se e abraçou o homem pelas costas. - Você não é um monstro e sei que amava a Luna.
As palavras da garota foram o mais fatal golpe que Ícaro já recebeu. Toda a postura seria e amedrontadora que ele possuía, havia sido desarmada em segundos. Além do mais, era tudo verdade. A pessoa que ele mais amava era Luna, sua irmã. Uma lágrima escorreu pelos seus olhos. A muito tempo ele esperava que ela fosse derramada, mas não conseguia. Uma simples garota, desconhecida, havia derrotado o homem tido como mais perigoso da vila, e sem causar ou sofrer ferimentos.
- Bem... preciso me alimentar. Quer vir comigo, Heloísa?
- Uhum.
- Segure-se.
A garota envolveu o braço no pescoço dele, abraçando sua cintura com as pernas. Ele começou a caminhar cada vez mais próximo da beira do abismo.
- O que você vai fazer? - perguntou assustada.
- Pular.
- O quê??? - desesperou-se
Ícaro colocou dois dedos entre os lábios e soltou um agudo assobio enquanto pulava abismo abaixo. A garota gritou desesperada enquanto o tempo aparentava parar. Em queda livre, Ícaro de braços abertos mirando o chão, Heloísa o enforcando-o, caiam juntos a beira do abismo. Ela havia fechado os olhos de tanto medo, quando sentiu um súbito desvio de direção. Estava com medo de mais para abrir os olhos, mas ainda conseguia falar.
- Ícaro?
- Sim?
- Nós morremos, não foi? Então é assim que é morrer?
- Não... - riu. - Abra os olhos.
A menina abriu os olhos lentamente. Primeiro reparou que não estavam mais de ponta cabeça, mas sim planando para o horizonte. Depois ouviu um bater de asas e assustou-se. Olhou para baixo e entendeu. Seus olhos brilharam de fascinação. Pra ela era como um sonho.
- Achei que estivessem extintos!
- Quase. Restaram poucos, então vivem escondidos dos homens.
- Sério? Que incrível!
Uma criatura mística. Símbolos de espiritualidade. Suas grandes asas cortavam o vento de forma suave e silenciosa. Sua longa cauda dava equilíbrio e agilidade no ar para movimentos livres e complexos. Suas duas patas possuíam afiadas garras capazes de perfurar a mais potente armadura, mas o que mais chamava atenção era a sua capacidade mágica de manipular os elementos e sua incríveis penas.
Essas criaturas esplendorosas possuíam grande diversidade de cores e brilhos nas penas que também representavam as origens do ser místico. O que Ícaro e Heloísa montavam, possui penas brilhantes que transitam entre o azul claro, o rosa e o branco. Era compreendido, através da cor variante rosa, que ele nasceu na primavera, pelo brilho lustroso, sob a luz da lua, e pelo tom azul claro, no elemento do gelo. Sem dúvidas, uma criatura nobre.
Pousaram próximo ao lago onde Ícaro mergulhou para pegar alguns peixes e logo após fritou-os. A garota continuava encantada com a curiosa criatura.
- Você gostou mesmo dele, não foi, Helô?
- An? Ah! Sim! É lindo! Onde o encontrou? - falava acariciando a cabeça do simpático animal.
- Na verdade, Luna que encontrou um ninho no alto daquela montanha. - apontou para o norte. - Passávamos horas, todos os dias, observando secretamente sua mãe e irmãos. Infelizmente, ele foi abandonado por ser o mais novo de 4 e a mãe não conseguir comida para todos. Dês de então cuidamos dele.
- Que pena... deve ter sido duro pra você, não é? - falava com a criatura.
- As vezes me preocupo com a segurança, mas ele já se provou capaz de se defender.
- Ele tem nome?
- Nós chamamos ele de Dahlio.
- É um belo nome! Você quem escolheu?
- Não. Eu queria chama-lo de Trovão Azul... mas a Luna não deixou. - sorriu, mas ao recordar a falecia irmã, entristeceu-se. - Ela dizia que o nome era ridiculo e grande.
- Ela estava certa. - riu.
- Sim... Também achei que Dahlio combinava mais... - riu junto a garota.
Após as dúvidas da garota, comeram o peixe e ficaram admirando Dahlio dormindo. Tudo estava calmo, até a garota trazer uma pergunta inesperada.
- Ícaro...
- Tô começando a querer trocar de nome... - riu. - Diga, Helô.
- O que aconteceu de verdade com a sua irmã?
Pego de surpresa, respira fundo e resolve contar para a garota. Nunca teve a oportunidade de se explicar para ninguém.

Ícaro, O Filho do SolOnde histórias criam vida. Descubra agora