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Eu surtei. Só pode ser isso. O jetlag está afetando seriamente minha cabeça. Por qual outra razão eu aceitaria ficar aqui? Eu mal conheço essa família. Eles não sabem nada sobre mim, mesmo assim não pensaram duas vezes antes de me acolherem. E eu nunca pensei que me sentiria tão bem com outras pessoas como me sinto quando estou em casa no Brasil. Nem mesmo Jazz acreditou quando conversamos mais cedo. Esperava que ela me dissesse algo sensato como "saia já daí, Selena. Vá para um hotel e resolva sua vida sozinha". Porém minha amiga com imaginação fértil e desmiolada se despediu com um "me mande fotos" seguido de um "relaxa e curte". 

Solto um suspiro cansado enquando bebo o restante de chá da minha xícara. Estou sentada na janela do quarto de hóspedes da mansão Santini. O que no mundo poderia ser mais clichê do que uma jovem sentada na janela de uma casa italiana olhando para o céu? E todos esses suspiros? De onde veio isso? Deve ser o ar impregnado por todo esse romantismo e cheiro de uvas e flores. Ele está me deixando ridiculamente romântica. Socorro. Preciso de um processo judicial bem feio para resolver e acabar com essa vibe Julieta. Meus pensamentos são interrompidos pela risada do jovem logo abaixo da minha janela. 

_Sério Lucca? Com tantos lugares para você aparecer tinha que ser justo em baixo da janela?

_O que? Eu estava de passagem e ouvi você resmungando. Você está bem?

Ele estava realmente preocupado. E me olhando lá de baixo seus olhos azuis mais pareciam refletir as estrelas que brilhavam no céu. Ele era lindo. Indiscutivelmente lindo. Meu lado artistico há muito esquecido estava gritando pela necessidade de desenhá-lo. Colocar no papel todas as linhas de seu rosto, os pontos de tensão, sombra e luz que fazem de Lucca um dos homens mais lindos que já vi. Com uma pergunta ele me desarmou por completo e quando tornei a falar estava mais calma.

_Só estou preocupada. Isso tudo é tão estranho. Sinto que estou abusando da boa vontade de vocês. 

_É isso? Ufa! Achei que eu tinha feito algo de errado. Quer dar uma volta? 

Fiquei confusa com o rumo da conversa, mas Lucca não me deu tempo de pensar. Apenas disse para calçar alguma coisa e me encontrar com ele na cozinha. Havia alguma coisa na forma como ele falava que me impedia de ser sempre racional e me atraía como um ímã. Eu gostava de ficar perto dele, de ouvi-lo falar e principalmente como eu me sentia quando estava perto do "menino Lucca" como a família o chamava. Calcei um par de chinelos e segui até a cozinha. Todos os parentes já haviam ido embora e os moradores da casa já haviam se recolhido. Talvez fosse por isso que me sentia como uma adolescente rebelde fugindo na calada da noite. 

_Me sinto uma clandestina saindo de fininho assim_ ele apenas sorriu tranquilo e indicou com a cabeça o caminho a seguir. Passamos pelo grande pátio, descemos pelo jardim e passamos por debaixo dos galhos da mesma árvore cuja sombra abrigara a mim, Giovana e Sophie durante a tarde. 

_Eu caí dessa árvore quando era criança_ contou_ Lá do alto. 

_Sério? E se machucou muito? 

_Nada. Só uns arranhões. 

_Como assim Lucca? É muito alto. Um adulto se machucaria, imagina uma criança.

_Minha mamma diz que Deus mandou um anjo para me segurar.

_E você acredita nisso?_havia um tom leve de deboche na minha voz e Lucca deve ter percebido, pois se voltou para mim sério ao me responder. 

_Sim. Eu acredito que algo sobrenatural aconteceu naquele dia. Na verdade, acredito que nos cerca o tempo todo. 

Ele não estava bravo nem chateado pelo que eu disse. Parecia muito certo sobre sua crença para deixar-se ser abalado pelo meu sarcasmo. Esperava que Lucca me desse as costas e seguisse pelo caminho, ao invés disso, ele me estendeu a mão e me ajudou a andar pelo gramado. Esse simples gesto de atenção fez com que aquele leve movimento na boca do meu estômago se intensificasse. 

Anima- Sopro de vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora