Fiquei em choque ao ver Érica entrando pela porta. Era a primeira vez que nos encontrávamos desde o término e isso poderia ter acontecido a qualquer dia, a qualquer hora, mas o desgraçado do destino fez com acontecesse exatamente naquele momento. O momento que eu esperei por quase um mês. A situação toda por si só já era bastante embaraçosa e o fato de Clara ter saído quase correndo dali, com uma desculpa totalmente esfarrapada, a qual ela sabia que não colaria para mim, havia deixado as coisas ainda mais esquisitas. Érica com certeza também não caiu na história do bolo, pois ficou notavelmente constrangida com a saída repentina dela. E eu fiquei sem saber o que fazer, pois queria muito correr atrás dela, mas também sentia necessidade de saber como as coisas estavam indo depois do transplante do João. Então decidi interrogar Érica rapidamente acerca das novidades e em seguida correr para alcançar Clara e retomar de onde paramos, apesar do clima quebrado. Érica, visivelmente constrangida, adotou sua costumeira postura passiva, encolhendo os ombros e abraçando o próprio corpo, como se sentisse frio.
- Desculpe, não queria interromper nada. - Falou de cabeça baixa. - Ela ficou chateada, não foi?
- Sim, acho que sim. - Disse olhando na direção em que ela saiu correndo. - Mas não tem que se desculpar, relaxa.
- Ela não é sua amiga, é?
- Não, ela não é. - Disse pensativa, imaginando o que nós éramos.
- Bom, então acho melhor você ir atrás dela.
- É, eu vou, mas antes quero saber do João. Como ele está?
- Ah, ele está ótimo. - Sorriu. - Novinho em folha. O organismo não deu nenhum sinal de rejeição.
- Que maravilha! - Sorri com sinceridade. - Fico muito feliz com isso. Diga que mandei um beijo.
- Pode deixar, eu digo sim. - Respondeu com um sorriso iluminado, enquanto me encarava profundamente e em seguida desviou o olhar e seu sorriso esmaeceu, dando lugar a uma expressão triste e desconfiada. - Você gosta dela?
- Da Clara? - A pergunta me pegou de surpresa, mas a resposta que veio em minha boca de forma involuntária me surpreendeu mais ainda. - Sim, gosto muito. - Suspirei.
- Então está esperando o quê para ir procurá-la? - Respondeu triste.
- Vou levar você até o Nicolas e depois vou falar com ela.
- Não, eu me viro. Vai lá.
- Tem certeza?
- Ju, você não tem mais qualquer obrigação comigo e essa escolha foi minha. - Falou triste, causando-me uma pontada de dor.
- Ok, então... Então tá! Eu vou lá. - Já ia saindo quando ouvi a voz dela me chamando.
- Júlia? - Ela me chamou e eu virei. - Foi muito bom te rever.
Apenas sorri. Foi estranho, pois por muito tempo pensei que quando a reencontrasse o meu coração tentaria saltar para fora do peito e eu sentiria uma vontade sobrenatural de abraçá-la e beijá-la, mas ao invés disso senti apenas uma preocupação genuína com o estado de saúde do filho dela e com o seu estado emocional nitidamente abalado. Ela parecia triste e arisca, exatamente como quando a conheci. O canalha do marido com certeza já deveria ter voltado a aprontar e isso me deixava com um sentimento de pesar, mas já não havia nada que eu pudesse fazer, pois a escolha foi dela, como ela mesma disse. Além disso, o fato do meu coração estar acelerado naquele momento nada tinha a ver com ela.
Olhei por todas as partes e não a vi. Peguei o telefone e liguei para ela, que logicamente não me atendeu. Dei mais uma volta na área, mas nada dela. Encontrei Gustavo, mexendo no telefone perto da piscina.
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Amor... E Outros Dilemas - Degustação
RomanceNem Clara e nem Júlia estavam dispostas a sair de casa àquela noite, mas ambas, convencidas por seus respectivos amigos, resolveram ceder. Clara, racional, realista, dominadora de seus próprios desejos, conhecida por muitos como a rainha do gelo; Jú...