Capítulo 3 - O Dilema

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Acordei abraçada a ela, que estava lá, dormindo profundamente ainda, linda e nua. O sono dela era tão pesado que não se moveu quando saí de seu corpo, erguendo-me para ver a hora no relógio sobre a mesinha de cabeceira. Eram 6h10, ainda cedo. Não sei ao certo quanto tempo ficamos ali fazendo amor, mas acho que no total eu havia dormido menos de quatro horas. Meus olhos pesaram e senti uma vontade enorme de deitar de novo e abraçá-la, mas não o fiz. Ao invés disso deixei finalmente a razão falar.

Nicolas teve muito trabalho para me convencer a sair naquela noite. Estava muito animado com a possibilidade de rever Gustavo. Eu, no entanto, só pensava em deitar na minha cama e afundar meus pensamentos em um bom livro até adormecer. Saí de casa praticamente arrastada e não imaginava, nem de longe, que a noite acabaria de forma tão incrível.

Clara é uma mulher linda e foi impossível não fazer um tour por sua beleza no momento em que fomos apresentadas. Vestido preto, morena clara, cabelos castanhos ondulados caindo em seus ombros, o rosto delicado, traços finos, lábios carnudos e olhos castanhos claros, quase cor de mel. Um leve ar arrogante, talvez até um pouco pretensioso, eu diria. O corpo, nossa! Escultural. Cintura fina, quadris largos, seios fartos... O conjunto todo da mulher era sensacional. Nicolas a chamou de rainha do gelo e então lembrei que já havia ouvido sobre ela. Melhor amiga do Gustavo desde a faculdade, os dois foram juntos embora para os Estados Unidos. Nicolas dizia que ela sempre foi uma ótima amiga, mas que não era fácil conquistar sua atenção. O engraçado é que não consegui enxergar absolutamente nada do que ele falou quando a conheci. Simpatizei com ela de cara. O ar era de arrogância, mas se portou de forma muito gentil comigo, mesmo parecendo estar ali contra a vontade. Em determinado momento, acho que ficou com medo de que eu desse em cima dela e fez um comentário sobre como era injusto ter tantos homens lindos no ambiente e todos serem gays. Respondi-a com indiferença e continuamos conversando sobre assuntos aleatórios, o trabalho dela, na maior parte do tempo. O jogo todo começou quando ela escolheu aquela música. Fiquei na dúvida, não sabia se havia sido uma escolha casual ou proposital. Quando ela me convidou para subir em seu apartamento, tive certeza de suas intenções. Pensei em resisti a priori, mas não deu. A mulher toda era tentadora: corpo, mente e alma. O simples fato de estar próxima a ela despertava em mim pensamentos e sensações irracionais. Meu corpo reagia a cada palavra ou a cada movimento dela. Não tenho palavras para descrever a noite que se sucedeu dali em diante... Fantástica, alucinante, sensacional... Sem dúvidas, inesquecível. Mas era isso e ponto final.

O caos emocional em que me encontrava não me permitia engatar nenhum tipo de envolvimento com ninguém. Ainda mais com alguém como ela, "A Rainha do Gelo". Eu sou o total oposto disso, pois vivo de emoções, de envolvimento, de contato. Sou intensa e, quando amo, amo de verdade. Família, amigos, ex-namorada...

A primeira vontade que tive quando acordei e a vi ali, majestosa, foi de enchê-la de beijos até que ela acordasse para começarmos tudo de novo. Depois tomaríamos banho juntas e também café da manhã. Seria tudo perfeito... Espera, e se não for assim? Rebobinei a cena até o momento que ela acordava, mas ao invés de me beijar, me olhava sem graça, dizendo que a noite havia sido boa, mas que eu precisava ir embora. Então decidi encurtar a história e levantei de fininho. Recolhi meu vestido e o sutiã no chão e procurei minha calcinha, mas não achei. Caminhei até a porta que julguei ser a do banheiro, acertei. Entrei com o intuito de me vestir sem ser flagrada e sair, mas quando me olhei no espelho, percebi que estava assustadora. A cara toda borrada da maquiagem dormida. Olhei para a pia, vi uma caixa de lenços umedecidos e puxei um para remover a maquiagem. Descaradamente peguei a escova de dentes dela e usei. Ela não se importaria com isso, pois não era mais íntimo do que tudo que fizemos na noite anterior. Olhei para o box e decidi terminar o tour intrometido pelo banheiro dela. Prendi o cabelo em nó no alto da cabeça e tomei um banho rápido. A toalha que usei também foi a dela. Vesti-me e voltei para o quanto, com medo de encontrá-la acordada, mas ela estava exatamente na mesma posição. Recolhi minhas sandálias e saí, sem olhar para trás. Ao entrar na sala, vi as taças largadas na mesinha de centro, e um flash de nós duas ali na noite anterior, frente a frente, veio à minha mente. Foi quando senti uma pontada de culpa por sair sem deixar rastros, mas o dilema foi inevitável. Meu ato poderia deixá-la tanto irritada como aliviada. O que fazer? Caminhei até a mesinha onde estava minha bolsa para pegá-la e vi um bloquinho de anotações próximo ao telefone e tive uma ideia. Peguei a caneta, destaquei uma folha do bloco, peguei o celular na bolsa para uma pesquisa rápida no google, escrevi o que queria no papel e voltei para o quarto. Ela ainda estava lá, dormindo, linda. Pousei o papel sobre o travesseiro que aconchegou meu sono aquela noite e já ia sair, quando vi minha calcinha embaixo do joelho dela. Quis pegar, mas desisti. Ri, imaginando o que ela pensaria ao encontrá-la. Uma última olhada para aquele conjunto lindo de mulher antes de sair, e em seguida fui embora, sem olhar para trás.

Amor... E Outros Dilemas - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora