Capítulo II - Annabelle, a mulher que tem meu coração...

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Capítulo II - Annabelle, a mulher que tem meu coração e o idiota do mestre que tem o seu

Conheci Annabelle em uma mesa de rpg logo quando me mudei daquela cidadezinha fedorenta no interior para a capital. Ela era uma moça linda, com cabelos castanhos ondulados, que mostravam um movimento sutil mesmo quando preso, olhos da cor de jabuticabas frescas e um jeito meigo de fingir — como eu, oh! Doce e encantadora Annabelle —, ser aquilo que não era.

Era uma campanha simples, mestrada por um retardado que provavelmente jogava de guerreiro ou bárbaro, por que pelo que eu observava ele pouco pensava.

Estavamos todos com personagens das classes básicas, eu estava com um ladino elfo, Annabelle com um bardo meio elfo — podem dizer, eu sei que o destino foi estrondoso conosco —, e ainda tinham mais duas antas que nunca haviam jogado e acredito eu que nem ao menos se deram o trabalho de ler os livros, Luccas estava jogando de bárbaro anão — e acreditava que por seu personagem ter um nível baixo de inteligência ele deveria agir de forma burra —, e Nicolas com um guerreiro humano — claramente instruído pelo mestre para poder ter mais talentos que qualquer outro na mesa nos níveis baixos.

A questão era que eu tava de saco cheio dos noobs que fingiam saber de algo e que acabavam fodendo a campanha, e como bom intérprete de ladino que sou — ainda prefiro arqueiros, mas naquela campanha não cabia um —, acabei virando o dado delicadamente para um número maior que eu teria tirado sem que ninguém percebesse.

Foi o que pensei, porém Annabelle era atenta e sabia de tudo que acontecia na mesa, além de ser ótima em diplomacia como o bom bardo que interpretava, a moça também era boa escondendo fatos, pois apenas sorriu irônica olhando nos meus olhos e deixou aquele fato passar, deixando-me limpar a carteira das duas antas que fingiam jogar conosco.

Acho que nesse momento meu coração e sanidade oscilou, olhando para aquela mulher que não apenas jogava bem, como sabia claramente encarar suas tendências — neutro mal, ah como as amo —, na vida e fora da mesa, como eu.

Annabelle sorriu quando o guerreiro e o bárbaro acabaram presos por montar na primeira dama da cidade que estávamos — preciso deixar claro que o mestre era um pouco sádico e que deixou os noobs de marca maior se embebedaram e apenas rolava os dados enquanto eles quebravam a cidade e brincavam no estábulo dela, a jogada da montaria real foi de certa forma genial, mas eu, como gênio que sou, faria ainda melhor. Alan poderia ser engraçado, brilhante, e namorar Annabelle — soube assim que ele a favoreceu em experiência e em ouro quando a moça simplesmente dava idéias de planos —, mas não chegava nem perto da minha real genialidade.

No momento em que soube dos dois meu mundo ruiu, queria chamar a moça que jogava de bardo, que usava a raça que eu amava para sair, talvez beber uma cerveja e divagar sobre mil e uma teorias diferentes sobre o jogo, se quiçá a convidar para uma aventura em outros estilos, como terror e a abraçar lentamente quando ela se assustasse com os mistérios do cthulhu.

Mas não! A vida mostrava injusta mantendo aquele barbudo de olhos azuis cabelos e maldita barba — eu já disse barba? — loira. Aquele descendente de europeus filho da puta com sorriso branquinho e pele tão clara que chegava a brilhar, maldito filho de uma mãe com sorriso faceiro e sotaque marcado, a qual é?! Quem precisa desses bonecos perfeitos que pareciam ter realmente saído de uma aventura nórdica?

Ninguém precisa deles.

Não, não e não.

Mas a trança na barba longa e o sorriso resplandecente realmente eram encantadores.

Mas eu seria um par melhor a Annabelle. Claro que seria, afinal eu sabia encarar melhor a vida como uma aventura repegista mesmo que eu não deixasse minha aparência como tal.

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