Capitulo 1

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Makaila Narrando

Um ano se passou desde que o meu mundo virou de cabeça para baixo. A revelação de que o Hunter e o Brian são irmãos foi como um terremoto, abalando as fundações da minha vida. O peso dessa verdade ainda me acompanha todos os dias, e eu me pego pensando sobre como uma decisão de um homem pode mudar o destino de tantas vidas. Como alguém pode ser tão frio a ponto de abandonar um filho? Não consigo entender, e talvez nunca entenda.

Renato Silva, o pai que abandonou Brian, era mais do que um simples desaparecido: ex-mafioso e ex-policial em Ohio, ele passara pelo morro de forma quase invisível. Ao saber que a mãe de Brian estava grávida, desapareceu como se nunca tivesse existido. Para todos os efeitos, ele estava morto. Enquanto Brian sobrevivia às custas de um mundo de privações, o seu pai construía um império obscuro nos Estados Unidos, equilibrando-se entre a máfia e a polícia, usando o sistema em seu próprio benefício. Cada vez que olho para o Allan, com a mesma cara de Brian, sinto uma revolta amarga. Como é que alguém abandona uma criança tão pequena e a deixa para ser vítima de um mundo que exige tanto de tão poucos?

O Hunter mesmo com toda a sua força, tem tentado ser um bom pai para Allan. É uma tarefa difícil, especialmente quando ele próprio tem suas próprias sombras e inseguranças. Allan é o único que merece todo o amor do mundo, mas não posso deixar de sentir uma pontada de dor ao ver como o Brian se recusa a se conectar com ele. Quando a Sofia liga para ele e fala sobre o irmãozinho, a conversa sempre acaba em silêncio constrangedor. O coração dela é puro, e a inocência dela a impede de compreender a complexidade das emoções adultas. Às vezes, eu gostaria de poder proteger a Sofia de todas essas verdades cruéis.

A verdade é que cada vez que olho para Allan, vejo a imagem de Brian refletida nele. Não apenas a semelhança física, mas também algumas expressões que me fazem lembrar do que ele poderia ter sido — um pai presente e amoroso...

Com o apoio de Damien e Sofia verdadeiro presente, sempre prontos para ajudar, especialmente quando a carga parece pesada demais. A maneira como Damien cuida de Sofia me faz sentir esperançosa; ele a ensina sobre o mundo e as complexidades da vida. Sinto que, juntos, estamos formando uma família, um sistema de apoio que compensa a ausência de Brian.

A Leila se mudou para a Califórnia em busca de novos desafios. Ela sempre foi a minha âncora, e a saudade dela aperta meu coração. No entanto, entendo que cada um de nós precisa seguir seu próprio caminho. O fato de ela voltar de vez em quando traz um pouco de normalidade e alegria à minha vida. Às vezes, conversamos longas horas sobre como a vida é complicada, e ela sempre me lembra da importância de cuidar de mim mesma e de meus filhos. Às vezes, o peso da responsabilidade é demais, e preciso lembrar que, mesmo sendo mãe, sou uma mulher com sonhos e ambições.

Apesar de tudo, eu não posso deixar de sentir que a vida me reservou um caminho diferente do que eu havia planejado. O trabalho como enfermeira me preenche de uma forma que eu não esperava. Todos os dias, cuido de pessoas que precisam de ajuda, e isso me faz sentir que estou contribuindo de alguma forma. O hospital é um lugar onde vejo histórias de vida e superação. Cada sorriso que consigo arrancar dos meus pacientes é um lembrete de que a vida continua, mesmo nas situações mais difíceis.

Alemão Narrando

O pó já virou rotina, e essa adrenalina no sangue é quase como um grito de liberdade, mesmo sabendo que isso me prende mais do que liberta. A cada trago, o peso do mundo parece mais leve, como se eu pudesse esquecer por alguns instantes. Abro a janela da sala e deixo o vento da noite bater no rosto, tentando afastar um pouco dessa bagunça que tenho aqui dentro. Mas nada adianta. Eu tô preso em mim mesmo. Cada vez que fecho os olhos, a imagem dela aparece. A Makaila... O que ela ainda faz dentro da minha cabeça?

Não importa o quanto tento, não consigo esquecer o que a gente foi. E agora, saber que o Hunter, o cara que eu odiava, o cara que tava com ela... é meu irmão. Pensa só, é pra rir da cara do destino. 

Mas qualé? Irmão coisa nenhuma. Ele não faz parte de mim, nem ele, nem o tal do Renato. O "grande" Renato Silva, ex-mafioso, ex-policial, pai ausente, e quem sabe o que mais? Pra mim, isso tudo não passa de história, uma história que não me interessa. O CH até falou que eu devia dar uma chance, conhecer a "família" que nunca tive, mas ele sabe onde eu mandei ele enfiar essa conversa, né?

A vida no morro não era fácil, mas havia uma certa liberdade que perdi quando o JP assumiu o controle da Rocinha. O tempo passou, e ele tornou-se um chefe respeitado. Dei-lhe carta branca, e agora só me envolvo nos negócios maiores. Mantive um garoto de confiança para lidar com os problemas diários e mantê-los longe de mim. 

 As pessoas me têmem, e isso me dá uma sensação de poder, mas no fundo, eu só quero a liberdade de voltar a ser quem eu era antes. E quem eu era? Um moleque perdido, mas pelo menos com sonhos. Agora, só restam as lembranças de noites em que a vida era mais simples, e as estrelas eram mais brilhantes.

A única luz na minha vida é a Sofia. Ao ver as fotos dela, um novo sentimento começa a brotar em mim — algo que eu não esperava. A conexão que sinto com ela é pura e verdadeira. O jeito como ela sorri, como parece feliz mesmo em meio a toda essa confusão, me faz querer ser um homem melhor. O JP me mostra fotos dela frequentemente, e cada imagem é como um raio de sol cortando as nuvens escuras da minha mente. Ele me fala sobre como a Sofia é esperta e como ela já está se tornando uma menininha incrível. Isso me dá esperança de que, um dia, eu possa ser parte da vida dela.

Mas o peso do meu passado ainda me empurra para longe de qualquer sonho de reconciliação. A ideia de encontrar o Brian, de enfrentar a verdade sobre o que aconteceu, me assusta. Eu não estou pronto. Não sei se algum dia estarei. Cada vez que o JP menciona o garoto, meu sangue ferve. Como ele pode existir? Como o mundo pode girar normalmente quando eu estou aqui lutando contra meus demônios?

Os negócios no morro agora são mais pesados. O Piqueno está fazendo um bom trabalho, mas sempre me preocupo. Não posso deixar ninguém se aproximar de mim. A traição se paga caro, e já vi amigos se tornarem inimigos em questão de segundos. O respeito é tudo, e eu não posso permitir que alguém me derrube novamente. Por isso, mantenho todos afastados, exceto a Sofia e, de vez em quando, algumas memórias de Makaila que não consigo esquecer.

Renato Silva... o homem que deveria ter me ensinado a ser forte. Em vez disso, ele é a fonte de todas as minhas inseguranças. Ele me deixou um legado de dor e abandono, e eu prometi a mim mesmo que nunca serei como ele. Não quero que a Sofia sinta essa mesma dor que eu senti. Quero que ela tenha a chance de ser livre, de ser feliz, longe das correntes que me prendem.

Agora, com as noites caindo sobre o morro, eu respiro fundo, tentando encontrar um caminho para sair dessa escuridão. A vida pode ser um jogo cruel, mas eu não vou desistir. Um dia, vou me libertar das amarras que me prendem. Um dia, vou ser o homem que a Sofia merece.

Entre dois mundos 2Onde histórias criam vida. Descubra agora