NO FIM DAS CONTAS, A LOBA era Elizabeth Heywood, a garota que tinha ido à casa de Matthew em Vineyard. Frankie conhecia Elizabeth mais ou menos por causa de Zada. Ela não era exatamente parte da turma do Alfa — mas era um par à altura dele, já que tinha passado grande parte do ensino fundamental como atriz de um seriado popular, fazendo o papel da filha cínica de um comediante famoso. Ela havia entrado na Alabaster como caloura no ano em que o programa terminou, mas ele ainda continuava sendo exibido. Tinha sido parte do ritual de iniciação de todo calouro nos últimos três anos ficar olhando Elizabeth caminhando pelo refeitório, um pouco mais velha e um pouco mais bonita do que seu personagem na TV.Frankie sabia que Elizabeth tinha ganhado o dinheiro que estava pagando pela Alabaster. Ela também tinha ganhado o dinheiro que pagou por sua Mercedes
vermelha, que descrevia como “uma compensação por ter passado a minha
infância trabalhando com um monte de viciados em cocaína e bruxas
manipuladoras” —, então ela se diferenciava de seus colegas da mesma maneira
que dinheiro novo se diferencia de dinheiro velho.
Ela era extremamente conhecida em todo o campus — sem ser exatamente
popular. Ela era mais do tipo que ficava indo de um lado para o outro,
confortável em vários grupos sociais diferentes, sem estar firmemente associada
a nenhum deles. Ela tinha aquele rosto largo, cheio de sardas e com covinhas
enormes que você vê frequentemente em atores mirins que foram escolhidos por
terem uma aparência tipicamente americana, e o cabelo dela, que tinha sido
pintado de ruivo na TV, era castanho. Ela falava de forma distraída e levemente
incompreensível, um traço que fez com que seu ibope fosse parar nas alturas na
época de maior popularidade do programa.
Elizabeth e Alfa raramente eram vistos juntos, a menos que estivessem em
um grupo, e nunca davam nenhuma demonstração de afeto. Ainda que
estivessem saindo havia poucas semanas, eles se alfinetavam como se fossem
casados havia anos.
Quando você está num colégio interno, e os obstáculos tradicionais como o
transporte e as suspeitas dos pais são removidos da equação, os relacionamentos
podem avançar rapidamente. Esse truísmo se aplicava não somente a Alfa e
Elizabeth, mas também a Frankie e Matthew. Matthew era caloroso e dava
demonstrações públicas de afeto. Menos de uma semana depois da festa no
campo de golfe, Frankie era presença constante na mesa dele no refeitório.
A mesa era sempre composta de Matthew, Alfa, Dean e Callum — e (mais frequentemente do que qualquer um realmente a quisesse por lá) Star. Na maior
parte do tempo juntavam-se a eles Elizabeth, Tristan e Steve (ambos jogadores de lacrosse e relativamente irrelevantes para este relato). Os caras faziam guerra de pãezinhos e discutiam política. E fofocavam e falavam sobre esportes e
inclinavam suas cadeiras tão para trás que parecia certo que fossem capotar —
mas isso nunca acontecia. Eles se divertiam mais do que qualquer outra pessoa
naquele lugar.
Frankie estava muito feliz.
A qualidade de Matthew que ela mais gostava era sua aparente imunidade ao constrangimento. Por exemplo, Alfa disse uma coisa tão ridícula no jantar que Matthew esguichou suco pelo nariz, molhando toda a camiseta. Qualquer outra pessoa que Frankie conhecia teria ficado vermelha, sairia gaguejando do refeitório o mais rápido possível, trocaria de camiseta imediatamente e rezaria
para que ninguém nunca mais falasse sobre o espirro de suco de maçã
novamente.Mas Matthew ficou de pé, ergueu os braços, vitorioso, e proclamou a si
mesmo o ser humano mais nojento da Alabaster, desafiando qualquer um a
provar o contrário. “Cheguem mais, venham todos. Aceitem o desafio. Veja se você é capaz de superar o Esguicho de Suco de Maçã do Livingston! Duvidamos seriamente que este nível supremo de nojeira possa ser superado, mas convidamos todos a tentar, e os apoiaremos em seus esforços.”
Dean tentou fazer uma montanha rosa de ketchup e purê de batatas, e depois lambê-la com sua língua repugnantemente comprida — mas, de acordo com
uma votação, isso não foi páreo para o ESML. Alfa fez um som de peido com a
axila, o que também não estava nem perto de ser nojento o suficiente.
— A minha decência em público me impede de ser um desafiante de
verdade — ele disse. — Não estou reconhecendo a derrota. Sou educado demais
para realizar atos de nojeira pesada enquanto calouros inocentes tentam comer
sua carne misteriosa.
Callum alegou que não tinha esse tipo de constrangimento, começou a colocar
todos os seus croutons dentro do suco de laranja e em seguida esvaziou o copo.
— Isso está mais para autopunição do que para nojeira — argumentou
Matthew. — A pessoa que você está deixando enojada é você mesmo. E, você
tem de admitir, essa estratégia é notadamente fraca.
Callum reconheceu a derrota, e eles se levantaram para limpar as bandejas.
Matthew pôs a mão na base das costas de Frankie. Ela jamais teria imaginado
que se sentiria atraída por um garoto que tinha acabado de esguichar suco pelo
nariz, mas ela estava.
Mais tarde, entretanto, ela não pôde deixar de perceber que, das cinco pessoas que estavam na mesa (incluindo Matthew), ela era a única que ninguém
esperava que fizesse algo nojento.
E ela também não tinha se oferecido.
À medida que as semanas foram passando, Frankie começou a perceber que,
apesar de Matthew acolher a entrada de outras pessoas em seu mundo de forma
surpreendentemente calorosa, não ocorria a ele entrar no mundo de mais
ninguém. Ela teve de apresentá-lo a Trish três vezes antes que ele começasse a
reconhecê-la sozinho, e quase nunca ia ao dormitório de Frankie. Se ele queria
vê-la, ligava e pedia que ela saísse para encontrá-lo.
Ele não conhecia nenhum amigo de Frankie do Clube de Debates, nem os
colegas do segundo ano com quem ela convivia. Ele não tinha curiosidade sobre
sua família. Ele esperava que ela se tornasse parte de sua vida, mas não queria
ser parte da vida dela.
Muitas garotas não percebem quando estão nessa situação. Elas ficam tão
focadas em seus namorados que esquecem que tinham uma vida antes do
relacionamento, de modo que não se incomodam se os namorados não prestam
atenção.
Frankie tinha percebido — mas não tinha certeza se ligava ou não. Ela nunca
tinha se sentido muito próxima das pessoas de quem tinha ficado amiga no
primeiro ano. Ela gostava muito da Trish, mas Trish estava envolvida com Artie.
E Frankie não apenas adorava Matthew — ela adorava o mundo dele. Ele e seus
amigos pareciam… melhores do que ela e os amigos dela.
Não por causa do dinheiro.
Não por causa da popularidade.
Roupas caras e posição social não tinham muito efeito em Frankie. Mas era o
dinheiro e a popularidade que tornavam a vida de Matthew, Dean, Alfa e Callum
extremamente fácil. Eles não precisavam impressionar ninguém e, portanto,
eram notavelmente livres de arrogância, ansiedade e comportamentos
aspiracionais cansativos, como competir por notas ou ficar julgando as roupas
uns dos outros. Eles não tinham medo de burlar as regras, pois as consequências
raramente se aplicavam a eles. Eles eram livres. E eram tolos. Mas estavam
seguros.
Frankie e Matthew estavam saindo havia duas semanas quando ele a trocou
por Alfa pela primeira vez. Eles estavam caminhando juntos depois de jantar,
dando uma volta perto da lagoa só para estarem num lugar bonito — do jeito que
as pessoas fazem quando começam a namorar — quando o telefone de Matthew
tocou.
Em vez de desligá-lo, como tinha feito nas duas primeiras semanas do relacionamento, Matthew o abriu — E aí, mano — ele disse, e então ficou ouvindo por alguns minutos. Frankie
conseguia escutar o tom de voz grave e rouco de Alfa do outro lado da linha. —
Preciso ir — Matthew disse, desligando o celular e beijando Frankie na bochecha
três vezes para mostrar que ainda era louco por ela. — O pessoal combinou de
estudar cálculo. Viajei, esqueci.
E ele se foi.
Ela ficou parada na beira da lagoa, vendo o sol se pôr, sozinha.
A segunda e a terceira vezes foram iguais. Alfa ligou e fez alguma exigência
— e Matthew desapareceu. Sempre era alguma coisa que Frankie não podia
contra-argumentar ou pedir para ir junto: um grupo de estudo de quartanistas, um
encontro do jornal, arrecadação de dinheiro para o time de futebol. Mas era
sempre o Alfa quem ligava, e Frankie não era boba.
Ele estava marcando seu território.
Matthew.
Mais frequentemente ainda, Alfa e os garotos vinham ao encontro de
Matthew — tanto que às vezes Frankie tinha a impressão de que estava saindo
com todos eles de uma só vez. Ela e Matthew iam estudar na biblioteca ou
estavam caminhando em direção ao refeitório para jantar, e os manos
apareciam correndo, rindo e se empurrando, barulhentos e alegres. Tristan
segurava Frankie e a rodopiava (ele era um cara grande, o voga da equipe de
remo), e Callum fazia um questionário sobre as garotas do segundo ano que
achava atraentes. Ou então Alfa se enfiava entre ela e Matthew, enlaçando cada
um com um braço enquanto caminhavam, deixando Frankie desconcertada com
a firmeza com que a pegava pela cintura. O que quer que ela e Matthew
estivessem conversando seria deixado de lado em favor do que quer que Alfa
quisesse conversar.
Uma vez, Matthew, Alfa e Steve — voltando de um jogo de futebol — viram
Frankie a caminho da piscina, onde se encontraria com Trish. Eles a seguiram e
fizeram questão de entrar na piscina usando os calções do uniforme, empurrando
uns aos outros na parte mais funda, dando bombas do trampolim.
Trish atravessou a piscina batendo pernas com Frankie por vinte minutos, e
em seguida disse que ia sair para tomar uma ducha. Frankie continuou lá, e
deixou a parte mais rasa da piscina em direção ao fundo, onde estavam os
garotos.
Ela não se importava com eles ali. Não agora; nem nunca, na verdade.
Sim, ela queria ficar a sós com Matthew, mas adorava o jeito que o mundo se
acendia quando os garotos estavam por perto — adorava o jeito que eles tiravam
sarro uns dos outros, provocavam-se e conversavam efusivamente entre si.Como nas melhores famílias.Geralmente, Matthew pegava a mão dela quando eles apareciam. Ou tocava
seu pé por baixo da mesa, para que ela soubesse que ele continuava pensando
nela. E os manos ficavam misturando suco com refrigerante, ou tentando
memorizar datas para as aulas de história, ou desenhando coisas ridículas em
seus cadernos, ou fazendo aviões de papel ornamentais em vez de estudar — e Frankie era parte daquilo. Ou quase.
![](https://img.wattpad.com/cover/102332064-288-k213536.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Histórico Infame de Frankie Landau-Banks (E.Lockhart)
Teen Fiction***** Aos catorze anos, Frankie Landau-Banks era uma garota comum, um pouco nerd, que frequentava a Alabaster, uma escola tradicional e altamente competitiva. Mas tudo muda durante as férias. Na volta às aulas para o segundo ano, o corpo de Frank...