Seis

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"O amor é um convite a amar. Não importa que seja aceito o convite para que ele exista "
- Afrânio Peixoto







Usei a mão que estava no peito dele e fiz uma leve pressão, não era forte o suficiente para afasta-lo, mas ele entendeu e interrompeu o beijo tomando uma pequena distância.

- O que eu estou fazendo? - sussurrei para mim mesma.

- Beijando seu noivo - seu tom era sério, procurei vestígios de ironia em seu rosto e só encontrei seu olhar divagando. - O que você espera desse casamento? - ele virou para mim e prendi meu olhar no seu. - já tinha notado que ele era objetivo, mas não estava preparada para a pergunta.

- Só queria não fazer parte de um contrato de poder, como uma moeda de troca, é ruim demais saber que existe realidade diferente lá fora e querer viver isso? - agora era o meu olhar que divagava pelas flores que dançavam com o vento.

Jahi segurou meu queixo levemente aproximando meu rosto do dele.

- Não, não é ruim. Contudo, Existem realidades piores que a nossa. Infelizmente ninguém pode escolher a condição em que nasce, mas pode escolher o que aquilo vai se tornar, sofrimento ou felicidade. Não podemos fugir da obrigação do casamento, porém não precisamos fazer disso um problema.

Seus dedos acariciavam meu rosto e eu não sabia o que responder.

- Vamos termimar nosso café. - disse depois de um tempo.

Sem insistir mais, Jahi passou a servir suco em copos plásticos, comemos e conversamos um pouco de cada assunto.

Descobri que a ideia de casamento também não lhe agradava no início, também quem gostaria de noivar aos onze anos com alguém que ao menos havia nascido?

Ele estava a frente dos negócios da família e adorava trabalhar. Tinha uma visão empreendedora e futurista, não quis admitir mas gostei do que conheci dele.

Sem saber exatamente que horas eram, recolhemos as coisas e levamos tudo para dentro. Nos despedimos normalmente como dois amigos sorridentes. Ele seguiu para o escritório se juntando ao meu pai e o pai dele para tratar de negócios.

Eu me juntei a minha mãe e minha futura sogra para tratar de todas as chatices finais de meu aniversário. Um sorriso estranho e novo brincava nos meus lábios mesmo seu deseja-lo ali.

Sofrimento ou felicidade? Poderia mesmo escolher e não fazer seu casamento ser um problema. Joguei as palavras para o fundo da mente. A semana mal tinha corrido e já estava a pensar em possibilidades diferentes.

O que esse homem tinha afinal?  Não posso desistir, não posso ceder.

§§

Abri os olhos sem acreditar que a semana já havia passado, e hoje o dia não seria bom, como eu sabia? Minha mãe me chacoalhava freneticamente alegando ser o segundo dia mais importante da Minha vida.

Levantei sem ter certeza se realmente havia acordado. Os dias correram extremamente rápidos e suas horas foram gastas entre os detalhes do meu aniversário e conhecer meu noivo.

Jahi e eu passamos algum tempo juntos e não posso dizer que não foi agradável. Algumas tardes assistimos filmes na sala de Tv, outras passeamos pelo jardim, ele até havia me mostrado algumas coisas referente a empresa.

Saber que ele não me via como um enfeite sem utilidade foi um grande alívio e quebrou um pouco de toda armadura que ergui, achando que ele seria mais um marido prepotente e abusivo.

Me senti a vontade perto dele, Jahi se esforçou ao máximo mas cumpriu sua promessa, nunca passou dos meus limites e respeitava Minha posição. Não voltamos a nos beijar, apesar de mamãe sempre criar brechas para tal ato, meu pai sempre estava a espreita.

Não que Jahi não desejasse, a cada segundo suas intenções ficavam mais claras em seu olhar, olhar que ganhou o poder de fazer meu estômago se contrair ao vê-lo.

Me dirigi ao banheiro na intenção de começar meu mais esperado dia com um belo banho e mais uma vez mamãe interrompeu minha felicidade momentânea apressando-me no chuveiro alegando ter ainda muitas coisas a fazer.

Achei aquilo impossível, a semana já tinha sido consumida o que teria mais a fazer se não descansar e esperar os convidados chegar?

Tive a prova nas horas seguintes onde quase todo dia foi preenchido por tarefas como: fazer cabelo, unhas, pele, maquiagem e todas essas coisas. Não me lembrava do baile de debutantes ser esta correria. 

Assim que o céu começou a mudar de cor anunciando o fim do dia e inicio da noite, Haiza adentrou seu quarto com um enorme embrulho nas mãos. Ela estava vestida de forma elegante apesar de discreta, essa noite não iria trabalhar. uma equipe contrata cuidava da comida e eu teria minha mãe para me ajudar a suportar todas aquelas horas em que precisaria congelar um sorriso no rosto.

- O que é isto - perguntei voltando a atenção ao embrulho.

- E o que mais seria? É o seu vestido - ela tinha um brilho enorme nos olhos e sorria feito o coringa, até parecia que era grande coisa.

- Ande, vamos logo vou ajuda-la a vestir, sua mãe já está a receber os convidados. - ela esticou o embrulho na cama e começou a abrir o zíper.

Não podia negar que o vestido realmente era lindo, possuía um tom rosa no corpete que se misturava aos poucos ao alaranjado conforme a saia do vestido se abria em uma roda simétrica e não muito grande, pequenas pedrarias cobriam a peça como pontos de luz, sua concentração era da barra do vestido para o centro diminuindo a quantidade e causando uma imagem estrelada.

- É perfeito. você está linda! - Ouvi a voz de Haiza que admirava meu reflexo no espelho por cima do meu ombro após vestir a peça.

ela segurou meu pulso e me puxou em direção a porta.

- Se o Senhor Dahab já morre de amores por ti, imagina como ficará ao vê-la assim tão bela. - ela falava extasiada enquanto continuava a guiar rumo a escadaria.

- Como? morre de amores? - me senti nervosa com o comentário.

- Ísis, só um tolo não vê o olhar dele para você, ele te olha como um homem apaixonado. - Haiza suspirava como quem estava a ler um conto de romance.

O nervosismo virou desespero e eu não sabia o que fazer, Haiza trocou de lugar comigo me deixando a frente e se postou atrás fazendo um leve pressão em minha cintura, cambaleei dois passos e estava diante da escadaria a qual deveria descer sozinha.

lá em baixo notei um acúmulo de pessoas que voltaram seus olhos para mim quando a luz do imenso salão baixou um pouco. Meu pai estava ao pé da escada e do outro lado estava Jahi.

Encontrei meus olhos nos dele. Apaixonado? Isso podia ser delírios romantizados de Haiza. Não era pra estar acontecendo ou era? afinal, essa era a intenção fazê-lo se apaixonar e não me apaixonar primeiro.

Tudo que eu queria no momento era distancia dali, e como uma boa contradição Jahi adiantou-se dois lances a frente de meu pai e estendeu a mão para mim.

formigas dançaram na minha barriga, lentamente forcei os passos pelo primeiro degraus deslizando a mão pelo corrimão, não para dar charme, mas por que realmente precisava me segurar em algo.

A tarefa já não estava fácil e tudo piorou quando de algum lugar a voz de Hamadi soou clara e suave:

- Assim como o entardecer deixa sua vez para se tornar uma noite esplendorosa, neste momento Ísis deixa de ser a luz desta casa para se tornar a estrela da própria família, reafirmando o compromisso de noivado com Khal Jahi da família Dahab.

Boa mamãe! esbanjando sutileza como sempre, agora eu só precisava de um lugar pra me esconder.

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