1. Retorno

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Estava escuro em meu quarto, mas a janela aberta ainda me permitia ver um pouco de claridade que emanava dos postes de luz da rua.

Estava sendo uma noite ruim, eu cochilava por alguns minutos, mas acabava acordando, minha cabeça até doía um pouco. Aquela estava sendo minha primeira noite de volta a minha antiga casa no Rio de Janeiro depois de 3 anos. Minha família (meu pai, minha mãe e eu) passamos esses anos morando em São Paulo, por causa do trabalho do meu pai. Foram anos bons pra mim, eu já estava acostumada com a rotina de lá, portanto nem imaginava como seria voltar, nem sequer passava pela minha cabeça que voltaria um dia. Agora, por mais que eu também gostasse de morar aqui a anos atrás, não tinha tanta certeza se conseguiria gostar agora. Quando fui morar em São Paulo, deixei para trás o costume de morar no Rio, alguns conhecidos e meu melhor amigo, um cara chamado Thiago que costumava ser como um irmão pra mim. E agora, quando voltei, deixei em São Paulo um namorado (agora ex-namorado), uma ótima escola e várias amizades que construí com o tempo.

De certa forma, essa volta tinha sido mais dolorida do que a partida.

Durante a noite e os meus cochilos, sonhei que estava parada no meio de uma rua que não conhecia e começava a chover muito forte, formando um riacho e encharcando por completo as roupas que eu estava usando, eu olhava em volta procurando por alguém que não estava ali e que eu nem sabia quem era, e por uma razão desconhecida eu simplesmente não ia para lugar nenhum, só ficava ali, toda molhada procurando por nada, até porque não tinha nada para procurar.

Meus sonhos estavam cada vez mais estranhos, pensei. Cada vez mais combinam comigo.

***

Quando acordei novamente, já estava claro e o sol invadia a janela de meu antigo e agora novo quarto, queimando meu rosto e me impedindo de abrir os olhos, virei para o lado, afastando o cobertor lilás que me tapava percebendo como ele era desnecessário e que escorria suor pelo meu pescoço, braços e pernas. Levantei cambaleando, demorei para raciocinar que o banheiro desta casa ficava na frente de meu quarto, mas com sorte, consegui chegar até ele sem cair ou tropeçar em nada.

- Alice? - ouvi a voz de minha mãe, Débora, me chamar na porta do banheiro.

- Bom dia mãe - falei do lado de dentro, enquanto escovava os dentes.

- Bom dia, querida - eu podia ouvir o seu sorriso enquanto ela falava. - Dormiu bem?

- Não - terminei de escovar os dentes e abri a porta. Confirmei o seu sorriso radiante. - Não dormi muito bem, não.

Ela balançou a cabeça.

- Que pena, filha. Mas tenho certeza que a próxima noite será melhor! - Ela brincou com meus cabelos castanhos e ondulados e fez carinho em minha cabeça. - Tenho uma surpresa pra ti! Uma amiga minha, daqui mesmo, não sei se lembra dela ... Enfim, é a Luciane. - Ela não me deu tempo para falar que lembrava dela sim. - A filha dela, Camila, tem a sua idade e vai passar uns dias aqui em casa com a gente, já que a mãe vai viajar.

- Ela tem uma filha? - perguntei um pouco surpresa. Pelo o que eu lembrava, essa amiga da minha mãe estava sempre viajando, parecia ter uma alma livre, não imaginava que ela teria uma filha. Fora que não me lembro das vezes em que a vi, ela ter mencionado isso.

Mas bem, já faz bastante tempo mesmo.

- Tem sim. E ela vai chegar hoje até a hora do almoço, você precisa se trocar - ela disse olhando para os meus trapos velhos de dormir.

Revirei os olhos, mas tive que concordar. Voltei ao meu quarto, procurei por uma roupa na mala que ainda não tinha desfeito, mas estava tudo bagunçado e mal pude enxergar o que realmente queria. Mesmo assim, me troquei, peguei meu celular e desci até a cozinha.

No Olho do FuracãoOnde histórias criam vida. Descubra agora