Não que seja inveja. Pois, penso que de todos os sentimentos mesquinhos este é o que não coabita em mim. Literalmente não vejo, nunca vi e não sei se algum dia verei graça alguma em pessoas, desinteressantes, que contam vantagem sobre artigos de luxo, viagens caras e restaurantes sofisticados. Assusta-me quando alguém chega ao pé de mim ou nalgum ambiente e fala sobre os seus títulos, o que conseguiu, o que tem, o que pode fazer por ser filho ou parente de algum endinheirado, matumbo com dinheiro ou cidadão influente, e apresenta-se como "Doutor X". Mais aturdido fico quando alguém me chama ou intitula-me de "Doutor" ou chefe. Reajo de imediato dizendo que não sou aquilo que me chamou tampouco chefe. Por favor, chama-me pelo o meu nome ou utiliza alguma forma de tratamento. Não aquelas de grande relevo! Faço questão, atiro sempre. Títulos horríficos não me tornam melhor nem já dão-me algum tipo de estatuto. Tenho em mente que não é aquilo que consumo, visto, aparento ser, que dá-me estatuto. Sei que, aquilo que espelho como gente - carácter, altruísmo, sabedoria, saber ser, amar, viver e estar, a empatia etc. -, isso sim dá-me estatuto. E vale título. Longe de serem aqueles horrendos que é o de "Doutor" ou chefe e outros mais. Nas primeiras vezes que assim fui chamado, ainda na universidade, senti uma devastadora vergonha. Foi como se fosse algum deboche que colocasse às claras tudo aquilo que reconheço não saber. Porque o que gosto mesmo é de conversar e estar com pessoas inteligíveis, frugais... SIMPLES! A simplicidade domicilia-se em mim. O tempo mudou tanta coisa em mim, entretanto, esqueceu-se de mudar a minha maneira simples de ser e estar. Apaixono-me lestamente por pessoas que falam sem medo de errar, que sabem do que falam, e falam com substância sobre este ou aquele assunto, transmitem conhecimento em cada argumento dito, que não ligam para etiquetas, para títulos, status, que fazem fofoca reversa (em invés de falarem mal de terceiros, falam bem ou elogiam ou fazem uma critica sabida e construtiva), gente que não dá a mínima para o que vesti, o que devia vestir, quem são os meus pais, onde trabalho, onde moro, que modelo de carro conduzo etc.. Tenho um abismo imensurável por gente que não dá a mínima se tiver de comer sem faca, que não se angustia com a ausência de guardanapos na mesa, que sabe dirigir-se às pessoas, saúda o segurança, o garçom, que não liga para a marca de telemóvel que estou eu a utilizar, gente que pouco entende ou não faz jus a grifes, marcas ou coisas do gênero. Quero é estar perto e/ou rodeado de gente que floresce comedimento, amor e otimismo. Gente que leva um estilo de vida longe da avareza e da arrogância do querer ter e ser mais que os outros, e do querer voluntário em consumir o que nada edifica. Falo de gente que discute livros, discute os temas mais comoventes que merecem a nossa apreciação, gente detentora e abastada de boas virtudes, bons gostos musicais e que possa me oferecer boa companhia. Gente interessante que sabe e percebe qual o real sentido da vida. Porque de ineptos e lerdos, que valorizam o supérfluo e interino, estou farto.