III

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Seria muito injusto falar de propor conversa sem ao menos permitir que os leitores conheçam quem redige as palavras. Meu nome é Lucas, tenho 22 anos e atualmente sou calouro no curso de Licenciatura em Letras. Sou de São Vicente, uma cidade localizada no litoral de SP. Não namoro. Não trabalho. A propósito, problemas nestes âmbitos foram os fatores que desencadearam na minha depressão pela segunda vez.

Dentro do período de um ano, acabei saindo do emprego, da faculdade, terminei meu relacionamento e a situação familiar se tornava cada vez mais conturbada. Pode-se dizer que foi resultado de um efeito em cascata. Permitam-me explicar isso de maneira categórica:

1- Eu trabalhava em uma empresa de comércio exterior no cargo de auxiliar de escritório. No entanto, não havia o reconhecimento (não me refiro a parte financeira). Muitas vezes me desdobrava para cumprir múltiplas tarefas na tentativa de mostrar mais serviço sem ter a certeza de poder cumpri-las — um grande erro da minha parte. Embora eu conseguisse êxito na maioria, os colegas de trabalho acabaram aproveitando-se da minha disposição, acarretando em muitos afazeres com prazos estúpidos, horas extras constantes e os feedbacks só existiam quando algo errado acontecia. Isso contribuiu para minha frustração e a sensação de nunca ser bom o bastante para ninguém.

2- Por consequência, as horas extras do trabalho comprometiam minha frequência na faculdade. Era uma graduação para tecnólogo em logística. Teoricamente, o horário de trabalho era das 8h20 até 18h12 (não me perguntem por que 12 minutos...) e a faculdade era das 19h às 22h30. Esse horário era complicado por si só de cumprir porque a distância entre ambos era razoável o bastante para a existência de trânsito e lentidão. Na prática, era muito comum eu sair do trabalho muito mais tarde do que 19h. Comecei a faltar muito e, por isso, resolvi trancar porque sabia que iria reprovar por faltas de qualquer jeito. Na frustração do momento, aproximadamente 3 meses depois, pedi demissão. Ironicamente saí no dia do meu aniversário.

3- Paralelo ao trabalho e estudo, estava dentro de um relacionamento conturbado. Eram discussões constantes, falta de companheirismo, auto-confiança e inúmeros erros que foram cometidos por ambas as partes. Os pais dela sempre se manifestaram contra o namoro (que me tratavam com grande desdém mesmo que eu tenha me mostrado cordial e respeitoso do início ao fim), impediam-a de sair e poder desfrutar de sua liberdade, comprometendo vários aspectos da vida dela, fazendo com que ela não conseguisse ser uma pessoa plena em sua felicidade e auto-confiança. Entre idas e voltas, decidi tomar a decisão definitiva de terminar.

4- A situação entre meus pais já estava se complicando à medida que o tempo passava. Comigo no ócio completo, as coisas pareciam se agravar. Brigas constantes — felizmente não a ponto de envolver  agressões físicas —, gastos desenfreados de dinheiro para querer se vingar e eu era "antagonizado" pelos problemas que aconteciam pelo fato de ser dependente, financeiramente falando.   Não bastasse tudo isso, foram surgindo cobranças frequentes para conquistar um emprego e/ou passar em concurso público para buscar a tal da "estabilidade" que vivemos sendo doutrinados (assunto de outro âmbito) e minha sensação de inutilidade foi crescendo cada vez mais.

Demorei para me dar conta, mas em um dado momento, eu já estava com depressão, atribuindo todos os males a mim, me culpando e julgando por decisões erradas e escolhas não tomadas. Muito provavelmente eu poderia ter vencido essa batalha contra meu próprio "eu" de maneira mais rápida e eficaz se tivesse ido a um psicólogo. Superei as adversidades que surgiram por PURA sorte.

Por que eu continuei seguindo em frente mesmo não tendo perspectiva de outras alternativas? Por que eu não desisti antes? Por que eu não vivi minha vida na base do "jeitinho brasileiro"? Todo mundo faz um monte de coisa errada, tem gente que literalmente vive até o último segundo da sua vida fazendo coisas inescrupulosas e não recebe uma punição sequer. Tem muita gente que vive na base da hipocrisia e consegue lidar e manipular as pessoas a seu bel-prazer, tendo sucesso em um bocado de empreitadas.

Por que não fui desse jeito, tampouco sou assim? A única resposta que eu encontrei para essa e todas as outras perguntas feitas no parágrafo anterior foi apenas essa: "Porque eu posso. Porque eu estou aqui e quero ser diferente". É só isso que tenho para dizer a vocês. Agradeço de coração a quem leu tudo e se permitiu a subtração de seu precioso tempo conhecendo alguém que em nada difere de cada um de vocês, mas que ainda assim, quer e pode fazer a diferença do seu próprio jeito. Contraditório? Sim, exatamente como a vida é: Uma perfeita contradição.

Um grande abraço a todos.

Depressão - A Nênia da AlmaOnde histórias criam vida. Descubra agora