A música de hoje é Bruises, do Lewis Capaldi. Boa leitura.
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A coisa com os sentimentos é que... Você de fato os sente.
Eu amava as mulheres, em todos os lugares meus olhos sempre davam um jeito de se apaixonarem por alguma ou algumas delas. Era involuntário. E ainda que houvesse uma a politica, a qual eu realmente respeitava e levava bem a sério, sentimentos maiores por vezes vinham me visitar. Eu não estava em posição alguma de sentir ciúme ou fazer uma cena digna de um filme francês dramático por ver Addison caminhar com suas belas pernas até o carro de Theodora Altman, que inclusive é uma loira de tirar o folego.
A insistência às vezes me deixava com os sentidos turvos. Montgomery era nova na cidade, e pela primeira vez meu vizinho de porta não era alguém conservador dos bons costumes que diria algo sobre minha música alta, minha vida boêmia e o cheiro de maconha que constantemente exalava do meu apartamento. Não, longe disso. Minha vizinha era alta, bem alta... Com longas pernas maravilhosas, braços esculpidos a mãos, um cabelo ruivo sedoso e muito cheiroso. Seu maxilar era bem delineado, cheio de ângulos nos quais eu me perderia sem pensar duas vezes. Suas mãos eram delicadas, até mesmo seu toque era sutil. E além de tudo, Addison de certa forma compactuava com meu modo estranho de viver ainda que de um jeito torto e um tanto moralista. Nós éramos água e óleo, e ainda que química provasse por a+b que não podíamos nos misturar, eu estava me misturando a ela de uma maneira rápida demais.
Eu esperei.
Esperei que ela se virasse e corresse para os meus braços. E ainda sim eu queria atestar para mim mesma o quanto não possuía sentimentos por ela.
Era novo. Como eu possivelmente poderia saber que aquilo era um sentimento bom ou ruim? Eu estava na merda, na verdade, estava a níveis abaixo de uma profunda e densa merda.
Arizona era um tipo de ser humano frio que havia me apresentado um relacionamento ao qual eu já estava mais do que acostumada. Era o tipo de relacionamento que Meredith Grey sempre oferecia a suas mulheres e agora eu me sentia tão para baixo por saber o que eu causava em outras pessoas. Não que tal coisa fosse mudar minha postura quanto à politica de não relacionamentos duradouros, eu ainda detestava a ideia.
Addison entrou no carro e a vi partir para sabe lá Deus onde, então eu fiz o que sempre fazia em casos de surtos repentinos: eu fumei um cigarro.
Olho meu carro e dou de ombros, eu não queria dirigir, geralmente o fazia quando estava irritada com algo, mas hoje eu só queria andar um pouco. Não estava frustrada com Addison, ou com Arizona, ou até mesmo com o fato de que meus cigarros estavam para acabar e meu dinheiro talvez não desse para comprar outro maço. Eu estava frustrada com a vida e com todos os caminhos que haviam me feito chegar até aquele fatídico destino.
Você acaba por se surpreender com a quantidade de coisas minúsculas que podem fazer com que você queira caminhar sem destino, sentar em uma calçada qualquer e querer chorar sem motivo. Eu estava cheia, cheia de mim e da vida, e bem sabia que reclamar ou chorar como eu estava fazendo agora não resolvia merda alguma. Às vezes é necessário chorar e se fazer sensível, tirar as mil camadas que você construiu acima de si e simplesmente mandar tudo a merda, chorar como se não houvesse amanhã e depois talvez tomar um porre como um bom fracassado.
É incontrolável, e novamente não falo apenas de relacionamentos. Estou discorrendo a respeito da vida toda enquanto caminho e por vezes olho o céu com sol quente demais sobre minha cabeça. A brisa que bate contra meu rosto é como um chicote, em alta temperatura, me cobrando um tanto mais de força que eu já não queria ter. Eu estava fadada a momentos como aqueles, sempre sabia que eles iriam chegar uma hora ou outra, de inúmeras maneiras diferentes, não é atoa que a escolha de uma estranha me fez perder as estribeiras.
O que faço, como vivo e minhas escolhas quanto as questões da vida pouco interessam os outros, pelo menos é o que eu penso na teoria, mas os seres humanos em minha vida sempre me mostram ao contrário. Seres humanos querem o controle, de tudo e todos, mesmo que às vezes de maneira inconsciente. Você surta quando perde o controle, quando perde um ônibus, quando toca a música errada em uma hora errada ou quando alguém simplesmente não corresponde com o sentimento que você queria que ela respondesse. Você perde o controle!
A coisa com a vida é que: ela sempre vai te fazer perder o controle, sempre vai te dar a escolha de ir pelo caminho errado e cá entre nós, a gente ama escolher os caminhos errados por livre e espontânea vontade, porque podemos escolher, porque podemos controlar o errado. Ou pelo menos pensamos que podemos controlar.
Estou caminhando há alguns bons minutos e simplesmente paro de me importar com o calor, com o suor que estou experienciando e simplesmente paro em uma rua sem movimento. Me sento na calçada, na sombra porque não sou de ferro e tão pouco quero ser. Há dois cigarros. Duas chances de me acalmar que sei que nada adiantara no estado em que estou. Tomo um entre os dedos e com a outra mão retiro o isqueiro do bolso. Uma. Duas. Três tentativas. O isqueiro não acende, então tento mais algumas vezes sem sucesso algum.
O objeto é tacado no asfalto. Ok, eu estava entendendo que hoje era um dia péssimo.
Fico ali pelo que me parecem horas, não estou a fim de olhar o relógio e constatar minha súbita falta do que fazer. Eu tinha trabalho, tinha coisas para fazer... Eu ainda tinha uma vida e isso me saturava até os ossos.
Estico minhas pernas que doem pelo tanto de tempo que as deixei dobradas, e então as cruzo, apoiando-me em minhas mãos atrás do meu corpo com meus braços esticados. Eu estava em uma cidade gigantesca e ainda sim estava em silencio, sentindo cheiro de cidade enquanto fitava um pássaro em uma arvore a minha frente.
Após esvaziar minha mente, me levanto e volto ao carro. Eu ainda precisava ir para casa, ou não, dependia do quanto de gasolina o Porsche ainda possuía. Adentro o carro velho e o ligo, constatando que meu tanque ainda está cheio o suficiente para que eu dê algumas voltas por Paris antes de decidir se deveria ou não me tacar de uma ponte.
Ligo o som do carro e deixo que a playlist no pendrive toque sem minha intervenção pela primeira vez. Há músicas que você simplesmente deixa ali, ainda que não escute e pule as mesmas todas as vezes que escuta a playlist, e você nem sabe o porquê exatamente faz isso. Costume.
O universo parece entender bem quando sua tristeza resolve dar as caras de maneira súbita por inúmeros motivos bestas. As músicas eram tristes e eu estava pensando seriamente em jogar meu carro contra um poste qualquer. É aquela ideia que às vezes passa na cabeça de alguns fodidos da cabeça: alguém sentiria de fato minha falta?
Estou dirigindo de maneira tão despreocupada que piso no freio sem muito pensar. Meu corpo vai para frente e volta, batendo contra o banco. Quase atropelei algo. Alguém. O corpo a minha frente estava encolhido, se preparando para um baque. Seus olhos se abrem e ela me olha por entre os fios de cabelo que estão em seu rosto.
—Se machucou? —Abro a porta do carro sem me preocupar com o trânsito atrás de mim e saio dali, indo de encontro com a mulher que por pouco não havia sofrido algo mais grave.
—Eu... Você precisa seriamente olhar por onde anda. —Sorrio baixando o olhar, eu deveria olhar por todos os caminhos por onde ando trilhando na verdade. —Eu estou bem, não precisa se preocupar, eu... —Nossos olhos se encontram e por uma fração de segundo posso ter certeza de que ela está tão perdida quanto eu.
—Meredith Grey. —Ignoro o que ela diz e estendo minha mão, esperando que ela a aperte.
Seus olhos vão da minha mão aos meus olhos. Ela dá um meio sorriso convencido e finalmente inicia o aperto de mão.
—Andy. —Ela balança a mão e então nosso aperto de mão se finda. —Andy Herrera. —Sorrio e tombo minha cabeça para o lado.
—Um drink, Herrera, me deixe pagar um drink para você, assim eu te dou um pedido de desculpa mais válido.
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Aconteceu em Paris
FanfictionEra verão e as noites em Paris estavam regadas de amor, ainda que Addison não encontrasse um par de olhos que fizesse seu coração sair pela boca. Era verão e ela estava acertando sua vida na cidade das luzes de uma maneira abrupta. Paris lhe guardav...