Capitulo 7 - O conselho dos doze

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Mesmo tendo sido uma das primeiras a terminar, fui a última a entregar. Ainda me assusta a possibilidade de que os garranchos formados pela minha letra assustada e imatura sejam incompreensíveis. Qualquer que seja o corretor, não deixará um segundo olhar em um poema sem nome. Meu poema seria esquecido na história, isto é, se ao menos me permitirem uma correção justa como deve ser, o que desconfio.
Me levanto da escada. Já faz duas horas desde que a prova terminou e todos já foram embora, exceto um menino de cabelo comprido que vi entrar na sala ao lado. Desde o fim da prova, ele está sentado ao meu lado na escada sem dizer uma única palavra ou se mover. Ele aparentar estar apenas observando as doze colunas que se erguiam nos jardins a nossa frente. No entanto, sem sustentar qualquer estrutura, elas pareciam erguer o alto de firmamento, uma visão inédita.
Mesmo no alto do segundo morro, perto da fonte do rio, jamais pude ver um lugar tão calmo. No auge das 12 horas o sol não esquentava, apenas queimava. Então optamos por permanecer debaixo da estrutura varandeira que se prolongava nos primeiros três dos quatro lances de escada que levavam a entrada da escola.
Quando já estava no mais baixo da escada o silêncio tão mórbido foi quebrado. Ouvi uma voz porosa e sutil que era ao mesmo tempo baixa e intensa indistintamente, uma combinação gentil e estranha. Minha careta diante de sua presença o fez repetir a pergunta: "Quer uma romã?" Meu rosto duvidoso o fez desmanchar as feições quase aristocráticas em um único segundo. O menino era intrigante, fazia uso de um grande sorriso e, sem motivos, decidi seguir o menino aparentemente buscando a proposta de comida de um garoto inofensivo que após infindáveis voltas atravessou um arbusto e em um pulo, percebo que estamos dentro de um grande pomar, maior que os das grandes colheitas.
Meu rosto se abriu em uma surpresa clara e me deixando com pouco da masculinidade fechada que eu tentava imitar. Tive medo que isso acabasse com meu disfarce, mas ao ver a mesma expressão em seu rosto, me acalmei. Praticamente caindo na grama úmida e macia na qual pisava sem notar durante todo o tempo. Todas as estradas aqui são feitas em terra batida, seguindo esee princípio, este não é um lugar para a apreciação geral.
Me desfiz dos devaneios ao notar o garoto a minha frente me estendendo uma fruta grande e verde que ele identificou como romã. Eu não sabia como comer ou abrir, mas com um olhar rasteiro, observei que poderia ser aberta com as mãos, da mesma maneira que se faz com uma tangerina.
Sob o olhar atento do meu colega de quem agora me perguntava se seria muita intrusão saber o nome, segurei a fruta com uma das mãos e a abri quase ao meio. Decidi internamente que, talvez, essa pergunta devesse ter sido feita por algum dos dois antes de andarmos em círculos como desvairados. "Qual é o vosso nome?" questionei afastando a cabeça do fruto doce e manchoso que tinha entre as mãos para encarar olhos grandes da cor do melaço.
Meu colega apertou as mãos respondendo baixinho "Camille, Camille Le'front" o garoto me olhou temeroso como se tal nome me devesse qualquer maior explicação. Minha falta de reação parece ter amortizado e aterrorizado o garoto ao meu lado. Tentei devolver com meu próprio nome "Meu nome e Lourdes, tenho catorze anos... acho que não tenho sobrenome para te falar, mas sou um dompteur, aqui na cidade vocês me chamariam de Lourdes Dompteur, acredito".
Senti uma massa de ar se mover ao meu lado, o garoto energético estava me puxando para longe da minha romã que acabou abandonada no pasto ao meu lado. Sorri em resignação, esse garoto maluco tenta levar-me ao mal caminho. Tal como chegamos, entre muitas voltas sem fim, Camille me levou ao próximo local que aparentava ser tão atraente como o último: um curral.
"Eu não sou um dompteur, mas cuido de algumas cabras leiteiras e de dois cavalos, um particularmente teimoso, Níger, você é órfão, não? Se puderes domar e trabalhar, terá como se manter na escola!" Observei que ele partia do pressuposto que eu iria passar. Gemi temerosa, tinha medo de não conseguir e acabar decepcionando o menino. "Fale com Kilim, ele é o mais calmo do conselho dos doze. Tenho certeza que ele te dará ouvidos".
Minha curiosidade voou longe e foi capturada pelo menino. "Conselho dos doze? De que se trata?". O menino me olhou em descrença e, respondeu tão rapidamente, quase o bastante para não reconhecer as palavras de forma individual. "Os doze são os que ocupam os cargos de historiadores aqui, eles corrigirão sua poesia. Não é por isso que ainda está aqui? Para esperar o resultado?".
Talvez eu tenha feito uma careta ou foi apenas a descrença que elevou meu amigo as gargalhadas que durou alguns minutos e me renderam uma carranca involuntária. "O resultado sairá em dois dias. Jorge, o homem com quem veio, voltará amanhã à cidade e apenas retornará em uma semana. Não podes esperar por tanto tempo, ainda mais sendo órfão. Então eu decidi ficar por perto para te mostrar onde fica a comida. Afinal, não podia ficar o tempo todo com fome, não é?" explicou em uma pergunta professoral que deixava como resposta apenas a afirmativa.
Sorri para o menino gentil que já levantava de novo sem dar me qualquer tempo. Na vida que tenho, este garoto representa a mudança que por si só já muda e muda nas formas de mudar. Agora espero que me leve a um bom lugar, mas se assim não for buscar um. Se há rios nas profundezas do mar eu posso sim desafiar um mar que não me permite chegar ao golfo. Rompení é um golfo ainda mais atraente porque agora seu nome é mudança, changement, como diria Camille, o francês.

A Aprendiz - Lourdes the Rosemary Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora