Capítulo 1 - Azul

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Mal acreditou que tinha acabado de pôr os pés em casa novamente.

Lica e Marta haviam acabado de chegar a São Paulo e estavam completamente exaustas da viagem. Por mais que tenha passado três anos perambulando pela Europa com sua mãe, Lica sentia falta de sua casa no Brasil. Mas não se engane, perambular no dicionário de Heloísa Gutierrez significa muito mais do que apenas andar por aí, como muita gente diria. Afinal, visitar vários países distintos de um continente nem tão familiar e estudar em algumas das melhores escolas e alguns dos melhores cursos de desenho que o dinheiro pode pagar não é bem o que se imagina para férias prolongadas.

Novamente o termo "Férias prolongadas" também podia ser uma maneira mais amena de Lica dizer: Meus pais se separaram e para curar a dor eu e minha mãe resolvemos passar três anos sem precisar olhar para a cara de Edgar Gutierrez.

Pois é, férias não faziam mal a ninguém.

Não faziam, mas deixavam uma saudade grande das coisas que deixaram para trás. Lica sentia falta de poder andar por São Paulo e da Avenida Paulista em suas várias saídas com seus amigos - aliás, suas amizades brasileiras também estavam em tal lista de coisas que sentia saudade - principalmente de Cristina Yamada, também conhecida como Tina, sua melhor amiga desde que se conhecia por gente. Também sentia falta de Leide, a empregada que trabalhava em sua casa e de seu bolo de chocolate com cobertura de brigadeiro que sempre comia quando se sentia triste ou acontecia algum evento especial, portanto, voltas de viagens estavam inclusas.

- LEIDE! – diz a menina correndo para abraçar a mulher, assim que abriu a porta do apartamento localizado na Vila Madalena, e a encontrou às esperando de braços abertos na sala.

- Meu Deus, menina, como você conseguiu crescer tanto? – Leide sorria abraçada a menor enquanto Marta empurrava algumas das milhões de malas para dentro de casa. – Que saudade que eu estava sentido. Sua e de você, dona Marta.

Leide sorri para a patroa e as duas se abraçaram emocionadas. Apesar da relação profissional, a pessoalidade das duas já ultrapassava a questão de afeto. Elas se consideravam parte da família uma da outra.

- Também senti muito sua falta, Leide. – Marta sorri para a mulher. – Aliás, tenho que te mostras as lembrancinhas que compramos pra você quando estávamos em Paris. – Logo as três se puseram a colocar as bagagens dentro do apartamento para poderem comer e botar o papo em dia em paz.


Depois de comerem degustando cada pedaço do famoso bolo de chocolate, cada uma foi para seu canto começar a desfazer as malas. Lica estava na metade da segunda quando escuta algumas batidas na porta que logo foi aberta anunciando a presença de Marta no cômodo. A menina conseguia perceber que a mãe estava um tanto nervosa com o assunto que queria tratar e Lica apenas confirmou suas suspeitas quando a mais velha lhe perguntou:

- Está tudo certo para voltar às aulas amanhã?


Lica havia combinado com a mãe que assim que voltasse para o Brasil também retomaria as aulas do Colégio Grupo e, consequentemente, veria pela primeira vez em três anos o dono e diretor de tal escola, ninguém mais ninguém menos que seu pai, Edgar Gutierrez.

- Claro. – Lica foi breve antes de terminar de dobrar uma das pilhas de roupas em cima de sua cama e ir para seu armário arrumá-las lá. Marta seguiu a filha e se encostou no batente da porta entre o quarto e o cômodo com o armário.

- Filha, eu sei que você não quer falar sobre isso, mas não dá mais pra adiar. Você vai encontrar com ele amanhã!

- Você quer que eu fale o que, mãe? – Lica se virou para Marta claramente irritada. – Eu encontrei meu pai almoçando com outra mulher e uma garota da minha idade que eu descubro ser minha meia-irmã, por isso também descubro que nenhum dos dois vêem em cores por causa um do outro. Vocês se separaram e ele resolve ir morar com a outra família. Ele deixou de ser seu marido, mas infelizmente ainda é meu pai. Fim do assunto.

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