CAPÍTULO • 01 (Degustação)

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CAPÍTULO 01 

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CAPÍTULO 01 

VLADIMIR

DEZ PARES DE olhos estudam meus movimentos na sala de reuniões. Anseiam por um deslize, uma frase equivocada ou ambígua. Não há nada a ser feito. Quando se está no topo da cadeia alimentar, é comum que apareçam algumas presas esfomeadas tentando se alimentar daquilo que as mantêm subjugadas na base da pirâmide.

Eles querem a liderança.

O líder.

Encaro seus rostos marcados por profundas linhas de expressão, os olhos cansados e desbotados pela idade, os cabelos brancos sobrevivendo em cabeças calvas. Homens experientes, inteligentes, gigantes que já percorreram caminhos árduos no extenso universo financeiro que nos cerca. Não deve ser fácil passar por cima do ego e aceitar que um empresário, vários anos mais jovem, determine o eixo econômico de toda uma capital.

A mesa ocupa a maior parte do espaço, extensa o suficiente para acomodar mais de trinta investidores, sócios e clientes. Ela me preenche com lembranças de negociações vencidas, debates exaustivos que jamais culminaram em resultados desfavoráveis aos interesses da empresa.

Afinal de contas, eu não falho.

Nunca.

Ao menos, não até hoje, quando, pela primeira vez desde que tomei a decisão de assumir a presidência, reconheço o medo do fracasso como uma possibilidade tangível. Um fracasso que tem nome e sobrenome.

Serena. Fajardo.

Com as mãos acomodadas atrás das costas, caminho em direção às paredes de vidro. Agora que o inverno se foi, as ruas, que antes estavam sempre tingidas com camadas sinuosas de branco, parecem reluzir com a vivacidade da primavera e das poças d'água acumuladas nos cantos das ruas. Porém, nem isso é suficiente para alterar o humor dos transeuntes rígidos que perambulam lá embaixo, reforçando o estereótipo exagerado sobre a nossa personalidade rígida.

Ao longe, a arquitetura pontiaguda da Torre do Salvador, localizada no lado oriental do Kremlin, cintila em tons de amarelo por causa do brilho diurno. Visto desta distância, quase não é possível perceber o artefato circular que demarca o passar das horas com ponteiros dourados e números romanos, no entanto, depois de tanto tempo admirando essa mesma paisagem todos os dias, sou capaz de enxergar os detalhes com uma precisão doentia.

Escuto a porta se abrir atrás de nós, precedendo o barulho característico de saltos femininos. Um burburinho tem início, algum dos homens mais idosos tosse. Lara, minha querida cunhada, tem o costume de desconcentrar nossos clientes, independente de quão idosos sejam; um detalhe que não agrada muito o meu irmão.

— Bom dia, senhores — cumprimenta com o tom profissional, sem dar atenção para ninguém em específico. Atravessa a sala até parar ao meu lado, fingindo contemplar o cenário tal como eu. — Senhor presidente, aqui estão os relatórios com todas as despesas dos últimos seis meses. — Estende-me três envelopes. Em seguida, olha para trás e sussurra: — Estamos um pouco ferrados.

Entre Acasos e Destinos | LIVRO 2 | DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora