O palanque estava lotado, mas o centro do discurso era aquela figura baixinha e de voz fina. Enquanto aquela senhora discursava, inflando a plateia que tomava a rua, alguém se esgueirava entre a multidão. Um homem de olhos azuis misteriosamente profundos.
A senhora continuou inflando a multidão, jogando elogios e mais elogios a Hector, que se encontrava a seu lado. A cada enaltecimento, mas o sorriso do candidato alargava. Porém, a mulher encarou alguém na multidão. Imediatamente as palavras pareciam tê-la deixado. Fugido, ao apenas encarar aquela figura. A senhora limpava a garganta, tentando continuar com o discurso. Mas, não tinha jeito, as palavras a deixaram de vez:
— Lorna, você está bem? — perguntou Hector, assim que chegou mais perto dela.
— S – sim. Eu acho que devo terminar por aqui...
Hector pegou o microfone, tomando conta do comício.
— Uma salva de palmas para Lorna Xavier!
Desconcertada, a senadora agradeceu as palmas. Porém, sua visão não saia daquele jovem de jaqueta de couro, que também a acompanhava com o olhar.
Lorna desceu do palanque o mais rápido que pôde. Agradecia pelos elogios que encontrava no caminho, mas não parava para lhes dar muito mais atenção. Assim que alcançou um carro preto, entrou rapidamente e deu as instruções para seu motorista. Os prédios pareciam todos iguais, à medida que o carro entrava e saia de avenidas movimentadas. Inerte em seus pensamentos, a senadora não percebeu quando o motorista falou:
— Senadora Xavier? — o homem olhava para a senhora, através espelho ao seu lado.
— Sim, meu querido, me desculpa eu não te ouvi.
— Eu só disse que foi um ótimo discurso. Vai ser uma pena não ter você mais na política.
— Muito obrigado, é muita gentileza sua. Mas, depois de tantos anos, eu não tenho mais energia para acompanhar.
— O que você vai fazer depois de se aposentar?
— Eu não sei. Ainda não pensei nisso.
— Chegamos.
Assim que o carro estacionou na frente de um hotel luxuoso. Lorna soltou um "boa noite" para o motorista e saiu do veículo. Quando estava dentro do prédio, praticamente voou em direção ao elevador. Paranoica, olhava por cima do ombro a todo momento. Dentro do elevador, torcia sua aliança de casamento. Assim que chegou em seu quarto, abriu a porta com o cartão e entrou. Soltou um suspiro de alívio. Achava que estava em segurança, até que ouviu:
— Finalmente você chegou — o Anjo apareceu do meio da escuridão, fazendo com que Lorna se escorasse na parede. — O que foi, está com medo de mim?
— O que você quer comigo?
— Eu vim saber como você está — o rapaz calmamente se sentou na cama. — Como você está?
— Não adianta você sorrir para mim, eu sei o que você quer.
— Oh Lorna! Você realmente achou que poderia virar as costas para mim.
— Você matou os necromantes! Isso é uma afronta à realeza, o que você queria que eu fizesse?!
— Que continuasse do meu lado. Eu te disse que as coisas seriam do meu jeito.
— E eu nunca pensei que você fosse um psicopata!
— Assim você me magoa — o Anjo soltou uma risada debochada, enquanto tirava a jaqueta e a deixava de lado. — O que nós queremos, é algo que devemos tomar a força.
— Não assim! Você não acha que eu queria viver em um mundo onde nós não nos escondemos?! Por isso eu te apresentei Hector, pois, aos poucos as coisas poderiam mudar. Existem regras...
O Anjo fez um sinal para que ela se calasse, então continuou:
— Hector é apenas uma figura. Ele é muito ingênuo. Só porque tem uma mulher que é bruxa, acha que já conhece nossa raça.
— Nossa raça. Olha como você fala! Nós somos todos iguais, porque acha que nos escondemos? Por que pessoas como você estavam no poder.
— Mas, nós somos diferentes. Somos mais evoluídos.
O Anjo se levantou e andou lentamente pelo quarto, se misturando com a escuridão que ali existia. A senadora se encolheu na parede mais uma vez, porém, tentou continuar enfrentando o rapaz:
— Se você quer tanto mostrar para o mundo que existimos, por que não mostra seus poderes em uma praça pública? Em questão de minutos, o outro lado do mundo já vai estar sabendo disso.
— Não é uma má ideia. Mas, antes, eu quero alguma coisa. Uma proteção.
— Deixa-me adivinhar. Você quer que eu procure para você, não é?
— Sim. Você tem acesso direto para a Rainha.
— E como você sabe que, o que você quer, está com a Rainha?
— E por que não estaria? — o Anjo saiu da escuridão novamente, chegando muito perto de Lorna, que se encolheu ainda mais. — Então, você vai me ajudar?
Lorna encarou aqueles olhos azuis:
— Não! Eu não vou me curvar a um psicopata como você. Eu nem ao menos sei o que você quer...
Lorna pareceu engasgar com algo, enquanto sentia uma dor intensa pelo corpo:
— Sim, sim, é magia de sangue. Não precisa ficar espantada — o Anjo a observava sofrer com a dor, que se espalhava por cada milimetro de seu corpo. — Não é à toa que os Filhos da Bruxa amam usar isso. É tão poderoso! Mas, eu preciso te perguntar mais uma vez. Você vai me ajudar?
A senadora tentou falar, mas não conseguiu. Então, o Anjo a libertou por um instante. Demorou alguns segundos para ela conseguir falar:
— Não! Já chega!
Antes que ela pudesse levantar o braço, para conjurar qualquer coisa, o Anjo retomou o controle:
— Então, eu acho que devo ser mais persuasivo.
Assim, ele foi até a varando do quarto, e Lorna o acompanhou, sendo arrastada pelo ar, contra sua vontade. Quando a noite os recebeu, Lorna voou por cima do Anjo e ficou dependurada, há mais de vinte andares do chão:
— E então, você vai me ajudar?
Lorna conseguiu, dessa vez, gaguejar um "Não". O Anjo, soltou aquele sorriso, e então deu sua sentença:
— Você é quem sabe — o Anjo fez um gesto com a mão. Imediatamente, Lorna foi solta em pleno ar. Sua queda foi rápida e o encontro com o chão fatal.
No parapeito, o Anjo olhou para baixo. Poucas pessoas já rodeavam o corpo da senadora.
Assobiando, o Anjo voltou para o quarto, pegou ajaqueta em cima da cama, a vestiu e saiu. No corredor, andava livremente, como se nada tivesse acontecido. Quando chegou perto de um espelho, não parou de andar, sumindo dentro do reflexo.
![](https://img.wattpad.com/cover/135659592-288-k858386.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
Os Guardiões: Parte I - Correntes de Fogo
FantasyComo seria se o mundo descobrisse que existem pessoas que podem fazer coisas extraordinárias? Como isso mudaria a forma que vivemos? Será que as pessoas se sentiriam ameaçadas ao descobrirem que a realidade não é o que parece, ou elas seriam acolh...