02. o passado nem sempre fica no passado

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⠀⠀⠀⠀— OK, MENINAS, POR hoje é só — a voz da treinadora ressoou pela quadra após o estridente som do apito.

Blake se sentiu mais leve, deixando o corpo relaxar ao apoiar as mãos nos joelhos e inclinar ligeiramente o corpo para frente. Ela não se preocupou mais em buscar a bola com os olhos e respirou fundo, cansada pelo treino intenso que tiveram naquela tarde. Ao seu redor, as outras garotas tomavam o rumo para o banco, igualmente exaustas.

Pelo canto de olho, Blake notou uma figura conhecida se aproximando com passos lentos e tão cansados quanto ela própria. A jovem endireitou o corpo e olhou para Liz Allen, que trazia duas garrafinhas de água, uma em cada mão — aliviada, Harrington reconheceu uma delas como sendo a sua, afinal somente ela, no time todo, tinha uma garrafinha do Homem de Ferro.

Meio infantil, ela sabia, mas gostava demais do objeto para substituí-lo. Mesmo conhecendo Stark pessoalmente, Blake não conseguia desapegar daquele seu lado de fangirl.

— Cansada? — Liz perguntou com ironia, estendendo para Blake a garrafa.

— Que nada — replicou, igualmente sarcástica. — Posso fazer isso o dia todo.

Allen riu. Blake não desperdiçou tempo em abrir a garrafinha e beber o máximo de água possível até a secura em sua garganta se dissipar. Aos poucos, o falatório das suas companheiras de time sumia pelo ginásio conforme elas se encaminhavam para o vestiário. Liz recolheu a bola próxima a elas antes de se voltar novamente para a amiga, dizendo:

— Vamos? Preciso de um banho, tipo, urgente.

Blake engoliu mais uns goles d'água até sentir-se satisfeita, então assentiu sem pestanejar. Também precisava tirar aquela camada de suor grudento de seu corpo o mais rápido possível.

— Sim, por favor — sua voz soou melhor agora que sua garganta não parecia mais estar em chamas. — Acho que até os meus ossos estão suados hoje. O que deu na treinadora? Ela quer matar um bando de adolescentes?

Liz deu de ombros, rindo nasalmente. Elas passaram pela treinadora, e então sorriram com a cara mais lavada do mundo.

— Toomes, você melhorou bastante — ela disse, depois de anotar alguma coisa na prancheta. — Mas ainda quero que se esforce mais, ok?

Blake levou alguns segundos para raciocinar que a mulher estava falando com Liz. Ela só percebeu porque a jovem levantou o polegar em um sinal de positivo, concordando com o comentário da professora. Com frequência Blake se esquecia do outro sobrenome de Liz, porque a garota preferia ser chamada somente por Allen, o sobrenome da mãe.

Harrington bem entendia.

Ela não usava mais o sobrenome de seu pai desde o divórcio. Blake e Valerie haviam o removido oficialmente de seus nomes ao se mudarem para Nova York. Não apagava o passado, mas melhorava o futuro. Era um alívio não ser lembrada de seu DNA.

— Claro, srta. Williams, vou me lembrar disso — Allen concordou, sorrindo como se não estivesse exausta do treino. — Até o próximo treino!

Alguns passos de distância, Liz deixou aquela imagem perfeitamente confiante sumir. Ela respirou fundo e os ombros penderam para frente, cansada. Blake deu tapinhas no ombro da mais velha.

— Você está bem?

Era difícil presenciar essas pequenas brechas em que Liz parecia um ser humano real. A garota fazia o que podia para mascarar seus defeitos e fraquezas abaixo de uma camada de sorrisos gentis e autoconfiança. Afinal, em sua cabeça, ela precisava ser assim — era a garota mais popular do colégio, a líder do Decatlo Acadêmico e também membro do Grêmio Estudantil. Mas Blake, sendo somente uma telespectadora de fora da bolha, achava que Liz frequentemente se esquecia que tinha apenas dezessete anos.

RADIOACTIVE  ╱  PETER PARKER ¹Onde histórias criam vida. Descubra agora