O correr do tempo (1)

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Passam-se os anos, olhamos para o espelho e vemos, além dos olhos cansados, apenas um retrato desbotado do que um dia fomos. As lembranças de um tempo longínquo se instalam em nossas mentes, coloridas e intensas, e lá estamos nós, sentados na varanda das memórias, retomando todos esses instantes em que "estar vivo" teve algum sentido. Sentimos saudades dos dias em que mal percebíamos o tempo passar, quando com três ou quatro amigos nos sujávamos inteiros de terra vermelha, quem sabe ganhávamos uma ou duas chineladas e uma bronca, mas quando nos deitávamos, havia esse sentimento de satisfação, de que o dia não fora em vão.

Hoje, fazemos tanto durante o dia, trabalhamos e interagimos, conversamos, corremos contra o relógio, discutimos. É tanta coisa em tão pouco tempo. Fugimos do silêncio pois não podemos ficar a sós com nossas mentes. Deitamos nossas cabeças em travesseiros e tentamos nos sentir satisfeitos e felizes com o que fizemos, com o que vivemos, mas a criança em nossa mente insiste em gritar. "Por que não parou tudo o que estava fazendo e foi dançar na chuva, como fazia? Por que não parou para cuidar daquele cachorro desnutrido que viu enquanto ia para o trabalho?" Tornamo-nos amargos, sem vida, apáticos, e a cada dia morre um pouco o que de puro havia em nós, o desejo de mudar o mundo, o desejo de entender as coisas pelo simples prazer de saber como funcionam as suas engrenagens. 

Queremos sair em trilhas pelos bosques, queremos tomar banhos de mangueira no fundo do quintal, queremos guerras de travesseiros... Mas o que diriam eles? Temos tanto medo das represálias, sendo que aqueles que reprimem são os mesmos que querem fazer o que nossa mente insiste em almejar e dizer, ao mesmo tempo, que é errado. Os culpados somos nós, apenas nós, que nos acostumamos, que achamos que temos o suficiente, que nos entregamos para uma ideologia de massa qualquer em que a adequação a um padrão arbitrário é mais importante que a satisfação individual. E a cada segundo que se passa, somos menos do que fomos, somos menos do que somos e, às vezes, isso parece normal em demasia.

Fins de tardeOnde histórias criam vida. Descubra agora