III.

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Capítulo III.


— Você realmente vai fazer isso? — Louis questionou sutilmente. — Se você não quiser fazer, nós arranjamos outro jeito, amor. Não tem problema.

Eu não sabia se o meu coração estava acelerado porque eu estava nervoso pelo corte de cabelo, porque ele estava preocupado comigo ou pelo apelido que ele havia usado. Talvez fossem os três motivos de uma vez só. De qualquer forma, eu sabia que não havia outro jeito. Sempre foi deixado bem claro que eu era a maior fonte de força que Daisy tinha. Todas as vezes que eu olhava no espelho e via que ele refletia um rapaz de cabelos longos, parecia que eu via, entre os fios, o olhar de Daisy, totalmente perdido enquanto pedia, silenciosamente, por socorro.

E eu sabia muito bem como socorrê-la.

Soltei um breve sorriso quando observei meus dedos perfeitamente entrelaçados nos de Louis. Parecia que meus dedos tinham sido feitos apenas para estarem entre os dele. A sensação de estar completo era nova para mim e parecia que a qualquer momento eu iria transbordar.

Balancei a cabeça negativamente, dizendo, sem falar nada, a ele que era exatamente aquilo que eu queria e iria fazer. Algo dentro de mim gritava, me comunicando, em meio aos gritos, que eu estava fazendo a coisa certa. E, mesmo que esse algo dentro de mim estivesse calado, eu ainda manteria minha decisão. Não por mim e nem pela voz, mas por Daisy.

Fixei meus olhos na figura refletida no enorme espelho que estava na minha frente. Ali existia um rapaz de cabelos castanhos e longos, com um olhar cansado e levemente entristecido; alguém que estava sentando numa cadeira aleatória de um salão de beleza qualquer que só foi escolhido por ser o que ficava mais próximo do hospital. E, mesmo que essa alguém fosse extremamente parecido comigo, não parecia ser eu.

Automaticamente, eu me lembrei de momentos maravilhosos que fui capaz de dividir com a pequena Daisy. Permiti-me lembrar-me de como era incrível a sensação que me dominava toda vez que eu ouvia suas gargalhadas sinceras causadas por sua atenção presa em seu desenho animado favorito, Popeye — que as enfermeiras mais gentis e compreensivas colocavam na pequena televisão do quarto, às vezes.

Também me lembrei de como era estranho o aperto que eu sentia em meu coração — era uma sensação estranha: uma fisgada, como se alguém estivesse tentando puxar um pedaço de mim — toda vez que, em meio a uma gargalhada, Daisy começava a tossir tão alto quanto o som de sua risada. Em seguida, lembrei-me da angústia enorme que invadia meu ser quando ela olhava no fundo dos meus olhos e me dizia que precisava daquela lata de espinafre, porque estava fraca demais para poder suportar toda a dor que estava sentindo.

Passei a ouvir atentamente o som da tesoura cortando meus fios de cabelo. Não demorou muito até que um arco de cabelos castanhos sem graça se formasse ao meu redor. Respirei fundo, sentindo minha cabeça pesar bem menos. Sentia-me um pouco estranho, como se uma grande parte de mim estivesse faltando, mas tinha certeza de que essa sensação não demoraria a passar. A sensação de vazio nunca é eterna, porque o ser humano não é capaz de se manter incompleto — por isso, sempre se regenera.

— Eu ainda não consigo acreditar que você fez isso. — Louis murmurou boquiaberto, enquanto seus olhos observavam atentamente a moça secar o resto de cabelo que me sobrou. Eu também não consigo acreditar, pensei. Ele sorriu. — Você é incrível, meu amor. Incrível.

+++

No momento em que eu parei o carro no estacionamento exclusivo do hospital, pude ouvir Louis soltar uma respiração pesada. Ele provavelmente voltou a respirar com regularidade depois de um tempo, talvez sem nem perceber que havia parado de fazê-lo.

SAMSON [hes + lwt/ short-fic].Onde histórias criam vida. Descubra agora