A Quarentena da Poesia.

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I.
Um dia o poeta se descobriu cego,
mas não uma cegueira
que lhe afetava os olhos,
e sim, o seu olhar.
O poeta,
veio a chorar,
veio a lamentar.
Era como se,
não pudesse enxergar.

De todo modo via,
sabia que a poesia estava lá,
mas não o reconhecia.
A tateava no que escrevera,
mas hoje a procurava,
nos papeis brancos:
somente seus prantos.
A amada que o abandonou,
como quem fugira com outro;

Fôra,
porta'fora
fulgaz
furiosa.
Morta?

Espremia a cabeça cansada; nada,
apertava o coração amenizava; nada,
procurou pela casa afora; nada,
na rua larga; nada,
na viela apertada; nada.
Estaria nas pessoas talvez, a danada?

Saiu a buscar, com ar de quem nada queria,
aflito lançava sua teia de pergunta-fina.
Com pesar de quem nada entendia lhe respondiam:
Poesia? De que fala, eu não conheço
deveria ser algum remédio para azia?

O sorriso amarelo de maresia se estendia,
o tom pastel de papel em branco já o cobria,
na malha da mortalha, o poeta já se envolvia.
Como poderia sumir assim,
a companheira de sua vida?

II.
Como se escapulisse, escorregaria,
mudou-se para onde a poesia?
dimensão inacessível, invisível,
aos possessivos, repetitivos homens.

Paralela parou, a poesia se recolheu,
logo ela que tanto nos acolheu?

Como um arquiteto,
vira suas obras em fogo,
serem sopradas pelo vento.
Escolheu, virou-nos as costas,
sumiu, do mesmo modo que surgiu.

Motivo teria a poesia,
para sair assim,
se esvair, partir, agir,
sem deixar
aviso pendurado à porta?
Que importa?
Dizem os que se lixam,
acham hora perdida, acerca desta escrita.
Que me importa, se fôra morta?
Morreu mesmo será?
Será que este é o motivo,
de agora longe estar?
Poesia birrenta, querendo atenção,
como criança que se joga pelo chão.

III.
Muito tarde para ser sentidor,
tarde demais, sentirador.
a poesia morreu,
ou somente se recolheu?

se escondeu, atrás da sua televisão,
debaixo do sensacionalismo,
do sensacional analismo.

Tarde demais para sê sentirador,
se passou a vida
sensaciomentalizando.

Põe na tela,
a poesia,
pulando de um viaduto,
que absurdo!

A poesia,
sensacioescandalizando,
sensacionalmente,
para os dementes.

Só assim para conseguir atenção,
na televisão. Na visão do telesensacionalizado.
Arrasado, agora o sentirador.
chora pela notícia, chocado.
Tarde'mais sentirador,
para se sentir enganado. (...)

Poesia: Flor de Cacto.Onde histórias criam vida. Descubra agora