Não era tão tarde, mas não era cedo, o dia havia sido uma droga. Me sinto vazia, mas com a cabeça cheia.
bipi
Ouço o som da notificação do meu celular, são meus amigos. (Não vejo eles a quase um mês)
"F- Podemos ir dormir aí? A gente precisa conversar, a vida tá uma merda"
Vou correndo falar com a minha mãe, ela diz que só tem miojo no armário, eu digo que pouco importa.
"Venham por favor, a mãe deixou, e venham rápido"
Vou pro banho.
bipi
"F- Eu vou mas a B não vai conseguir ir, a mãe dela tá estranha hoje, e não deixou"
"Ok"
20:45
Gabrielaaaaaaaa
Me gritam no portão, e eu vou abrir a porta.
Entramos, ele da oi pra minha família e nós vamos pro quarto.
Sentamos na cama, um na frente do outro, no meio alguns cadernos jogados na cama.F- como foi teu dia?
G- chorei o dia todo por não saber o que fazer da vida.
Ele estende a mão solidariamente e diz "eu também".
Ele faz a volta na cama e senta do meu lado, apoiando a cabeça na minha.F- tô com medo da B não passar de semestre lá, se formaram só sete pessoas no quarto ano lá, e eu rezo pra passar de semestre... e minha família ta me enlouquecendo. Minha irmã disse que não tem problema em eu ser gay desde que eu aja como homem.
G- não sei o que dizer, tô chocada. Minha mãe quer que eu estude de manhã e de tarde, e nos sábados faça curso, mas eu já to morrendo com só a escola, e não vou ter tempo pra ver vocês.F- tua mãe tá louca.
G- sim.
Começam a escorrer algumas lágrimas, ele olha pra mim com os olhos cheios d'água também.
F- tá tudo errado.
G- sim
Silêncio (secam as lágrimas)
F- sabe quem devia tá aqui? A S, ela não tá nada bem.
G- vamos convidar.
Ligo pra ela, ela passa o celular pra mãe dela e nos a convencemos (a mãe dela é legal) e ela deixa.
21:13
Ela chega.
Vamos todos pra cozinha.
Eu pego massa no armário, e tem um molho de frango pronto em uma panela em cima do fogão, e com isso a gente faz uma massa muito boa.S- tá tudo difícil, eu não tenho vontade de nada, nem de ler, nem de ouvir música, sair, trabalhar ou ir pra escola, quero simplesmente deitar na minha cama.
Seus olhos já estão querendo transbordar, mas ela se contém.
É duro ouvir aquilo, eu me mostro forte para que ela se sinta segura.S- eu devia falar isso pra ele?
F- eu não sei, mas eu vou te dar o pior mas o melhor conselho que eu posso te dar, elimina ele da tua vida, não te faz mais bem, tu sabe disso.
S- eu sei.
Janta pronta.
Depois de jantados vamos pro quarto. Apagamos a luz. Ligamos a lanterna.
Passamos a noite conversando.
Em um determinado momento
S- os últimos meses foram tão bons, e acabou. Eu tava tão feliz.
G- sim, diria que de setembro a março foram os melhores meses da minha vida.
F- sim, e não da pra voltar.
G- a gente só começou a valorizar nossa amizade quando vimos que íamos nos separar.
...
F- já pararam pra pensar que, nossa amizade era como "a parte que falta" nós éramos uma bola, e quando estávamos juntos a bola tinha sua parte, estava completa, mas rolava rápido demais, e não via mais nada. A borboleta não conseguia pousar, e nunca conseguíamos estar todos de bem, sempre tinha alguma briga. E agora fomos obrigados a largar a parte, e a borboleta pousa, mas é só as vezes, e no resto do tempo nos sentimos incompletos.
G- isso é perfeito.
Meus olhos enchem de lágrimas de novo.
Nós deitamos todos nos dois colchões de solteiro que estão no chão.
G- vou por música triste tá?
S- põe
Ponho Rubel.
F- venham pra cá.
Deitados todos pertinhos um do outro, abraçados, nos protegendo do mundo, pois estamos crescendo e a realidade já bate em nossa porta.
Conversamos mais, ele adormece primeiro, depois aos poucos o sono me consome e dou boa noite à ela.
9:05
Acordo com barulhos, S está juntando suas coisas já arrumada.
G- já vai?
S- sim, eu vou à pé, tenho que fazer almoço.
G- tá bem, pena que tu não possa ficar mais.
S- pois é, tenho que ir mesmo, tua casa é uma pernada da minha.
Vou abrir a porta, dou um abraço apertado nela com um sorriso de gratidão.
G- obrigada por vir.
S- eu que agradeço o convite... até segunda!
G- até!
Tranco a porta e vou pro quarto. Cochilo novamente.
9:20 (ou por aí)
Acordo novamente, desta vez com F indo embora. Repito o mesmo ato de trancar e destrancar a porta, mas desta vez sabendo que não o veria na segunda feira.
Volto para o quarto, deito em minha cama e adormeço novamente, com a sensação de (novamente) vazio.
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O espetáculo
Non-FictionA vida é um grande espetáculo, como diria Brás Cubas, seriamos então personagens? Protagonistas do nosso próprio enredo? ※※※ Serão pequenas histórias continuas ou completas, ou poesias, de tudo um pouco eu diria. Será o meu refúgio e, se você quiser...