Capítulo 1

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Era por volta das três horas da tarde quando Samantha foi convocada à sala da Sra. Meredith para conversar com uma assistente social e um detetive. O céu estava tão nublado que parecia perto de anoitecer. Trovões e relâmpagos a cada vinte segundos ameaçavam colocar o céu de cabeça para baixo. Tudo bem, Sam não contou os segundos entre um trovão e outro, mas poderia jurar que eles estavam tentando lhe dizer alguma coisa, talvez um prelúdio de algo ruim que estava prestes a acontecer. Não, ela não era um ser sobrenatural que entendia a língua dos trovões, tampouco achava que essa língua existia, isso seria bizarro, mas sempre gostou de acreditar que as forças da natureza sabiam de tudo antes que as coisas acontecessem e tentavam avisar a humanidade disso, mas nunca lhe davam ouvidos. Com certeza era algo ruim, ela pensou, afinal por quê mais teria um detetive envolvido na história? Mas isso não estava certo, Sam não se lembrava de ter feito sequer uma coisa errada durante todos esses anos em que esteve no orfanato, sempre fora exemplar. Então, o que poderia ser? Talvez um mal entendido? Bem, fosse o que fosse, iria descobrir dali alguns instantes. Ela suspirou com força e bateu na porta de madeira da sala da diretora do orfanato antes de entrar e se deparar com três pares de olhos que a encaravam, e então Sra. Meredith apressou-se a falar:

— Olha ela aí! — e sorriu de um jeito falso que não convenceu Sam nem um pouco.

— Mandou me chamar senhora? — perguntou Sam.

— Sim, temos muito o que conversar. Estes são o detetive Wilson Newman e a assistente social Cristine García, eles estão aqui por sua causa.

— O que eu fiz de errado? — Sam perguntou, esquecendo-se de cumprimentá-los.

— Você não fez nada de errado querida, mas primeiramente não gostaria de cumprimentar nossos visitantes?

— Oh, me desculpe — Sam virou-se para os dois à sua esquerda e cumprimentou-os — Olá —sorriu.

— É um prazer finalmente conhecê-la, Samantha. Estive te procurando por um longo tempo — o detetive estendeu a mão sorrindo.

— Me... Procurando? Por que? — Sam perguntou confusa, mas ainda assim apertou a mão estendida do homem.

— Tudo será explicado, porque não se senta? — pediu a mulher ao lado dele, Cristine.

Samantha não gostava nem um pouco de todo aquele mistério, desde pequena sempre fora muito curiosa, mas gostava de saber das coisas logo que pensava nelas, não tinha paciência para anos, meses e nem mesmo dias de espera à procura de algo. Era uma pessoa que gostava do instantâneo. Ainda assim, ela tentou parecer calma e se sentou na cadeira de frente para os dois visitantes, encarando-os de forma que ficasse clara a sua confusão.

— O motivo de estarmos aqui hoje Samantha, é para tratar de assuntos referentes à sua adoção. -falou Cristine.

— Minha... Adoção? — Sam perguntou incrédula.

Aquilo não fazia sentido, as pessoas nunca adotavam adolescentes, muito menos ela que logo completaria 17 anos. Só podiam estar fazendo uma piada com a cara dela e de muito mau gosto. Sam remexeu-se na cadeira, ansiosa.

— Sim, os papéis já estão todos prontos e assinados por Catherine e Joseph, eles querem que você vá morar com eles o quanto antes. Na verdade, eles queriam ter vindo conosco hoje para te buscar, mas achamos melhor explicar as coisas pra você primeiro sem a presença deles, não queremos que seja um choque — explicou Cristine.

Desculpa, o que foi que ela disse? Sam já estava mais do que chocada só pelo fato de ser adotada aos 16 anos e ainda tinha mais coisa?

— Então me expliquem, por favor, porque já estou bastante chocada — Sam fala.

— Acontece o seguinte Samantha, — detetive Wilson suspira e após uma pausa continua — você foi roubada de seus pais no dia do seu nascimento por uma mulher chamada Doris Langerfield, ela teve um filho no mesmo hospital e no mesmo dia em que você nasceu mas, infelizmente, o filho de Doris nasceu morto. Ela então te sequestrou e nunca conseguiram encontrar vocês duas.

Samantha começou a sentir sua cabeça girar e chegou a pensar que seus ouvidos estavam lhe pregando uma peça. Nada do que ele disse fazia sentido então ela riu.

— Ta, então se nunca conseguiram encontrar essa tal de Doris que, por acaso, estava comigo, como é que eu vim parar nesse orfanato? — ela pergunta.

— Aí é que está, Doris conseguiu fugir com você da polícia por três anos, foi então que vocês vieram parar aqui nessa cidade minúscula no meio do estado de Nevada. Aqui, Doris acabou conseguindo um emprego de faxineira e com o salário alugou um quarto pra vocês duas morarem. Ela fez amizade com uma mulher chamada Olívia, que ainda mora aqui. Doris contou tudo o que havia feito para Olívia, desde o seu sequestro até os anos fugindo da polícia, mas Olívia não acreditou, pensou que fosse apenas uma brincadeira e esqueceu-se da história.

— Isso ainda não explica como vim parar aqui — Sam fala se sentindo estranha com a história.

— Uma semana após ter contado tudo para Olívia, Doris teve um surto psicótico. Ela pediu à Olívia que cuidasse de você para ir até o supermercado e nunca mais voltou. À noite, Olívia teve a notícia de que a amiga havia se jogado de uma ponte e morrido afogada. Ela então te trouxe para o orfanato porque não tinha condições de ficar com você.

— E como é que vocês descobriram tudo isso? — Sam pergunta.

— Duas semanas atrás, passou um documentário na televisão sobre crianças desaparecidas há mais de 15 anos e como o sofrimento dos pais perdura para sempre. Seus pais foram um dos casais escolhidos para a reportagem e contaram a história de como você desapareceu. Por coincidência, ou talvez um milagre, cada um acredita no que quer, Olívia assistiu a reportagem e percebeu que a história batia exatamente com o que Doris havia lhe contado. Quando as câmeras que tinham no hospital mostraram a foto de Doris na tela da TV, Olívia não teve dúvidas que se tratava de você a criança perdida. Então ela ligou para a polícia e contou tudo o que havia acontecido 14 anos atrás.

— Espera — Sam pediu — Mas como sabem que essa criança sou eu mesma?

— Você se lembra na semana passada quando coletaram seu sangue e eu disse que era só um exame de rotina? — Sra. Meredith perguntou.

— Sim — Sam assentiu.

— Na verdade, aquilo era para fazer um teste de DNA e ele deu positivo com o sangue de Catherine e Joseph — Cristine falou.

— Espera... — Sam pediu mais uma vez, ela pensou ser capaz de ouvir os parafusos se apertando dentro de seu cérebro — Isso significa que Catherine e Joseph, o casal que quer me adotar, são na verdade... — as palavras morreram quando se deu conta da verdade.

— Sim. Eles são os seus pais biológicos — declarou o detetive Wilson.


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